Varejo tributário

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A persistência da pesada tributação sobre os investimentos inibe a modernização e a expansão do parque produtivo, reduz a competitividade da economia brasileira e retarda seu crescimento. Por isso, é uma boa notícia a prorrogação, até o fim do ano, da isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para bens de capital, tratores e caminhões e da incidência de alíquota menor, de 4%, para os veículos comerciais leves. No entanto, tomada em caráter excepcional e de efeitos limitados, a medida é consequência de um regime fiscal e tributário inadequado e da política do governo marcada pela preferência explícita por alguns setores da economia.

 

Os benefícios fiscais, destinados a conter os efeitos da crise financeira mundial sobre a economia brasileira, deveriam vigorar só até o fim deste mês. Confirmada pelos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Desenvolvimento, Miguel Jorge, a extensão de sua validade por mais seis meses se destina, segundo o governo, a ajudar um setor que demorou para se recuperar.

 

A justificativa não é inteiramente procedente, pelo menos no caso dos tratores e caminhões. A produção acumulada desses itens nos cinco primeiros meses de 2010 é bem maior do que a de igual período do ano passado. No caso das máquinas agrícolas e automotrizes, por exemplo, o aumento é de 53,8%, uma variação expressiva, mesmo levando em conta o fato de que a produção dos primeiros cinco meses de 2009 foi fortemente afetada pela crise. É uma indicação clara de recuperação.

 

Também no caso dos caminhões a alta das vendas é notável. As vendas de caminhões semileves, leves, médios, semipesados e pesados no período janeiro-maio de 2010 foram 57,3% maiores do que as dos primeiros cinco meses de 2009. No caso dos veículos comerciais leves, a alta foi de 24,8%, de acordo com o mais recente relatório mensal de produção e vendas divulgado pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

 

A alíquota regular do IPI sobre tratores e caminhões é de 5%; para os veículos comerciais leves é de 8%. O custo da extensão da isenção ou da redução do tributo até o fim do ano é estimado em R$ 775 milhões. Esse é o montante que deixará de ser arrecadado pelo governo de julho a dezembro em razão da bondade anunciada, mas, segundo o ministro Guido Mantega, não haverá necessidade de cortes adicionais no Orçamento, pois "os benefícios já estavam em vigor".

 

O ministro não acredita que a extensão das medidas tenha algum impacto sobre a inflação, pois, segundo alega, os benefícios tributários evitariam uma eventual pressão sobre os preços de bens de capital, tratores e caminhões.

 

Ainda que se aceite a argumentação do ministro da Fazenda, o que se deve indagar é se a medida, aparentemente desnecessária - pois são claros os sinais de aumento da produção e das vendas dos produtos beneficiados -, não é também inoportuna, pois está sendo anunciada justamente no momento em que, por causa do intenso ritmo de atividade da economia, o Banco Central (BC) alerta para o risco de aceleração da inflação nos próximos meses.

 

Na avaliação do BC, a demanda interna está "robusta" por causa dos fatores que a têm estimulado nos últimos meses, como o aumento da renda da população, a expansão do crédito e os "estímulos fiscais e creditícios". Tudo isso, segundo o BC, deve contribuir para consolidar o processo de crescimento da produção e para a redução da capacidade ociosa do setor produtivo. Em resumo, com novos benefícios tributários, o próprio governo ajuda a aumentar as pressões sobre os preços e força novas altas nos juros básicos.

 

Melhor seria que, em lugar de conceder benefícios para indústrias ou setores da economia que escolhe de acordo com critérios nem sempre claros, o governo tratasse de melhorar o sistema de impostos, desonerando os investimentos, que estão na base do crescimento da economia. Isso exigiria, como contrapartida, a adequação de seus gastos a um novo nível de arrecadação tributária.

 


Veículo: O Estado de S.Paulo


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