A valorização cambial voltou a ajuda a inflação medida pelo Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M) em abril. Depois de variar 0,62% entre fevereiro e março, quando o câmbio médio com o dólar foi de R$ 1,66, o IGP-M aumentou 0,45% neste mês, auxiliado por uma taxa média de câmbio a R$ 1,58. Ao tornar os bens importados mais baratos, ao mesmo tempo em que os preços das commodities caíram no mercado internacional, o câmbio valorizado foi "a carta da manga no combate a inflação", avalia Salomão Quadros, coordenador de preços da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Enquanto os bens industriais acumulam alta de 2,1% no ano, e 9% nos 12 meses terminados em abril, os produtos agropecuários registraram avanço muito superior - 5,2%, entre janeiro e abril, e 25,3% nos 12 meses terminados em abril. No entanto, foram justamente os itens ligados às commodities agrícolas os que registraram maior recuo neste mês.
As matérias-primas brutas, que acumulam forte alta de 36,7% nos 12 meses terminados neste mês, registraram em abril deflação de 0,5%. Preços importantes, como algodão e arroz, registraram forte recuo no mês - o algodão em caroço passou do forte avanço de 8,8% em março para queda de 3,9% em abril, enquanto o arroz acelerou a queda de preços, passando de -3,9%, em março, para -7,6%, em abril.
"A desaceleração do IGP-M começou e deve se aprofundar no segundo semestre", diz Quadros, para quem o governo ingressa hoje num período em que os instrumentos de combater à alta de preços voltam a fazer efeito. "Saímos de uma situação em que pouco podia ser feito para evitar o contágio da alta das commodities, entre o fim de 2010 e o início deste ano, para um período em que algo pode ser feito", diz o economista.
Segundo Quadros, no entanto, a ata do Banco Central, divulgada ontem, "ainda olha a inflação com os olhos de 2010", ou seja, ao dizer que a alta de preços foi muito influenciada pelo contágio externo, abrindo espaço para uma combinação entre política monetária mais suave e novas medidas macroprudenciais de controle do crédito, os diretores do BC estão desconsiderando, avalia Quadros, "que a inflação está cada vez mais repercutindo a forte demanda interna".
Nos 12 meses terminados em abril, itens como preços dos serviços, que respondem integralmente às condições internas de demanda, acumularam alta de 7%, enquanto os bens duráveis registraram queda acumulada de 1%. A valorização do câmbio, avalia Quadros, foi "direta" no caso dos produtos industriais, como os bens duráveis. Nos 12 meses terminados em dezembro, esse ítem acumulara alta de 0,5%, e o câmbio era cotado a R$ 1,70.
"A valorização pode não ser bem vista por outros segmentos, especialmente os exportadores, mas neste momento está sendo o principal fator pró-estabilização dos preços", diz Quadros, para quem, no entanto, é difícil esperar por novas rodadas de valorização. "Sem a escalada internacional nos preços das commodities, a economia está mais sensível à demanda interna, e as medidas macroprudenciais sozinhas não resolvem esse tipo de inflação", afirma.
A alta de preços agrícolas, que começa a ceder, impulsionou o "desvio" da cana-de-açúcar que iria para as usinas de moagem para fabricação de álcool combustível para a produção de açúcar, em alta no mercado externo. Assim, o preço do álcool hidratado, que é misturado à gasolina e vendida nos postos, aumentou 11,7% em abril - variação que, no entanto, pouco influenciou o IGP-M, uma vez que já subira 11,4% em março.
A situação no atacado, no entanto, ainda não chegou ao consumidor. Em abril, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), que responde por 30% do IGP-M, registrou avanço de 0,78%, puxado pelo incremento de 0,87% no item alimentação, tendo itens como cebola e batata-inglesa subido 24% e 20%, respectivamente. Segundo Quadros, os movimentos do atacado só serão sentidos no varejo a partir de junho.
Representando 10% do IGP-M, os preços na construção civil aumentaram 0,75% neste mês, influenciados pela alta de 1,1% no item mão de obra, influenciados pelos reajustes salariais no Rio de Janeiro (RJ) e em Salvador (BA).
Veículo: Valor Econômico