O mau desempenho das indústrias de calçados, artigos de couro e produtos têxteis está trazendo para baixo a produção industrial em Santa Catarina e no Ceará, Estados dependentes da produção desses setores. Apesar do crescimento de 1,6% da indústria nesse último Estado em maio sobre abril, feitos os ajustes sazonais, no acumulado do ano o setor fabril cearense acumula perda de 9,8%, segundo a Pesquisa Industrial Mensal (PIM) regional, divulgada ontem pelo IBGE. Em Santa Catarina, cuja produção caiu 2,4% na ponta, quinta variação negativa consecutiva, a queda acumulada entre janeiro e maio é de 3,8% na comparação com os mesmos meses de 2010.
Segundo sindicatos dos setores dos dois Estados consultados pelo Valor, a queda na demanda, a desaceleração da atividade econômica e a concorrência do produto importado estão afetando a produção de forma mais forte no primeiro semestre do ano.
O IBGE destaca em seu indicador conjuntural que o ramo de calçados e artigos de couro foi o principal responsável pela retração da indústria cearense nos cinco primeiros meses do ano, com queda de 24,3% no período em relação ao mesmo período do ano passado. Na mesma base de comparação, a produção têxtil caiu 7,6%. A produção têxtil de Santa Catarina diminuiu 18,2% na mesma ordem.
Para Francisco Paiva das Neves, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Calçados, Bolsas e Luvas do Ceará, a queda na produção do setor nos primeiros cinco meses do ano, que é sazonal, foi agravada pelo efeito câmbio e pelas importações da China.
De acordo com a Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), o volume importado de produtos têxteis pelo Brasil aumentou 24,5% entre janeiro e maio de 2011, na comparação com mesmo período ano passado. A importação no setor de artefatos de couro e calçados foi 35,6% maior no mesmo período.
O presidente do Sinditêxtil doCeará, Ivan Bezerra Filho, destaca que o movimento de recuo é generalizado. Na produção nacional, os setores têxtil e de calçados e artigos de couro tiveram a maior retração dentre os 27 gêneros da indústria pesquisados em janeiro a maio deste ano frente ao mesmo período de 2010, de 11,9% e 7%, respectivamente. "Só o fato de a economia estar crescendo metade do que cresceu no passado já dá um esfriamento", diz. A alta dos insumos com o choque do algodão no ano passado e o preço mais competitivo do importado também bateram com força na produtividade do setor, afirma Bezerra, para quem "infelizmente" o Brasil está passando por um processo de desindustrialização precoce. "O mercado sumiu. No Ceará, há duas fábricas paradas, em férias coletivas."
Em Santa Catarina, Estado que concentra 70% da manufatura de malhas e toalhas, a produção também foi atingida pelo inverno tardio neste ano, explica Ulrich Kuhn, presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário de Blumenau (Sintex) e membro do conselho da Hering. "Quando há uma primeira onda de frio antes do Dia das Mães, as compras do varejo são boas. Neste ano, o inverno está forte, mas tardio, o que afetou o varejo."
Outro fator de peso, segundo ele, é a queda substancial nas exportações de artigos de cama, mesa e banho, mas, para o presidente do Sintex, a alta nos insumos e o aumento das importações são os principais responsáveis pelos resultados ruim do setor neste ano.
Neves, representante dos trabalhadores têxteis do Ceará, ressalta que o recuo na produção do Estado se deu sobre 2010, ano excepcionalmente bom para as indústrias da região, quando, até maio, a produção da indústria cearense havia crescido 16,3%. "As empresas faturaram como jamais imaginaram ter faturado em um ano. As nove fábricas do Estado trabalharam sábados, domingos e feriados em 2010", conta. "Isso compensa de certa forma a queda nas exportações". Segundo a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), o setor de calçados e artigos de couro exportou 47% menos em volume de janeiro a abril deste ano sobre mesmo período de 2010.
Segundo o IBGE, a produção da indústria cresceu em 11 dos 14 locais pesquisados entre abril e maio. Descontados os efeitos sazonais, o maior crescimento se deu em Goiás, com avanço de 15%, revertendo queda de 4,6% registrada nos últimos dois meses. Houve crescimento acima da média nacional, de 1,3%, na Bahia, com 4,5%, Amazonas, 3,9%, Paraná, com 3,6%, Pará, com 2,7%, São Paulo, com 1,9% e Ceará, com 1,6% de avanço da produção industrial entre abril e maio. Apresentaram resultados positivos, ainda que abaixo da média nacional, Pernambuco, com 0,8%, Minas Gerais, com 0,7% e Rio Grande do Sul, com 0,4% de avanço. A produção caiu em Santa Catarina (2,4%), Rio (1,8%) e Espírito Santo (0,3%).
Veículo: Valor Econômico