O Brasil questionará uma série de práticas da União Europeia (UE) que afetam exportações brasileiras, durante exame da política comercial europeia, que será feito amanhã pela Organização Mundial de Comércio (OMC). A UE é o maior exportador e maior importador mundial, incluindo bens e serviços, e suas práticas têm efeito direto sobre os parceiros.
A delegação brasileira abordará questões que abrangem agricultura, barreiras não tarifárias, taxação sobre emissões de gases de aviões estrangeiros, eliminação de vantagem tarifária para emergentes e políticas de biocombustíveis.
Nesse exercício, os países levantam os principais problemas com o parceiro, que muitas vezes terminam em litígio diante dos juízes da OMC, sob alegação de violarem regras do comércio internacional. O exercício ganha mais importância, porque dois casos contra a UE estão no radar do Brasil, envolvendo problemas nas exportações de carne bovina e de frango para o mercado comunitário.
Um deles se refere ao padrão de comercialização do frango brasileiro, que é exportado congelado e, uma vez na Europa, precisa ser descongelado para ser vendido. A Câmara de Comércio Exterior (Camex) aprovou, em agosto de 2010, a abertura de disputa contra a UE na OMC. Até agora, porém, falta uma decisão final do próprio setor exportador e "o momento" de deflagração da denúncia.
Outra denúncia pode envolver a discriminação contra as exportações de carne bovina dentro da Cota Hilton, de melhor qualidade e maior preço. O setor privado diz que pedirá para o governo abrir o caso, já que Bruxelas exige dos brasileiros o que não demanda de outros exportadores, como os EUA. Até agora, porém, nenhum pedido do setor privado foi formalizado ao Itamaraty. Além disso, será necessário passar antes pela Camex.
As autoridades brasileiras também estão preocupadas com o endurecimento unilateral europeu em relação às regras sanitárias e fitossanitárias, o que pode afetar o Codex Alimentarium, grande acordo internacional que estabelece as regras nessa área.
Para a delegação brasileira, a ação da UE - com o uso de seu sistema de alerta rápido contra questões sanitárias e fitossanitárias no comércio - tem um viés contra o exportador. O Brasil quer saber também a destinação de ajudas diretas de € 210 milhões dados por Bruxelas para produtores de legumes, no rastro da crise da bactéria E.coli, que já matou dezenas de pessoas na Europa.
O questionamento sobre biocombustíveis é tradicional. O Brasil quer saber qual a base dos critérios de sustentabilidade que os europeus querem impor e como isso se compatibiliza com as regras internacionais do comércio.
Outra suspeita de falta de compatibilização é em relação à reforma do Sistema Geral de Preferência (SGP) europeu e as regras da OMC. Bruxelas anunciou que pretende cancelar a preferência tarifária que concede a exportações do Brasil e de outros emergentes. Ou seja, acaba com a redução tarifária sobre uma série de produtos exportados para a Europa.
O SGP europeu tem beneficiado cerca de 12% das exportações do Brasil para o mercado europeu. Foram, em média, € 4 bilhões por ano vendidos com redução tarifária de três pontos percentuais, beneficiando produtos como máquinas e equipamentos, automóveis, produtos químicos, plásticos, têxteis, além de frutas, legumes e óleos.
Na área de serviços, uma das suspeitas de ilegalidade é em relação ao projeto europeu que cobrará das empresas o pagamento pela poluição gerada em voos sobre a Europa, a partir de 2012. China e EUA ameaçam entrar com denúncia na OMC. Bruxelas avisa que, se o Brasil adotar medidas que reduzam os impactos da mudança climática gerada por voos com destino à Europa, ficará isento da taxa.
Continua também no radar brasileiro o sistema de apreensão de mercadorias, incluindo remédios, no mercado europeu. A questão é como Bruxelas harmoniza as regras que estabelece para o bloco com as impostas em nível nacional. Todo esse questionamento em Genebra coincide com mais uma rodada de negociações entre o Mercosul e a UE, em Bruxelas, na tentativa de um acordo de livre comércio birregional. Mais uma vez não haverá troca de ofertas de liberalização agrícola, industrial e de serviços. A expectativa é que isso ocorra somente em outubro.
Veículo: Valor Econômico