Quem vai brindar com Piva?

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O dono da Expand, uma das maiores importadoras de vinho do Brasil, perdeu algumas de suas marcas mais importantes e comanda uma reestruturação. Saiba o que está acontecendo com a empresa

 

A Expand , a importadora do empresário Otávio Piva de Albuquerque, é uma das empresas pioneiras no mercado de vinhos no Brasil. Em três décadas de atividades, Piva enfrentou planos econômicos, congelamentos de preços e altas expressivas do dólar, a moeda usada na maioria de seus negócios. Mas, neste longo período, sua empresa nunca enfrentou obstáculos tão grandes como os atuais. O mercado estima que a dívida da companhia esteja entre R$ 60 milhões e R$ 90 milhões, marcas importantes que faziam parte de seu portfólio, como a argentina Zuccardi e a italiana Marchesi di Antinori, abandonaram a empresa e contêineres lotados de vinhos estão parados nos portos brasileiros. Mais: são fortes os rumores de que a chilena Concha y Toro, crucial para a Expand, deixará a importadora. Piva admite que a Expand tem passado por uma grande reestruturação que ceifou os principais executivos da empresa em meados de 2008 e gerou a demissão de 40% dos funcionários, mas afirma que o resto não passa de fofoca do mercado.

 

A culpa de todos os problemas, diz ele, é dos antigos executivos. “Eles não tinham experiência e, só em 2007, compraram US$ 12 milhões a mais de vinho do que eu precisava”, disse Piva em entrevista à DINHEIRO (leia na página 66). “Hoje, tenho um estoque com 800 mil caixas sobrando.” Nesta crise, Ricardo Carmignani e Tibor Sotkovszki, respectivamente ex-CEO e ex-diretor de marketing, são os algozes de Piva. Depois de demitidos por ele, os dois executivos abriram a concorrente Winebrands, em sociedade com a Global Wine, dona da portuguesa Dão Sul, ex-sócia de Piva na ViniBrasil, produtora do vinho brasileiro Rio Sol, no Vale do São Francisco, Bahia. “Se somos tão maus executivos assim, por que razão os produtores estão vindo para a nossa importadora?”, limita-se a perguntar Sotkovszki.

 

Há mais de uma década a concorrência diz que a Expand está com problemas financeiros, mas o assunto voltou à tona nos últimos tempos. Em julho de 2008, Piva vendeu a sua parte na ViniBrasil, a menina de seus olhos, para os portugueses da Dão Sul, empresa da holding Global Wine. Os valores não foram revelados, mas incluiu toda a quitação de faturas da Expand com a Dão Sul que iriam vencer e mais um valor em dinheiro. “Vendi porque meu sonho havia se concretizado e o meu negócio não é produzir vinho, mas sim vender”, diz Piva. “Recebi uma grana boa pela venda”, explica. Meses depois, a Winebrands foi lançada com uma carta que inclui os rótulos da própria Dão Sul e a distribuição para o Nordeste do Casillero del Diablo – este é o único da Concha y Toro não distribuído por Piva por razões religiosas. Há dois anos, a Concha y Toro montou um escritório no Brasil para trabalhar o Casillero e há quem afirme que a Expand vai perder a representação da famosa produtora – o que seria um nocaute na companhia. “Isso não tem fundamento. Importo Concha y Toro há 25 anos e, em outubro do ano passado, renovamos por mais cinco anos”, diz Piva. Francisco Torres, diretor- geral da Vinícola Concha y Toro no Brasil, descarta qualquer ação no sentido de acabar com a parceria com a importadora brasileira. “Nunca pensamos em tirar a Concha y Toro da Expand”, diz Torres. “A Concha y Toro é o que é no Brasil graças a eles.”

 

Apesar de o assunto Concha y Toro ser recorrente, o que incomodou Piva foi a atitude de seu antigo executivo. “Enquanto trabalhava para mim, o Carmignani armou com a Dão Sul de montar uma empresa concorrente. Daqui a um ano a Dão Sul vai perceber que fez besteira”, aposta Piva. Além dos vinhos da produtora portuguesa, a Winebrands também tomou de Piva o Marchesi Antinori, antigo cliente da Expand. Famoso produtor italiano, Antinori realizou uma pequena concorrência entre importadoras brasileiras depois de descobrir que tinha três contêineres com seus vinhos parados no porto brasileiro. Produtores trocarem de importadoras é relativamente comum no mercado brasileiro. Mas chama a atenção as marcas que estão deixando a Expand, e não apenas em direção à Winebrands. A argentina Zuccardi deve anunciar em breve que seus vinhos serão importados pela Ravin, empresa recém-fundada por Rogério D’Ávila, ex-diretor comercial da Expand, que deixou a empresa em novembro de 2008 depois de oito anos de casa e partiu para voo solo. “Eu não estava contente com o trabalho que estava sendo feito no Brasil”, disse à DINHEIRO Jose Alberto Zuccardi, dono da vinícola argentina. Outra baixa foi a Allegrini, que em setembro do ano passado trocou a Expand pela Grand Cru. Duas importadoras confirmaram à DINHEIRO que foram contatadas pela argentina Norton sobre a possibilidade de vender seus rótulos no Brasil. Comenta-se ainda que as vinícolas italianas Casanova di Neri, que têm um vinho com 100 pontos da Wine Spectator, Beni di Batasiolo e Braida estão descontentes com a Expand. Durante a Vinitally, a mais importante feira de vinhos do país da bota realizada no início de abril, estes produtores pediam indicações de importadoras aos brasileiros que passavam pelos seus estandes.

 

Não desembaraçar os contêineres que chegam ao Brasil é a estratégia de Piva para não arcar com os custos do estoque. “Com a desvalorização do real e o encarecimento do crédito, estima- se que ele viu a sua dívida subir mais de 40%”, diz um concorrente. “Não tenho toda essa dívida que estão falando”, diz Piva. “Nosso estoque é cinco vezes maior do que a nossa dívida a preço de venda. Ou seja, a venda de três meses paga a minha dívida.” O problema é que os importadores estão tomando ciência de que suas garrafas estão paradas no porto. Em janeiro deste ano, por exemplo, o produtor português Cristiano Van Zeller, dono do Quinta do Vale D. Maria e com participações na Quinta do Vallado, teria cancelado uma viagem ao Brasil ao descobrir que não teria estes vinhos para apresentar em uma palestra. Enquanto o mercado comenta as baixas, Piva consegue novas marcas. “Para cada produtor que a gente perdia, encontrávamos um melhor”, diz. Entre as novidades, encontra-se o Wine Circus, um consórcio boutique de pequenos produtores italianos liderado pelo respeitado enólogo Roberto Cipresso. Além disso, a Expand se prepara para abrir 22 lojas até dezembro deste ano. “Investiremos US$ 100 mil em cada ponto e até o fim do ano teremos um total de 60 lojas”, anuncia Piva. “Em 2010, teremos 100 lojas.

 

A rede de lojas é crucial para a Expand e dará à importadora, cujo faturamento é estimado em mais de R$ 200 milhões, força de barganha ainda maior perante os produtores. “Com esse monte de vinho no estoque, tenho que abrir lojas. E são todas próprias”, diz Piva. Esse, aliás, é um ponto importante. Atualmente, das 40 lojas com a bandeira Expand metade pertence a franqueados. E, nos últimos tempos, alguns deles têm reclamado da política praticada pela empresa. “Eles vendem em supermercados produtos que eram para estar somente nas lojas e o telemarketing da empresa também oferece aos clientes descontos que nós não podemos dar”, diz um franqueado. Piva diz que trabalha com portfólio diferente para cada canal de venda e que os problemas com o telemarketing aconteceram até novembro de 2008. “Demitimos a pessoa responsável pela área e mudamos tudo.”

 

“Estamos em guerra"

 

Em entrevista à DINHEIRO, Otávio Piva de Albuquerque, da Expand, ataca os antigos executivos, afirma que a empresa vai abrir lojas e diz que seus vendedores estão no clima do filme Tropa de Elite. Acompanhe:

 

O mercado comenta muito sobre a má situação financeira da Expand. O que, de fato, está acontecendo?
Queríamos profissionalizar a empresa e colocamos três executivos aqui, o Ricardo Carmignani, o Tibor Sotkovszki e o Rogério D’Ávila, e demos autonomia para eles. Eu fui para o conselho e eles permaneceram tocando a empresa. Em 2007, foram para a feira da Viniexpo e, como não tinham muita experiência, pediram três contêineres de vinho quando o mercado vendia apenas um. Com isso, só no ano de 2007, eles compraram US$ 12 milhões a mais do que eu precisava. Eu já tinha um estoque grande e cheguei em 2008 com um estoque gigante. Quando percebi, pensei: agora preciso dispensar esse pessoal e voltar para a empresa.

 

O que o sr. fez então?
Meu filho, que estava trabalhando em um banco de investimentos e terminando MBA em finanças, pediu para voltar para a Expand e tomar as rédeas da empresa. Ele me disse: "Pai, eles (os executivos) vão quebrar a nossa empresa." Voltamos, suspendemos as compras, dispensamos os executivos e agora estamos organizando o estoque.

 

E quanto aos vinhos que estão no porto?
Eu não podia deixar faltar estoque e nem produto. Esse mundo gigante de estoque que tínhamos fez com que boa parte de nossa mercadoria ficasse um tempo no porto, mais do que eu gostaria. Se eu tirasse tudo, ia vender só o que era fácil de vender. Então ficou metade no porto e metade para os vendedores. O que aconteceu? Saíram esses executivos bravos porque tinham perdido a festa e começaram a falar que a Expand ia quebrar. Eles foram mandados embora.

 

Mas a Expand perdeu produtores...
Alguns deles, trouxas, tontos, se deixaram seduzir. O Zuccardi, na Argentina, que era muito amigo do diretor comercial Rogério, e o Antinori, da Itália, que era amigo do Carmignani. Aí falei para o Antinori: "Trabalho com vocês há 25 anos, temos 150 vendedores, 40 lojas, estamos abrindo 22 lojas neste ano, vocês estão loucos?" Aí ele me disse que o Carmignani tinha ido lá, falado que o contêiner estava no porto e que ele queria fazer um trabalho exclusivo. Eu disse ao Antinori que ele havia errado e ele quis voltar atrás. Não tinha mais volta. Disse à ele que ia sair que nem um pitbull vendendo os produtos dos outros.

 

O que vai trazer para substituir as perdas?
Para cada produtor que a gente perdia, encontrávamos um melhor. O pessoal sai falando, a Expand perdeu o Zuccardi, perdeu o Antinori, vai perder mais. Perdemos, sim, três produtores importantes, podemos perder até cinco. Mas, no último ano, a gente pegou pelo menos 12 produtores importantíssimos, como o Wine Circus, do Roberto Cipresso, que é atualmente um dos melhores enólogos da Itália.

 

O sr. disse que tinha muito estoque, quantas caixas a mais a Expand tinha?
Eles compraram 800 mil caixas a mais do que precisávamos.

 

Mas o sr. dava autonomia?
Não, autonomia total não. Um comprava e o outro fazia o budget do que iria vender. Tínhamos política de ter estoque médio de seis meses por causa das greves que geralmente acontecem no porto. Mas eles não venderam o que planejaram e o meu estoque acabou indo para um ano. Aí mandamos os executivos embora e eles saíram dizendo que a Expand estava quebrando. Neste ano, vamos abrir 22 lojas novas, todas próprias.

 

Quanto a Expand vai investir?
Vamos investir US$ 100 mil por loja. Abriremos no Brasil inteiro. A Expand está crescendo e, com um monte de vinho no estoque, tenho que abrir loja.

 

O sr. tinha participação na ViniBrasil, do vinho Rio Sol, e vendeu para os seus sócios da vinícola portuguesa Dão Sul. O que aconteceu?
A minha diversão é inventar negócio, sou empreendedor. No caso da Dão Sul, eu tinha o sonho de criar um vinho brasileiro, era uma paixão, um grande projeto. Também queria ajudar o Nordeste. O meu sonho aconteceu, o vinho foi exportado para os Estados Unidos, Canadá e para toda Europa. Fiquei satisfeito e disse para os portugueses se eles queriam vender a parte deles ou comprar a minha. Eles resolveram comprar.

 

Comenta-se que a Expand tinha muitas dívidas com a Dão Sul e, em troca delas, deu a ViniBrasil e saiu sem nada...
Nós também importávamos vinho Dão Sul e eles propuseram compensar as faturas que iriam vencer. Mostro o contrato se quiserem. Recebi uma bela grana e ainda quitei as faturas. A razão foi estratégica porque sou um vendedor e não um produtor. Oitenta por cento do custo está na produção e 80% do lucro está no comércio.

 

O seu antigo CEO, o Ricardo Carmignani, está representando a Dão Sul no Brasil. O que o sr. diz sobre isso?
Enquanto ele ainda trabalhava para mim, armou com a Dão Sul de montar uma concorrente. Hoje ele está numa salinha 3x4, é vergonhoso. Ele não tem vendedor, nós temos 150. Ele não tem loja, nós temos 40. Ele vai vender para quem? Daqui a um ano, a Dão Sul vai ver que fez besteira. O barquinho dele não vai muito longe, ele vai quebrar.

 

O sr. vai processá-lo?
Não, eu vou entrar com ação criminal para quem falar que a Expand está quebrando. Por que a Expand demitiu funcionários? Em seis meses, demitimos 40% dos funcionários e contratamos só pitbull com vontade de vender. Eliminamos quem não estava com uma boa performance. Estamos em guerra, o espírito é o do filme Tropa de Elite.

 

Por que a Expand mudou o depósito de Itatiaia, no Rio de Janeiro, para São Paulo?
Os restaurantes em São Paulo pagavam o ICMS por estimativa. Montamos a operação no Rio por causa disso. Com a substituição tributária, deixou de ser interessante. Então, fomos para São Paulo. Eu deixei de ganhar com a vantagem do imposto e o galpão lá era alugado.

 

A Concha y Toro montou um escritório aqui no Brasil e há quem diga que eles vão passar a distribuir os vinhos de forma independente. Como está a relação de vocês?
A Concha y Toro se estabeleceu no Brasil porque a principal marca individual deles é a Casillero Del Diablo e me incomoda muito vender esse vinho com aquele diabinho. Por isso eles vieram para o Brasil. Importamos Concha y Toro há 25 anos e, em outubro do ano passado, renovamos o contrato por mais cinco anos.

 

A competição no mercado de vinho beira a deslealdade?
Esse mercado é muito agressivo, tanto que você ouve falar que a Expand vai quebrar. Agora, a Expand é a única empresa do setor com balanço auditado pela Grant Thornton. Teremos o balanço no fim de abril e vamos enviar para os nossos parceiros conhecerem a nossa situação.

 

O mercado diz que suas dívidas chegam a R$ 90 milhões. É tudo isso?
É muito longe disso. Nosso estoque é cinco vezes maior do que a nossa dívida a preço de venda. Ou seja, a venda de três meses paga a minha dívida. Poxa, preciso me alavancar um pouquinho.

 

Veículo: Revista Isto É Dinheiro


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