Depois de praticamente uma década de demanda estável e preços internacionais do suco de laranja amarrados às oscilações da oferta, as empresas brasileiras exportadoras da commodity, que dominam cerca de 80% dos embarques globais, começam a identificar no crescimento das vendas em países emergentes uma saída palpável para expandir os negócios.
Pesquisa recém-concluída confirmou a tendência geral apontada nos últimos anos e mostrou que o consumo de suco de laranja caiu 5,3% nos 40 principais mercados para o produto no mundo entre 2003 e 2010. Mas mostrou, também, um aumento de 41% no grupo formado pelos Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) e pelo México, além de saltos expressivos em países como Marrocos (743%), Argentina (358,2%) e Indonésia (212,8%).
Como todos esses emergentes compõem a lista dos 40 maiores países consumidores de suco de laranja, sem eles a queda de 2003 a 2010 de todo o grupo teria sido maior. Os dados da pesquisa foram levantados pela multinacional sueca de embalagens Tetra Pak, compilados pela empresa de pesquisas Euromonitor e organizados pelo Centro de Pesquisa e Projetos em Marketing e Estratégia (Markestrat), sediado em Ribeirão Preto (SP).
Para as grandes exportadoras (Cutrale, Citrosuco, Citrovita e Louis Dreyfus) reunidas na Associação Nacional dos Fabricantes de Sucos Cítricos (CitrusBR), ainda é cedo para comemorar, uma vez que, apesar das boas taxas de incremento, o consumo nos emergentes ainda é pequeno. Mas para o especialista Marcos Fava Neves, membro do conselho do Markestrat e autor de diversos livros sobre o segmento, a persistente curva de alta nesses países de renda mais baixa, sobretudo nos dois últimos anos, abre, sim, boas perspectivas de longo prazo.
"Ainda que a tendência liderada pelos Bric seja mesmo de aceleração do ritmo de expansão, mesmo que o consumo dos emergentes dobre nos próximos oito anos, não será suficiente para compensar a queda dos mercados tradicionais para o suco brasileiro", afirma Christian Lohbauer, presidente da CitrusBR.
Em 2010, segundo a pesquisa, os Bric e o México consumiram, juntos, 267 mil toneladas equivalentes de suco de laranja concentrado e congelado (FCOJ, na sigla em inglês), menos de 12% do total dos "40 mais". Nos outros 35 países da lista, encabeçados por Estados Unidos e Alemanha, o volume total chegou a 2,021 milhões de toneladas. Os demais emergentes cuja demanda doméstica cresce forte estão entre esses 35 países, mas têm bases de partida ainda mais baixas. No Marrocos, o consumo atingiu pífias 6 mil toneladas em 2010. Na Argentina, chegou a 17 mil; na Indonésia, a 8 mil.
Além disso, ressalta Lohbauer, há obstáculos importantes para que o Brasil consiga ampliar as exportações para alguns dos países emergentes onde o consumo está em ascensão. Um bom exemplo é a China. O crescimento do consumo no país foi de 99% entre 2003 e 2010, para 88 mil toneladas, mas há aportes em curso na expansão da produção local de laranja e planos ambiciosos para a exportação de suco.
Lohbauer observa que a produção chinesa de laranja já rivaliza com a da Flórida, que reúne o segundo maior parque citrícola do mundo (atrás de São Paulo, onde estão baseadas as exportadoras brasileiras), e que a capacidade de processamento do país alcança 20 mil toneladas de suco por safra e está ociosa. A demanda chinesa, como a de outros emergentes, é puxada por compras de suco de laranja integral para uso diluído em outras bebidas mais baratas, como néctares e refrescos. Em grande medida, foi a proliferação mundial desses "concorrentes" mais baratos que travou o consumo de suco de laranja na última década.
O Valor apurou com outra fonte ligada às indústrias que, além disso, os critérios microbiológicos da China no controle das importações, que medem aspectos como o nível de bolores e leveduras, são rigorosos demais diante dos padrões internacionais. Para essa fonte, trata-se de um sinal de que sempre haverá motivos para embargos, e que essas travas podem ser usadas para controlar a relação entre oferta e demanda.
No caso da Índia, diz o dirigente, a infraestrutura para transporte e distribuição de um produto que exige refrigeração como o FCOJ é precária. Para a Rússia, as exportações brasileiras já chegam pelo porto de Roterdã, na Holanda, e seguem por caminhões, em tanques - o que encarece a carga -, enquanto o México cresce no segmento favorecido pelos EUA, que taxam o suco brasileiro e favorecem o produto do vizinho. Apesar de grandes produtores, os americanos também são tradicionais importadores de volumes menores de suco.
"Ainda é cedo para as empresas brasileiras repetirem a estratégia de sucesso adotada em seus mercados tradicionais e investirem em infraestrutura de transporte e distribuição nos emergentes, pois os volumes não justificam. Mas, sobretudo nos dois últimos anos, os emergentes começaram a compensar os países desenvolvidos, e no futuro esses aportes poderão acontecer como parte do redirecionamento estratégico de toda uma cadeia", diz Fava Neves.
Veículo: Valor Econômico