O discurso otimista do BNDES mudou face ao forte impacto da crise global sobre a economia brasileira. O banco reviu para baixo suas projeções de Produto Interno Bruto (PIB) e de investimento fixo para 2009, passando a trabalhar com uma taxa de crescimento para a economia entre 0,5% e 1% e com um avanço de apenas 2,5% a 3% para a formação bruta de capital fixo (FBCF) até dezembro. "Este será um ano horrível, vamos crescer baixinho e o investimento vai despencar. Mas não creio em PIB negativo no fim do ano", disse Ernâni Torres, superintendente da área de pesquisa e acompanhamento econômico do BNDES.
Torres acaba de voltar de viagens ao exterior, onde entrou em contato com bancos e empresas e participou de um encontro no Institute International de Finance (IIF), na Suíça. Lá, deparou com análises e previsões quase que catastróficas sobre a atividade economica mundial, que, segundo os economistas do IIF, continuará mergulhada na escassez de crédito pelo menos nos próximos dois anos. A projeção do IIF para o crescimento do PIB global este ano é de menos 1,1%. Eles trabalham com uma taxa de crescimento de 6,5% para a China e de 0,8% para o Brasil, disse Torres. "Ainda estamos ganhando neste ranking", brinca o economista.
Os números do IIF revelam que a sincronia da crise atual é impressionante. "Não estamos diante da depressão dos anos 30, mas a retração das economias, tanto desenvolvidas, quanto em desenvolvimento, num prazo curto, não tem precedente histórico. A ideia de que a situação já se resolveu, de que o pior já passou não é verdade. O crédito ainda está travado e vai ter impacto muito pesado nos países em desenvolvimento ainda este ano."
Neste cenário, o Brasil tem várias vantagens para passar o vendaval, mesmo com um PIB pequenino este ano e o ritmo de alta do investimento caindo de quase 20% (até setembro de 2008) para 2,5% a 3%. "Os juros estão caindo, o preço do petróleo caiu, as empresas têm caixa e o BNDES dá apoio financeiro." Outro ponto que chama a atenção de Torres é o novo perfil dos investimentos no país, que não são mais apenas de reposição ou modernização. "Temos um volume enorme de investimentos de novas plantas em diversos setores, que vão se manter. Isso nos diferencia do passado."
Uma pesquisa da área que Torres dirige, feita em dezembro, mostra que no período de 2009 a 2012 os investimentos fixos da economia brasileira vão crescer a uma média anual de 9,6%. Esse percentual fica três pontos abaixo dos 12% previstos anteriormente. "A queda é grande, mas a sustentação da trajetória do investimento vai se manter e a queda da taxa em 2009 vai ser compensada até 2012." Ele descarta que o país tenha vivido nos últimos dois anos um "voo de galinha". Para ele, não se pode ficar no passado, do crescimento de 5%. É preciso, afirma, monitorar o presente para não se ter um PIB recessivo este ano e se olhar para o futuro.
Torres atribuiu a queda da indústria em dezembro, apesar de ter sido generalizada, aos automóveis, à siderurgia e aos eletroeletrônicos. "Esses setores responderam por 60% da queda. Não podemos esquecer que o momento é de ajuste de estoques, crise do crédito, que leva à retração da demanda." Fez questão de ressaltar que, apesar do risco do país ter dois PIBs negativos seguidos (o último de 2008 e o primeiro de 2009), os novos licenciamentos de automóveis somaram 220 mil em janeiro, enquanto a produção está em queda.
No estudo do BNDES sobre investimentos está previsto que a terceira onda de investimentos, que era esperada para os próximos quatro anos, foi abortada, pois os setores que a alimentariam seriam justamente os mais prejudicados pela crise: automóveis, siderurgia, mineração e papel e celulose. "O que vai segurar os investimentos listados na primeira e segunda ondas são os projetos de infraestrutura e construção residencial sustentados pelo crédito dos bancos públicos", destaca Torres.
Os projetos de energia elétrica, telecomunicações e petróleo e gás, incluídos os novos investimentos do pré-sal, certamente vão segurar a economia brasileira até 2012, avalia. Ele destaca o papel fundamental do BNDES de garantir crédito para o setor privado tocar seus projetos. "O Estado brasileiro entra nessa crise assegurando crédito para as empresas. É razoável pensar num crescimento positivo para a economia este ano, a despeito da desaceleração de dezembro, não podemos projetar esta descontinuidade como tendência de futuro."
Veículo: Valor Econômico