O pedido de salvaguarda aos vinhos nacionais foi retirado e com ele a ameaça de deixar o consumidor brasileiro de taça vazia. Seja porque vazou a informação de que os técnicos não encontraram motivo para impor salvaguardas (conforme boato que circulou no fim da semana passada), seja porque os produtores refletiram e resolveram retirar o pedido, o fato é que não teremos a imposição de cotas para vinhos importados, nem o aumento de impostos sobre eles. Os restaurantes prometem devolver os rótulos nacionais às suas cartas e o clima de antipatia foi quebrado. Associações de bebidas, de produtores de vinho e de supermercado se uniram para celebrar um grande acordo que tem um objetivo declarado: aumentar o consumo dos vinhos nacionais.
A notícia é boa. E nós aqui do Paladar não queremos estragar o brinde e muito menos interromper a festa. Mas, como apreciadores de vinhos – nacionais e importados – continuamos achando que os vinhos no Brasil são caros e, nesse aspecto, o acordo divulgado na segunda-feira não acena com nenhuma possibilidade de melhora. Os vinhos continuarão a ser caros.
Além disso, os pequenos produtores brasileiros continuam se sentindo desprotegidos. “A ideia do Ibravin é ter aumento de escala e redução de custo e a estratégia está focada nos grandes produtores”, diz Eduardo Angheben, da Angheben Vinhos Finos.
Contrárias ao pedido de salvaguarda desde o início e sem esquemas fortes de distribuição, as pequenas vinícolas brasileiras temem continuar fora dos grandes centros consumidores.
“Quem contar com as grandes redes, com capacidade de vender grandes volumes terá vantagens nesse acordo. Nós, pequenos, não estamos nessa rede e vamos continuar nosso trabalho isolado, de qualidade, mas tirando pouco proveito disso tudo”, disse Adolfo Lona, produtor do Rio Grande do Sul.
Entre as principais reivindicações dos pequenos está serem tratados como pequenos. Eles continuam gritando contra a obrigatoriedade do selo fiscal, pedindo a inclusão das pequenas vinícolas no Super Simples e o fim da normas de produção que não condizem com o produto – sem menções no acordo. “Nós, os pequenos produtores brasileiros de vinho, só teremos benefícios se nessa agenda constarem esses três assuntos. Se não entrarem na discussão, esse acordo beneficiará muito pouco as pequenas vinícolas”, diz Luís Henrique Zanini, da Vallontano.
Segundo ele, mesmo o compromisso de aumentar a exposição do vinho fino nacional nos supermercados terá pouco impacto para as pequenas vinícolas porque o modelo de negócios proposto pelas grandes redes é quase sempre desfavorável ao produtor artesanal. “Normalmente numa negociação com supermercados, cobra-se um enxoval (algumas caixas grátis do seu vinho para que as garrafas apareçam no mercado). E há a imposição de achatamento de preços. Se houver mudança nessa política em relação aos pequenos, esse se tornará um excelente canal de distribuição”, diz Zanini.
Carlos Cabral, do Pão de Açúcar, ao contrário, acha que a meta de ocupar com vinhos nacionais 25 % das prateleiras beneficiará os pequenos produtores. “Os supermercados já têm mais de 25% de nacionais, entre finos e de mesa, mas a presença dos pequenos deverá crescer nas delicatessens”, aposta.
O diretor executivo do Ibravin, Carlos Paviani, ressalta que para cada perfil de vinícola há um canal de distribuição adequado. O acordo também sinaliza com a possibilidade de importadoras distribuírem vinhos nacionais. “Uma das partes do acordo diz que o Ibravin vai promover a união de importadores e pequenos produtores. Isso é um passo importante para que as pequenas vinícolas não se restrinjam a vender apenas na sua cantina”, diz Lona. Porém, o dono da importadora Ravin, Rogério D’Ávila, acha difícil que as importadoras passem a distribuir os pequenos. “Não compensa para uma importadora comprar o vinho nacional, arcar com os impostos que são altíssimos e estocar o vinho”, diz.
Daniel Geisse, da Cave Geisse, celebra o acordo. Contudo, diz que o motivo da baixa competitividade do vinho brasileiro é outro. “A ação vai dar maior visibilidade de venda? Vai! Mas o problema de fundo do vinho brasileiro, que são os impostos, o acordo não resolve.”
Veículo: O Estado de S.Paulo