Aposta em espumantes leva vinícola a pagar ágio de 30%
A histórica safra de uva do último ano não foi o suficiente para atender à demanda do tipo branco. A indústria de vinhos vem pagando ágios de até 30% pela fruta, em vista do potencial do mercado de espumantes no Brasil.
As vinícolas gaúchas, do estado que mais produz uva no País, encerraram 2012 com cerca de 300 milhões de litros de vinho em estoque. No Vale dos Vinhedos, onde está Bento Gonçalves (RS), o processamento da bebida cresceu 15% no período.
"No ano passado, tivemos a melhor safra de todos os tempos. As [uvas] brancas surpreenderam em qualidade", observa o recém-empossado presidente da Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale), Juarez Valduga.
As entidades responsáveis pelas estatísticas do setor ainda não concluíram os dados relativos ao ano passado, como endossa Valduga. Mas, em 2013, a produtividade da uva gaúcha deve cair 5%, segundo o especialista, embora a qualidade deva ser superior.
"O setor vinícola tem investido fortemente em qualidade, adquirindo a melhor tecnologia mundial", afirma Valduga, cuja vinícola, a Casa Valduga, investe de R$ 2 a 3 milhões por ano em equipamentos para a produção de uva e o processamento de vinho.
Aposta na espuma
Em relação à qualidade, os especialistas concordam: a produção de espumantes é a área da vinicultura em que o Brasil apresenta o maior potencial. "O espumante brasileiro já está consagrado, a natureza o favorece. É um futuro garantido", projeta o novo líder da Aprovale.
Para a correspondente francesa da empresa de promoção de vinhos Sopexa no Brasil, Caroline Putnoki, "o futuro do vinho brasileiro são os espumantes, que já têm reconhecimento no mundo inteiro".
Caroline conta que, em 2012, uma vinícola da região de Champagne, França, firmou parceria com a brasileira Cave Geisse para desenvolver, lá, um vinho com "alma brasileira". Além disso, a especialista diz que o vinho brasileiro terá presença, neste ano e pela primeira vez, em certa feira de vinhos de Bordeaux.
Ainda assim, o Brasil importou 3,18 milhões de litros de vinho tinto e 1,85 milhão de espumante da França no ano passado, com respectivas de altas de 4,5% e 34,8% em relação ao ano anterior. "Foi um ano difícil para importados no Brasil", pondera Caroline.
Vinho francês
De acordo com ela, a tentativa das vinícolas brasileiras de restringir a importação de vinhos prejudicou, afinal, esses embarques. Já para Valduga, cuja empresa também trabalha com a importação da bebida, ainda falta fiscalização e novas regras, no País, para a entrada do produto estrangeiro.
"Há uma desigualdade de direitos, de competição, nessas importações", afirma o empresário gaúcho. A representante de Bordeaux, por sua vez, nega a falta de competitividade da bebida nacional: "O vinho brasileiro está cada vez mais competitivo, com uma rápida evolução da qualidade".
A diferença, segundo Caroline, está na tradição: o desenvolvimento da vinicultura no Brasil é calculado em décadas, ao passo que os franceses produzem e aperfeiçoam seus vinhos há séculos.
O cônsul da França no Brasil, Stéphane Mousset, relembra a experiência entre a Argentina e o seu país de origem. "Houve cooperação e transferência de tecnologia entre produtores de Bordeaux e de Mendoza. Com novas técnicas, os argentinos passaram a produzir melhor o Merlot".
Mousset afirma que há empresários franceses interessados em repetir a experiência no Brasil. Mas o presidente da Aprovale, em cuja região se produz 20% do vinho tinto nacional, diz não haver interesse em parcerias internacionais. "A Casa Valduga está buscando uma internacionalização própria, para vender seu vinho lá fora", ele conta.
A empresa de Valduga esmaga seis mil toneladas de uva por ano. No Vale dos Vinhedos, o volume de produção anual chega a 14 milhões de garrafas de vinhos e espumantes. Na região, estão localizadas 450 propriedades produtoras de uvas, e mais de 30 vinícolas.
"Enoturismo"
A gestão de Valduga na Aprovale começou no último dia oito. O presidente da associação vai se dedicar ao desenvolvimento do "enoturismo", que inclui visitas, degustação e cursos sobre vinhos nas estalagens da região.
Esse tipo de turismo, segundo o empresário, corresponde a cerca de 40% do faturamento de pequenas vinícolas da região. No caso das empresas maiores, gira em torno de 15%.
O fluxo turístico no município de Bento Gonçalves, o maior do vale gaúcho, vem crescendo nos últimos 17 anos, de acordo com Valduga. Em 2012, 300 mil turistas passaram pela cidade.
O Vale dos Vinhedos foi responsável pela criação da primeira Indicação de Procedência (IP), em 2007, e da primeira Denominação de Origem (DO), em 2012, de vinhos nacionais.
Veículo: DCI