Em ano eleitoral, setor deve complicar inflação mais uma vez

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Por Arícia Martins | De São Paulo

O ciclo de aperto monetário e a perda de dinamismo do mercado de trabalho devem surtir algum efeito sobre os preços em 2014, mas é consenso entre economistas que a presidente Dilma Rousseff terá de lidar, ao longo do ano eleitoral, com uma inflação maior do que a alta de 5,73% prevista pelo mercado para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2013.

Do lado positivo, a ausência de choques externos e de problemas climáticos pode dar alívio aos preços de alimentos, que chegaram a subir 14% nos 12 meses encerrados em abril do ano passado. A inflação de serviços, no entanto, deve ficar acima do IPCA total pelo oitavo ano seguido. Esta pressão estrutural, aliada à volta de tarifas administradas "represadas" ao longo do ano passado, levará o indicador a avançar cerca de 6% este ano, percentual ainda mais afastado do centro da meta, de 4,5%.

Nos cálculos de Tatiana Pinheiro, do Santander, o grupo alimentação e bebidas vai ceder de 8,8% para 6% entre 2013 e 2014, com a influência de safras agrícolas ainda robustas e de melhores condições climáticas internas para a produção de alimentos in natura. Tatiana observa, porém, que essa trajetória não será suficiente para trazer a "inflação cheia" a um nível mais próximo do centro da meta, dado que o IPCA se mantém rodando em 6% devido a questões estruturais.

"O fator inercial está cada vez mais claro na evolução dos preços", diz a economista, o que deve manter os serviços acima do IPCA este ano, mesmo com um mercado de trabalho menos apertado e um reajuste real bem menor do salário mínimo, de 1%, refletindo o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2012. Nos 12 meses até a primeira quinzena de dezembro, os preços do grupo que reúne itens como empregado doméstico, costureira e aluguel saltaram 8,94%. Segundo Tatiana, em dezembro de 2013, a alta destes itens tende a ficar entre 7% e 8%.

O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, afirma que só um ajuste recessivo tiraria a inflação de serviços do nível de 8% a 9% que vem sendo observado ao longo dos últimos anos. "Há um grau forte de indexação nesse grupo, que faz com que o patamar do ano anterior se repita no ano seguinte", explica Vale, que projeta avanço de 6,5% para o IPCA deste ano.

Ao contrário de Tatiana, Vale avalia que os alimentos não vão dar folga à inflação. Em suas estimativas, o grupo alimentação e bebidas vai subir 8,7% em 2014, após alta de 8,3% em 2013. Segundo o economista, as safras serão boas, mas não "excepcionais" como as do ano passado e, além disso, há sempre riscos de problemas climáticos internos que podem levar a parte in natura a mostrar variações expressivas.

Outro vetor de aceleração sobre os preços vai partir de uma desvalorização adicional do real em relação ao dólar, de acordo com os economistas ouvidos. O Itaú Unibanco projeta que, no fim deste ano, a taxa de câmbio será de R$ 2,45, ante R$ 2,35 em igual período do ano passado. "Mas é claro que há o risco de o câmbio subir mais, e sabemos que o grupo alimentação é bastante sensível a variações do dólar", diz o economista Elson Teles, que prevê alta de 6% para o IPCA em 2014.

Fabio Romão, da LCA Consultores, calcula que o impacto do câmbio no IPCA vai se reduzir de 0,55 ponto percentual em 2013 para 0,25 ponto neste ano. No cenário da LCA, a taxa de câmbio no fim de 2014 será de R$ 2,35, contra R$ 2,37 no fim de 2013, mas Romão pondera que, em boa parte deste ano, a cotação da moeda americana ficará acima do que no mesmo período do ano passado, o que ainda deve motivar alguns repasses para os preços domésticos. Em suas estimativas, a inflação oficial será de 5,9% no acumulado de 2014.

Com peso de 23% no indicador oficial de inflação, a economista Adriana Molinari, da Tendências Consultoria, lembra que os preços administrados tiveram variação atípica em 2013, de apenas 1,3%, segundo suas estimativas, devido principalmente ao corte de 18% das tarifas de energia elétrica residencial e à ausência de reajustes no transporte público.

Como, em 2014, grande parte dos reajustes devem ser feitos conforme os contratos, diz Adriana, os itens monitorados devem subir 4,3%, mudança que, sozinha, adiciona 0,75 ponto percentual ao IPCA. A Tendências trabalha com aumento de 6% do índice para este ano, mas a economista destaca que, apesar da aceleração frente a 2013, haverá uma melhora da dinâmica inflacionária. "A inflação ficou bastante distorcida em 2013. Sem as pressões baixistas da parte de administrados, o IPCA poderia ter ultrapassado 7%", afirmou.

Para Flávio Serrano, do BES Investimento, o governo ainda pode lançar mão de alguma outra medida ao longo do ano, como retirar a cobrança de impostos federais sobre medicamentos, por exemplo, mas mesmo assim há pouca margem de manobra para segurar a inflação. Com preços maiores de administrados já "contratados", diz Serrano, o IPCA ficará mais dependente de um bom comportamento do câmbio e dos alimentos para não ultrapassar 6% em 2014.

A recomposição do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para bens duráveis, por outro lado, não é vista como um grande risco ao indicador oficial de inflação. No caso dos veículos populares, a alíquota aumentou de 2% para 3% em janeiro e, segundo o cronograma do governo, só vai retornar a 7% (percentual original) em julho.

Para Romão, da LCA, a volta do imposto pode não afetar a inflação porque há uma maior concorrência no mercado de automóveis, num cenário de enfraquecimento das vendas. Caso a alta do IPI de veículos fosse repassada integralmente ao consumidor, seu impacto no IPCA seria de 0,07 ponto, calcula ele.



Veículo: Valor Econômico


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