Mantega diz que juros podem subir para evitar contaminação de preços

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Ministro afirma que aumento da Selic contém expectativas de alta da inflação e inibe reajustes

Apesar do discurso pró-juros, Fazenda diz que decisão é do BC, que faz, na semana que vem, reunião para definir taxa

O ministro Guido Mantega (Fazenda) deu sinais, ontem, de que a taxa de juros poderá subir para conter as expectativas de aumento da inflação e para inibir reajustes em outros setores da economia.

A avaliação de Mantega é que os preços estão sendo influenciados por aumentos temporários de alimentos, que devem refluir com o fim do período de chuvas.

Mas, indicou, é preciso agir para evitar que esse movimento se propague. "Inflação de alimentos não se resolve com juros, porém expectativas se resolvem com juros."

"O que nós temos hoje é que, com essa elevação pontual e localizada da inflação [nos alimentos], você pode correr o risco de uma contaminação para setores que não têm aumentos de custos e que queiram aumentar os preços. Então você tem que dar uma sinalização de que os preços não vão continuar subindo."

Mantega enfatizou que o governo está atento à aceleração da inflação, uma vez que ela afeta as pessoas de renda mais baixa e atrapalha investimentos.

"Não titubeamos em tomar medidas, inclusive as consideradas não populares, como a elevação da taxa de juros, quando isso é necessário", disse, durante evento da revista "Brasileiros".

Apesar do discurso pró-juros, o ministro ressaltou que a decisão sobre a taxa é do Banco Central.

No Rio, o presidente do BC, Alexandre Tombini, reforçou o discurso contra a inflação.

"O que temos dito é que não há e não haverá tolerância com a inflação. Estamos monitorando atentamente todos os indicadores", disse.

MERCADO CRÊ EM ALTA

Os discursos foram interpretados como sinal verde para a alta da taxa, hoje em 7,25% ao ano.

Nos contratos de juros futuros para janeiro de 2014, negociados na BM&F, a taxa fechou em 8,17%. Como reflexo, o dólar encerrou o dia em queda, a R$ 1,967.

A próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) do BC, que define a taxa Selic, está marcada para a semana que vem, e a Folha apurou que o governo já trabalha com alta dos juros em abril.

Mas analistas ainda têm dúvidas sobre quando o BC tomará essa decisão.

Para o economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros, o BC subirá os juros para 8,25% neste ano, mas só a partir de maio. Um dos motivos é esperar mais informações sobre a recuperação do crescimento econômico.

Ontem, o BC revelou que a atividade caiu em fevereiro.


Prato inflacionado

Preços salgam alimentos básicos do brasileiro, como farinha de mandioca e feijão

Na casa do aposentado Luiz Carlos da Fonseca, 58, só ele vai ao supermercado. A cada mês, diz, compra a mesma lista de produtos. Mas os gastos aumentam, e a culpa, na sua percepção, é dos preços dos alimentos.

"Há um ano, fazia a compra do mês com R$ 450. A despesa foi subindo cada vez mais, e, no mês passado, cheguei a gastar R$ 700."

O ex-garagista, pai de quatro filhos e morador do subúrbio carioca de Del Castilho, controla todo o orçamento da família. "Minha mulher é muito gastona", justifica.

Fonseca sentiu no bolso a alta persistente dos alimentos desde o fim do ano passado, intensificada neste primeiro trimestre --quando a alimentação no domicílio subiu 5,58%, quase o triplo da inflação média pelo IPCA no período (1,94%).

A Folha fez um levantamento com os 146 produtos alimentícios pesquisados pelo IBGE em 11 capitais e regiões metropolitanas do país e constatou que 117 deles, ou 80%, ficaram mais caros no trimestre passado.

E os reajustes não foram nada modestos: 5 produtos tiveram alta maior do que 50%, 13 tiveram reajuste maior que 20% e 33 superaram 10%. Só 29 ficaram mais baratos.

No topo da lista, aparecem hortaliças e frutas como tomate (o campeão, com 60,9%), repolho (58,15%), açaí (55,66%), cebola (54,88%) e cenoura (53,3%).

Outros aumentos de destaque são de produtos típicos e básicos do prato do brasileiro, como batata (38,11%), farinha de mandioca (35,18%), feijão-carioca (22,85%) e mandioca (22,18%).

SEM FARINHA

Fonseca, adepto do hábito de anotar todas as despesas, reparou nos preços mais altos. "Eu pagava menos de R$ 2 pelo quilo da farinha de mandioca, que não faltava lá em casa. No mês passado, estava a R$ 7. Simplesmente não comprei." O aposentado diz ainda que, diante do preço salgado do tomate (R$ 9 o quilo), levou só três frutos.

Segundo Priscila Godoy, economista da Rosenberg & Associados, o clima desfavorável e as quebras de safra explicam os reajustes. Pesou ainda, afirma, o custo maior dos fretes com a nova lei que determina a troca de motoristas em viagens longas e os dois aumentos recentes do preço do diesel.

Um pequeno alívio veio de alguns produtos da cesta básica, que já vinham em queda e mantiveram a tendência após a desoneração promovida pelo governo no início de março. "Não sentimos ainda nenhum impacto da queda dos preços dos produtos desonerados."

Entre os itens que tiveram isenção tributária estão o arroz e as carnes, cujos preços caíram 2,28% e 0,62%, respectivamente, no primeiro trimestre. Ambos integram a refeição básica do brasileiro.

Angela Maria Ribeiro, dona de casa, diz que nos supermercados da zona oeste do Rio, onde mora com a família, os preços subiram antes da medida do governo de cortar tributos da cesta básica. "Tudo ficou mais caro. O arroz, o açúcar e o óleo de soja. Quando veio o desconto, os preços ficaram na mesma."

A expectativa de analistas é que, a partir de maio, comece a haver redução do preço dos alimentos.



Para consumidor final, queda deve demorar mais

Os brasileiros terão de ser acostumar a pagar mais para levar comida à mesa. Ou buscar produtos alternativos. Segundo especialistas, mesmo se recuarem, os preços devem seguir em patamares mais elevados nos supermercados.

Segundo Priscila Godoy, analista da Rosenberg & Associados, o grupo alimentação segue num ritmo "persistente" de alta e seus preços no varejo se distanciaram nos últimos meses de modo atípico dos valores no atacado.

Trata-se, diz, de efeito do consumo aquecido e do aumento do valor dos fretes. "Com o mercado de trabalho firme, é mais fácil repassar pressões de custos."

Para a economista, nem mesmo a desoneração da cesta básica trouxe alívio.

Os preços maiores de alimentos já rebateram no varejo, e as vendas de supermercados recuaram 2,1% em fevereiro na comparação com igual mês de 2012, na maior queda desde novembro de 2003.

Elson Teles, analista do Itaú, diz que o "grupo alimentação apresenta uma maior resistência" em ceder especialmente no caso dos produtos "in natura" (tomate, cebola, batata e outros), feijões, trigo e derivados.

Já André Braz, economista da FGV, vê uma "desaceleração" dos itens desonerados da cesta básica, que ganhou força no início de abril.

Carnes, óleo de soja e arroz intensificaram a tendência de queda dos preços, segundo dados da FGV. Já manteiga e margarina passaram à deflação, após o corte de tributos.



Veículo: Folha de S.Paulo


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