Com limitadas perspectivas de crescimento no mercado doméstico, o mundo emergente ficou mais apetitoso para a japonesa Kirin Holdings Co.
O anúncio, ontem, de que ela vai comprar o controle da Schincariol por US$ 2,57 bilhões é mais um sinal da tendência aquisitiva de cervejarias japonesas, que têm estado entre as maiores compradoras de empresas do mundo, segundo a Dealogic.
A Kirin, que tem sede em Tóquio e também possui cervejarias na Austrália e nas Filipinas, informou que está comprando 50,45% da segunda maior cervejaria brasileira, adquirindo todas as ações da Aleadri-Schinni Participações e Representações SA.
Com o mercado interno da Kirin reduzido pela metade devido à diminuição da população do país e uma mudança gradual nos hábitos de beber cerveja, ela e outras cervejarias japonesas estão aumentando a suas operações no exterior. Em toda a indústria, as vendas de cerveja no Japão caíram 3,5% para cerca de 200 milhões de caixas no primeiro semestre, informam os fabricantes.
As cervejarias japonesas abocanharam cerca de US$ 4 bilhões em empresas até agora este ano, segundo dados da Dealogic. Mais amplamente, as compras de ativos no exterior por empresas japonesas alcançaram US$ 46,7 bilhões, um recorde para o período, segundo a firma de dados.
A mesma dinâmica também pode estar afetando outros setores da indústria japonesa.
"A onda de aquisições no exterior por empresas japonesas está crescendo em volume e diversidade", diz Colin Banfield, diretor de fusões e aquisições do Citigroup Inc. para a Ásia e Oceania.
Banfield diz que desde o terremoto e o tsunami de 11 de março, o apetite de empresas japonesas por diversificação no mercado internacional se acentuou. As conversas que o braço de banco de investimentos do Citigroup mantém com clientes corporativos japoneses sugerem que há mais ofertas de compra no horizonte, acrescentou.
Analistas dizem que os acordos de compra oferecem às abastadas empresas de bebidas e alimentos japonesas uma forma de expandir-se para fora do Japão. Mas as empresas japonesas ainda precisam encontrar parceiros locais no exterior que as ajudem a ajustar-se ao gosto local.
O Brasil, onde se espera que a demanda de cerveja aumente em sintonia com o crescimento econômico do país, é o terceiro maior mercado de cerveja do mundo, depois da China e dos EUA, e tem quase o dobro do tamanho do do Japão.
"Esta é uma rara oportunidade de comprar uma empresa influente", disse Senji Miyake, diretor operacional da Kirin.
O acordo também é fechado num momento em que a valorização do iene está dando às empresas japonesas maior poder de fogo na hora de fazer aquisições no exterior. Mas Miyake disse que esse não foi um fator considerado, lembrando que o real também se fortaleceu em relação ao dólar.
A Kirin tinha esperança de se beneficiar da consolidação e criação de estruturas mais eficientes em termos de negócios no mercado doméstico e internacional com a planejada fusão com a Suntory Holdings Ltd. Mas as duas partes cancelaram o acordo no ano passado.
Em vez disso, a Kirin decidiu agir por conta própria. No ano passado, ela comprou uma participação de cerca de 15% na Fraser & Neave Ltd., de Cingapura, por US$ 970 milhões. Anteriormente, ela pagou um total de 329,3 bilhões de ienes em duas etapas - em 1998 e 2009 - para comprar a Lion Nathan, e outros 294 bilhões de ienes em 2007 para comprar a australiana National Foods Ltd.
Os irmãos Schincariol vinham mantendo negociações com os potenciais compradores durante vários meses, segundo analistas e observadores da indústria. Uma pessoa familiarizada com o assunto disse que a Kirin superou ofertas concorrentes da SABMiller PLC e da Heineken NV, ajudada pela fortaleza do iene.
Representantes da SABMiller e da Heineken se recusaram a comentar.
Vários analistas ficaram surpresos com o alto preço de aquisição, mas acrescentaram que alternativas atraentes são minguadas.
"A [Kirin] certamente tem como alvo um alto nível de crescimento nos próximos anos e, se for capaz de atingir essa meta, então posso entender por que eles pagaram tanto", disse Toby Williams, analista da Macquarie em Tóquio, citando a força do caixa da Kirin.
Mas, com a expectativa de custos trabalhistas mais altos, a estratégia de contar apenas com a expansão de mercado dificilmente levará a um crescimento no lucro da companhia.
O acordo é também a terceira maior aquisição de empresas estrangeiras por uma japonesa este ano, depois da compra, por US$ 14 bilhões, da Nycomed pela Takeda Pharmaceutical Co. e a aquisição da Caridian BCT pela Terumo Corp., avaliada em US$ 2,6 bilhões, segundo a Dealogic.
Mas nem tudo está decidido. Três membros da família Schincariol que detêm 49,55% da empresa disseram que a venda é ilegítima e prometeram levar o caso à justiça.
Além disso, a Kirin entra num mercado dominando pela Anheuser-Bush InBev e que é bastante visado por outras concorrentes globais, pelos mesmos motivos que atraíram a cervejaria japonesa.
Veículo: Valor Econômico