Cenário difícil leva Citrovita a focar custo e produtividade

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Pega no contrapé por mudanças estruturais e conjunturais que derrubaram as cotações do suco de laranja no mercado internacional, a Citrovita, controlada pelo grupo Votorantim, terá de rever os próximos passos de um agressivo plano de expansão deflagrado em 2002.

 

Dividido entre ampliações industriais e agrícolas, o ciclo de investimentos resultou em expansões da capacidade de processamento de suco e da produção própria de laranja da empresa. Novos aportes não serão suspensos, mas as prioridades mudaram para enfrentar o período de vacas magras.

 

"A laranja é uma cultura de ciclo longo, portanto não podemos tratá-la como se fosse alface. Vamos continuar investindo, com muito critério e foco na operação", afirmou Milton Flávio, diretor agrícola da Citrovita, que recebeu o Valor na fazenda da companhia no município paulista de Reginópolis, a pouco mais de 400 quilômetros da capital do Estado.

 

Hoje com 706,4 mil árvores, com variedades precoces, médias e tardias de laranja, a Emu é uma das 14 fazendas incorporadas pela Citrovita desde 2003, todas no interior de São Paulo. Também no Estado estão as outras quatro fazendas - a primeira implantada em 1988, em Itapetininga - que a empresa manejava até então.

 

Em setembro de 2004, em entrevista a este jornal, Mário Bavaresco Júnior, diretor-superintendente da companhia, fundada em 1991, disse que o ciclo de expansão iniciado em 2002 deveria terminar em 2005, com investimentos totais da ordem de US$ 100 milhões.

 

A preocupação em garantir matéria-prima própria para o processamento de suco era evidente, e as fazendas e os novos pomares absorveram cerca de 70% daquele montante total. De 2003 até 2007, foram investidos R$ 205 milhões na compra de fazendas.

 

"Em 2002, a Citrovita se propôs a ser uma das três maiores produtoras de suco de laranja do mundo [as duas primeiras eram e ainda são as também brasileiras Cutrale e Citrosuco]. Fortalecemos nossa base de frutas, para reduzir a volatilidade da oferta, e adotamos um posicionamento mercadológico diferenciado, baseado no comportamento da demanda", disse Bavaresco na época.

 

Em 2004 começava um período de forte alta das cotações do suco no mercado internacional, provocado por danos provocados por furacões à citricultura da Flórida, Estado americano que em laranja e suco só perde para São Paulo, líder mundial. A alta durou até o fim de 2006, e o avanço da Citrovita - e das concorrentes - ganhou força.

 

No fim de 2002, a Citrovita tinha um parque citrícola próprio formado por 3,5 milhões de árvores. Em setembro de 2004, eram 5,5 milhões, e atualmente a empresa conta com 11,1 milhões de árvores. "A partir de 2003, tivemos novos plantios todos os anos", informou o diretor Milton Flávio.

 

Segundo ele, as 13 fazendas incorporadas desde 2003, a última delas há poucos meses, têm água disponível para irrigação, ponto vital para garantir produtividade em tempos de crise de preços.

 

Com a concorrência de outros suco e a retração da demanda pelo tradicional suco congelado e concentrado de laranja, a tonelada do produto brasileiro, que superou US$ 2,5 mil no pico histórico de 2006, hoje vale pouco mais de US$ 1 mil, com poucas perspectivas de reação expressiva.

 

Dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) mostram que, com isso, as exportações da Citrovita caíram para US$ 169,5 milhões em 2008, ante US$ 385,5 milhões no ano anterior. Em 2002, foram US$ 98,8 milhões.

 

A Fazenda Emu é um exemplo da receita focada em custos revelada por Flávio. Irrigada pela técnica de gotejamento - em implantação em sete fazendas, em um sistema que carrega na água 100% dos fertilizantes necessários -, a unidade também privilegia o plantio adensado, modelo no qual a Citrovita foi pioneira entre 2000 e 2001, e uma agricultura de precisão que cresce também com o avanço de problemas fitossanitários na citricultura de São Paulo e da Flórida.

 

Tais problemas são encabeçados pela disseminação da doença conhecida como greening, que obrigou a erradicação de milhões de árvores e a renovação de pomares em padrões considerados mais seguros.

 

Nesse sentido, técnicas de monitoramento por satélite começaram a ser adotadas pela Citrovita há três anos e em 18 meses cobrirão cerca de 20% da área plantada total da empresa, de acordo com informações fornecidas por Flávio em Reginópolis.

 

Uma vez implantada a técnica, inspeções georreferenciadas dos pomares são geradas a cada 15 dias, e os resultados desse mapeamento são enviados aos tratores responsáveis pela pulverização dos pomares com defensivos, otimizando a defesa das árvores e reduzindo as perdas.

 

"Na média, a economia no uso de defensivos é de 20%, mas o percentual pode chegar a 40%. E a produtividade dos funcionários também aumentou. Trocamos músculos por cérebros".

 

Originalmente usado no segmento de mineração - "trouxemos os softwares para a superfície", afirmou Flávio -, o sistema é todo integrado. Quando concluído, aglutinará as informações de todas as fazendas de laranja da empresa e mesmo dados de outros braços do Votorantim, como a VCP, focada em celulose e papel.

 

Nesta frente, os investimentos em curso já fazem parte de um outro pacote "agrícola", de R$ 300 milhões, iniciado em 2008 e com prazo para terminar em 2013. Segundo o executivo, a previsão de aportes está mantida apesar do cenário adverso, pelo menos por enquanto. "Na crise, o que muda é o ritmo de expansão. O foco em custo é primordial e temos que continuar investindo", afirmou.

 

Até porque, argumenta, mesmo com o pé no freio haverá um plantio "inercial", derivado de renovações de pomares em andamento, de mais de 700 mil árvores apenas neste ano. Nas fazendas da empresa, o ritmo de renovação varia entre 3% e 5% do total por safra, com mais plantas no mesmo espaço.

 

Na fazenda de Itapetininga, por exemplo, há, atualmente, 1000 árvores plantadas por hectare; há dez anos, eram apenas 300. Em geral, incluindo outras empresas e produtores, a área de laranja em São Paulo vem caindo, mas o número de árvores está em alta. Na estratégia das indústrias de suco, as fazendas próprias representam de 30% a 40% da demanda total de laranja. Outra fatia semelhante vem de "citricultores-parceiros" com contratos de fornecimento de longo prazo, e o restante é adquirido no mercado spot.

 

Mudanças radicais nesse balanço podem desequilibrar as contas. Hoje, no spot, a caixa de 40,8 quilos da laranja destinada às indústrias custa menos de R$ 4. O custo de produção da Citrovita é de R$ 6 a R$ 7, abaixo da média paulista (superior a R$ 10), o que mostra que, hoje, poderia até ser melhor financeiramente comprar no spot.

 

Ao detalhar a estratégia, Milton Flávio procura espantar qualquer impressão de que a crise de preços pode estar sendo mais severa com a Citrovita do que com as concorrentes. Hoje são quatro as grandes exportadoras de suco, que formam um oligopólio investigado há anos pelas autoridades brasileiras por uma suposta formação de cartel e, pelas americanas, por um suposto dumping nas exportações.

 

Há dez anos, eram cinco - a Cargill deixou a atividade no Brasil -, e em dez anos poderão ser três, sobretudo se a queda da demanda internacional mostrar-se permanente, como muitos analistas acreditam. Independentemente das perdas do grupo Votorantim com derivativos, em 2008, a Citrovita garante que será uma das três.

 

Veículo: Valor


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