As medidas adotadas pelo governo para reduzir o ritmo de expansão da economia (encarecimento do crédito e aumento da taxa básica de juros) afetaram a produção industrial em abril com reflexos em bens de consumo e no investimento. A produção de bens de capital recuou 2,9% em abril sobre março na série livre de influências sazonais, acima do recuo da média da indústria, que foi de 2,1% na mesma comparação, segundo dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O recuo da indústria em abril veio após o setor acumular alta de 3,3% no primeiro trimestre do ano, e pode ser o início de um período mais desfavorável para o setor, dizem analistas consultados pelo Valor. Embora forte em bens de consumo duráveis e de consumo (influenciados pela queda de 2,9% em automóveis), a produção de abril mostrou uma desaceleração bastante espalhada na indústria. Pelos dados do IBGE, menos da metade dos setores pesquisados (45,1%) cresceram em abril na comparação com abril do ano passado, percentual que ficou abaixo da média histórica para esse mês (52%). Com ajuste sazonal, de abril para março, o percentual dos setores que cresceram foi de apenas 48%, segundo contas da LCA Consultores.
Além do efeito das medidas para conter o crédito, uma expectativa menos otimista dos empresários em relação ao setor e ao câmbio pode ter trazido para baixo a produção de bens de capital e de bens de consumo (essa, com recuo de 10,1% em abril sobre março). Analistas divergem, no entanto, sobre a duração desses movimentos. Enquanto alguns veem com preocupação o atual recuo na produção de bens de capital, outros acreditam que o arrefecimento seja apenas pontual.
Para Thovan Tucakov, da LCA Consultores, pode ter havido uma antecipação da compra de máquinas e equipamentos no primeiro trimestre, devido à perspectiva de término em março do Programa de Sustentação do Investimento (PSI) do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), adotado após a crise de 2009 para fornecer subsídios à compra de bens de capital. "Essa desaceleração de agora é mais pontual. As decisões de investimento serão menores, mas ainda assim, 2011 terá um número bom", diz o economista, para quem a Formação Bruta de Capital Fixo (FCBF) deve crescer 6,5% neste ano, quase o dobro de sua projeção do PIB, de 3,4%.
Rogério César de Souza, do Instituto de Estudos para Desenvolvimento da Indústria (Iedi), discorda dessa opinião. "Essa queda [da produção de bens de capital] pode ser consequência de uma redução das expectativas com relação ao andamento da economia, o que influencia os investimentos. O que os empresários não é somente seus custos, mas também a expectativa da indústria de conseguir vender seu produto lá na frente", afirma.
Dados divulgados ontem pela Fundação Getulio Vargas (FGV) reforçam a visão do economista do Iedi. O Índice de Confiança da Indústria (ICI), calculado pela fundação, recuou para 109,9 pontos em maio, número 1,2% menor do que o registrado em abril, quinta queda consecutiva do indicador, que já acumula 4% de arrefecimento no ano. Além do Índice de Situação Atual, que teve queda mensal de 1,7%, o Índice de Expectativas recuou 0,7% na mesma comparação. "As expectativas quanto ao futuro estão caindo. Isso é um sinal ruim, porque o país ainda precisa de investimentos", diz Souza.
O cenário atual, por outro lado, pode ter vindo dentro das expectativas do governo, diz José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator. "A produção de bens de capital e de bens duráveis são sensíveis ao crédito. Isso seria um bom sinal no sentido de que o BNDES continua emprestando, embora menos, e a demanda por bens de consumo está sofrendo por conta da política monetária. Se olharmos pelo lado da inflação, isso é um dado positivo."
Gonçalves acredita ainda ser cedo para afirmar que a indústria continuará em trajetória de desaceleração, mas destaca que o dado de abril veio em consonância com o andamento da economia. "A desaceleração [da indústria] vai no tom da desaceleração da economia como um todo, mais concentrada em duráveis do que em bens de capital."
Tucakov, da LCA, projeta que a produção industrial fechará 2011 com crescimento de 2,5% sobre 2010, longe dos 10,5% registrados no fim do ano passado. "Se pegarmos os últimos seis meses, excluindo abril, a indústria vem crescendo a uma taxa de 0,5% ao mês. A partir de maio, essa taxa deve desacelerar para 0,4%", projeta.
Veículo: Valor Econômico