Ricos querem reduzir consumo de carne

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O G-8, grupo das nações mais desenvolvidas, está propondo a redução do consumo global de carnes em favor de uma "dieta mais balanceada", como uma das maneiras para controlar preços das commodities e ajudar no uso sustentável dos recursos do planeta.

 

A proposta abriu um confronto com Brasil, Austrália e Argentina, grandes produtores de carnes e convidados pelo G-8 para seu primeiro encontro agrícola da história, que ocorrerá neste fim de semana na Itália.

 

A busca de uma "estratégia comum de combate a futuras emergências alimentares globais" foi tomada pelo G-8 (EUA, Alemanha, Japão, França, Reino Unido, Canadá, Itália e Rússia) no encontro de cúpula dos líderes no ano passado, no Japão, quando os preços agrícolas provocavam violentos protestos de rua em vários países.

 

A situação mudou desde então, com a recessão global e a queda no custo de energia derrubando os preços agrícolas em até 50%, embora eles estejam ainda acima dos níveis anteriores à crise. A queda nos preços é considerada apenas uma fase cíclica, diante de sérios problemas estruturais na agricultura mundial.

 

Agências das Nações Unidas e vários centros de pesquisa estimam que a retomada do crescimento econômico poderá deflagrar uma nova alta de custos das commodities, criando sérios problemas em países em desenvolvimento e tendências inflacionárias perigosas em países desenvolvidos também.

 

A presidência italiana do G-8 convidou o G-5 emergente (Brasil, China, Índia, México e África do Sul), além de Argentina, Austrália e Egito e organizações internacionais para o que o ministro de Agricultura da Itália, Luca Zaia, chama de "desenhar o mapa" para restaurar a produção agrícola, conter o fenômeno especulativo nos preços dos alimentos e estimular investimentos e uso sustentável dos recursos naturais.

 

Só que Brasil, Argentina e Austrália se confrontaram com um texto já pronto, na semana passada, e reagiram com irritação . Exigem a negociação de novo texto. Do contrário, não assinam o documento. O ministro da Agricultura do Brasil não confirmou até agora sua presença.

 

Na avaliação brasileira, a estratégia do G-8 mescla discursos de organizações não-governamentais (ONGs) com a visão europeia de agricultura familiar, de produção regional que é turbinada por subsídios. "Para cada caloria que comemos, precisamos usar até sete apenas para transportar o alimento", argumenta o ministro Zaia, para justificar produção mais local, em vez de importações.

 

Nesse cenário, vem o ataque ao consumo de carnes. O G-8 considera que os preços dos alimentos têm aumentado pela crescente demanda de nova classe média na Ásia e na América Latina, com mais pessoas consumindo mais carnes, leite, frutas e vegetais. E, à medida que há mais consumo de carne, mais grãos e mais água são necessários para alimentar o gado, aumentando essa demanda.

 

Assim, o G-8 sob a presidência italiana propõe na discussão sobre segurança alimentar global uma "gradual mudança do consumo de carnes para uma dieta mais balanceada", que não diz qual seria. O Brasil rebateu com comentários por escrito, insistindo que não há razões científicas para esse tipo de medida. Um negociador reagiu indagando se os ricos querem que todo mundo se torne vegetariano.
"Isso [sobre a carne] surpreende porque a possibilidade de os países em desenvolvimento consumirem mais carne melhora a dieta em termos de proteína", declarou o chefe do Departamento Econômico do Itamaraty, ministro Carlos Márcio Conzandey.

 

As exportações de carne estão no centro da agenda agrícola brasileira com a China, Rússia, Coreia do Sul, Malásia, Indonésia e outros grandes emergentes e outros países em desenvolvimento. Uma recomendação aprovada no G-8 para reduzir consumo de carne terá efeito nas políticas adotadas tanto por certos países, como pelo grupo de ação da ONU contra crise alimentar, pelo Programa Alimentar Mundial (PAM), pela Agência das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), que também participam da reunião na Itália.

 

O Brasil acha que o diagnóstico do G-8 sobre o movimento especulativo na volatilidade dos preços está correto. Mas não as soluções propostas. Além de atacar as carnes, o grupo composto na maior parte por importadores ignora o papel da agricultura comercial para evitar crise alimentar global. E por tabela evita o tema das subvenções que distorcem o comércio agrícola internacional.

 

Sobre a bioenergia, o G-8 defende que seja desenvolvida de forma que fortaleça o setor agrícola. Os ataques à produção de etanol não constam, pelo menos não ainda, no texto preparado por Roma.

 

O G-8 agrícola ocorrerá de sábado a segunda-feira na região de Treviso, perto de Veneza. Os italianos não escondem o desconforto com a demora do ministro brasileiro da Agricultura em responder se vai aparecer, justamente quando a diplomacia brasileira tem lutado por anos para se sentar à mesa de decisões e influenciar.

 

Veículo: Valor Econômico


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