Inflação é desafio com taxas de juros menores

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Índice de preços em BH e IPC-S acumulam alta de mais de 7% em 12 meses. Para especialistas, corte de 0,5 ponto na Selic não deve gerar pressão por reajustes agora e tendência é de queda


 
Quem percorre sempre as gôndolas do supermercado e tem a reclamação contra o aumento dos preços na ponta da língua treme com a pergunta: Os preços vão subir? O temor decorre da controversa decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que reduziu a taxa básica de juros da economia brasileira, a Selic, de 12,50% para 12%. Afinal, se o argumento para manter a alta da taxa era conter a inflação, a queda pode provocar alta de preços? Um dia depois do anúncio do BC, os índices divulgados ontem mostram que o aumento de preços segue seu tom. A inflação em agosto, em Belo Horizonte, subiu 0,31% e já acumula em 12 meses alta de 7,63%, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo divulgado ontem pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (Ipead) da UFMG.



O Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S), da FGV, apresentou variação de 0,40%, 0,09 ponto percentual (p.p.) acima da taxa registrada na última divulgação. Com esse resultado, o indicador acumula projeção de alta de 4,17% no ano e 7,10% nos últimos 12 meses.



Como a decisão do Copom, de reduzir tanto a taxa, foi considerada surpreendente pela maioria dos analistas, o medo é de que em pouco tempo o efeito seja danoso, impactando aumento de preços. “Não vai ser o corte da taxa que vai fazer a inflação sair do trilho”, opina o professor Wanderley Ramalho, coordenador de pesquisa e desenvolvimento do Ipead. Segundo ele, os cinco aumentos sucessivos da taxa já têm efeito prolongado na economia, e uma decisão de agora só repercutirá nos movimentos dos preços em no mínimo em seis meses. Ontem, o Ipead divulgou também as variações nos preços da cesta básica, que ficou 2,82% mais cara, entre agosto e julho. Na variação dos últimos 12 meses, contudo, o aumento assusta, chegando a 18,17%. “Se não fossem as intervenções do Copom aumentando a taxa de juros, esse quadro poderia ser ainda pior”, avalia Ramalho, acrescentando que não é possível, contudo, tocar a política econômica apenas com aumento de juros.



Sem pressão Não havia mais justificativa para manter o aumento dos juros e nem para acreditar que a decisão terá impacto sobre o aumento dos preços, segundo o professor Frederico Gonzaga Jaime Júnior, da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG: “A economia brasileira já começou a ter desaceleração de crescimento significativa, acima do que se esperava, demonstrando que não há razão para se imaginar que haverá pressão de demanda. Se a inflação subir, não será por isso”, acredita o professor.



Ele exemplifica com os próprios dados do aumento de preços divulgados pelo Ipead. O ítem da tabela que mais puxou o índice para cima foram os alimentos de elaboração primária (carne, leite, arroz e feijão). Esses elementos tiveram variação positiva de 1,54%, no último mês. “Itens alimentícios como esses não sofrem impacto imediato da redução de juros, o consumo deles não aumenta porque os juros caem.” diz Gonzaga.



A justificativa do Copom para a queda da taxa de juros baseou-se fundamentalmente no contexto internacional. A lógica do BC foi de que o desaquecimento de grandes economias globais já seria danosa ao crescimento do Brasil, não havendo necessidade de forçar a dose de zelo, aumentando ainda mais os juros. Na avaliação do professor Ramalho, o argumento é “exagerado”, porque os impactos da crise internacional não devem ser imediatos como em 2008.



Enquanto isso, a Casa Branca reduziu a previsão para o crescimento da economia dos Estados Unidos para 1,7%, mostrando que o desemprego pode ficar em média em 9% em 2012 e prevendo um crescimento menor do que o esperado para os próximos anos. Em fevereiro, o governo Obama previa que a economia cresceria 2,7%.

 

Impacto para consumidor será pequeno

 

“Olha, se aumentar mais os preços, eu não sei como vai ser, porque a sensação que a gente tem é de que o dinheiro vale cada vez menos. Tudo fica mais alto, menos o salário”, disse a atendente de telemarketing Daniela Renata Nunes, que fazia compras na tarde de ontem, no Hipercentro de Belo Horizonte. O aumento de preços, especialmente de alimentos, leva o consumidor a embarcar nas estratégias de marketing dos supermercados: “Você fica igual a uma louca correndo atrás das ofertas”, conta a empresária Sônia Brito.



Para quem gere o próprio negócio, as tensões entre aumento dos juros e crescimento do consumo são ainda piores. A dona de lanchonete Cleonice Eliane da Silva fica numa sinuca de bico: “O movimento cai com o aumento do preço, mas quando chego no supermercado e vejo variações como a do leite e da carne, não tenho como não repassar os valores nos preços que cobro na lanchonete. Fica difícil crescer também com as dificuldades de crediário e financiamento”.



Embora o impacto na inflação possa ser tardio ou minimizado, por conta do atraso habitual entre as decisões do Copom e a realidade de variação de preços, o resultado, na ponta dos juros já deve começar a ser sentido em 15 dias, de acordo com o vice-presidente Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel Ribeiro de Oliveira.



De acordo com ele, contudo, o impacto deve ser pequeno, rendendo, na ponta do lápis, poucos centavos de vantagem para o consumidor, no geral. “No caso do financiamento de automóveis, onde o impacto deve ser maior, o desconto, a partir da redução da taxa, deve ficar próximo de R$ 7, por exemplo. O efeito é maior em financiamentos de prazo mais longo e com produtos de maior valor”.



Ainda assim, o consumidor não deve, na avaliação do Ipead, baixar a guarda para as taxas de juros cobradas na ponta do consumo final. “Ninguém deve soltar foguete porque a taxa caiu. Se o consumidor ficar animado demais com a Selic, pode se enrascar nos juros”, diz o professor Ramalho, exemplificando com taxas como a do cartão de crédito, de 12,60%, em agosto, o que dá juros anuais de 315,39%.

 



Veículo: O Estado de Minas


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