A política fiscal do governo mudou. Os gastos públicos já são guiados pelo desempenho da economia doméstica e a necessidade ou não de estímulos à demanda. Essa também deve ser a política até 2016, caso a presidente Dilma Rousseff seja reeleita.
"Estamos deixando claro desde o início que para 2013 e 2014 - e provavelmente será essa a política do governo para 2015 e 2016 - que o superávit primário será sempre uma variável da economia e não mais da dívida pública em si", disse o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin ao Valor, avalizando a gestão contracíclica da área fiscal.
É esse o sinal contido no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014, anunciado há duas semanas, e será o mesmo do decreto de gastos de 2013, que sai até sexta-feira.
Na visão do governo, não se trata de um menor compromisso com o controle das contas públicas. Pelo contrário. A mudança, segundo Augustin, só é viável porque novos fundamentos econômicos, como juros estruturalmente mais baixos e dívida pública em queda, além da crise mundial, abrem espaço para uma gerência fiscal mais ativa.
Para ser mais direto: o governo continuará abatendo investimentos e desonerações da meta de superávit primário e autorizará gastos mais elevados de Estados e municípios sempre que o crescimento da economia estiver baixo, como ocorre neste ano.
Mas isso não significará apenas redução de superávit. De acordo com Augustin, em momentos de aceleração do crescimento, o governo será mais contracionista e vai mirar numa meta fiscal mais alta.
Prova disso já teria, inclusive, sido dada, aponta o secretário do Tesouro: depois de um superávit de 3,4% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2008, o governo mudou de direção em 2009. Quando a economia encolheu 0,3%, o resultado fiscal caiu para 2% do PIB. Já em 2011, quando o crescimento vinha em ritmo acelerado depois de um PIB que aumentou 7,5% em 2010, o Ministério da Fazenda elevou a meta fiscal em R$ 10 bilhões num ano.
"Não é verdade que haja uma política fiscal menos cuidadosa, menos consolidada do ponto de vista da União. O que mudamos é que estamos exercendo mais a ideia de adequar a nossa situação fiscal aos ciclos econômicos", explica Augustin.
Mas os economistas, analistas ou quem mais esperar do governo o compromisso explícito com um número para o resultado primário vão perder tempo. Na prática, a política fiscal funcionará dentro de uma banda que estará implícita nos decretos bimestrais de contingenciamento e programação de gastos.
O secretário Arno Augustin não fala em banda para a política fiscal. A meta continua sendo de 3,1% do PIB, mas ele diz que é "importante" que o governo tenha "liberdade" para ser mais contracionista ou expansionista "dependendo do momento".
Na avaliação do chefe do Tesouro federal, se o governo fixar um percentual, corre o risco de não conseguir fazer uma política anticíclica. Se condições econômicas mudarem e a União não tiver instrumentos para gastar mais ou menos - seja o Fundo Soberano, seja o abatimento de investimentos e desonerações da meta de primário - a política fiscal será, de uma forma ou de outra, pró-cíclica.
Augustin conhece as críticas de que essa política traz insegurança, não é clara ou favorece a "contabilidade criativa", termo usado para designar as operações - todas legais - feitas pelo Tesouro em 2012 para fechar as contas.
Para ele, é preciso que esses críticos mudem a maneira de perceber a ação do governo. Devem incluir em seus modelos e análises variáveis que considerem a possibilidade de reação da política fiscal ao que acontece na economia.
Sobre a relação entre a política fiscal e a monetária, Augustin argumenta que cenários diferentes exigem respostas distintas. Em 2011, o governo aumentou a meta de superávit fiscal e ampliou o espaço para a queda de juros pelo Banco Central.
Por que não fazer o mesmo agora, quando o BC inicia um ciclo de aperto de juros? A resposta vem mais uma vez da economia. 2011 começou num ritmo de crescimento acelerado e mesmo com o superávit extra, o PIB cresceu 2,7%.
O cenário agora é o oposto. 2012 foi ano de crescimento fraco e 2013, apesar da lenta melhora, ainda não sustenta uma trajetória de recuperação clara. Nesse momento, portanto, a ação dos gastos governamentais deve ser no sentido de estimular a economia.
Arno Augustin, no entanto, classifica os estímulos necessários - investimentos públicos, sim; gastos correntes, não. É por essa lógica que o governo, segundo o secretário, autorizou por meio de medida provisória e antes que o Congresso tivesse aprovado o Orçamento de 2013 a liberação de dinheiro para os projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
A mesma regra vale para os Estados e municípios - a União autoriza novas dívidas para investimento. Como os Estados não têm caixa próprio e sem esse dinheiro as obras não seriam feitas, os recursos federais não criam espaço para novos gastos, na análise de Augustin.
A decisão de não compensar a queda no superávit dos Estados e municípios, anunciada no início do mês, também tem justificativa no momento econômico.
O secretário argumenta que não há sentido que o investimento aumente num nível da federação e caia no outro. No fim, o investimento total não sobe. "O que comanda a política fiscal é a economia, não é a relação dívida/PIB. É a nossa avaliação da economia. O que a gente mira é fazer o fiscal mais adequado para o momento."
Veículo: Valor Econômico