Queda lenta da inflação preocupa BC

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O Banco Central está acompanhando atentamente a lenta queda da inflação, que dá sinais de ter se descolado da atividade econômica. A produção industrial sofreu uma forte contração em dezembro, de 14,5%, mas a inflação acumulada em 12 meses apresentou uma queda bastante suave, passando de 6,3% para 5,8% entre setembro e janeiro. Outras economias, como os Estados Unidos e o Japão, convivem com o risco de deflação. 

 

O tema foi levantado em palestra recente do diretor de Política Monetária do BC, Mário Torós, em seminário em São Paulo. Ele apresentou uma tabela que mostra como se comportaram a produção industrial e a inflação em 13 países desenvolvidos e emergentes a partir de setembro. A regra geral é a forte contração na produção industrial, mas nem todas as economias tiveram queda proporcional da inflação. 

 

A preocupação é compartilhada por outros membros da diretoria colegiada do BC, que se mostram insatisfeitos com o lento recuo das expectativas inflacionárias. A inflação prevista pelo mercado financeiro para 2009 passou de 5% para 4,66% de janeiro até o dado mais recente da pesquisa de mercado do BC, divulgado na semana passada. Essa redução não guarda proporção com a queda nas projeções para o crescimento da economia, que passaram de 3,6% para 1,5% durante o mesmo período. 

 

Nos Estados Unidos, a produção industrial caiu 10% em dezembro, quando comparado ao mesmo mês do ano anterior. Os preços reagiram rapidamente. A inflação acumulada em 12 meses passou de 4,9% para zero entre setembro e janeiro. Na União Europeia, a produção caiu 12% em dezembro, e a inflação encolheu de 3,6% para 1,1%. No Japão, a atividade industrial recuou 20,6%, e a inflação saiu de 2,1% para zero. 

 

Os países que tiveram queda da inflação não se restringem a economias desenvolvidas. Na China, em que a produção industrial se desacelerou de 11,4% para 5,7% entre setembro e dezembro, a inflação passou de 4,6% para 1% entre setembro e janeiro. No Chile, a produção industrial caiu 3,7% em dezembro, e a inflação recuou de 9,2% para 6,3% entre setembro e janeiro. A África do Sul também teve uma queda importante na inflação. Além do Brasil, o grupo de economias que, a despeito da forte desaceleração econômica, não apresentaram redução expressiva da inflação inclui Rússia, Índia, Colômbia e México. 

 

Na apresentação, Torós mostrou que a principal diferença entre um grupo de países e outro é a flexibilidade de preços. Países com preços mais flexíveis, como Estados Unidos e União Europeia, respondem mais rapidamente à desaceleração econômica. Em países com preços mais rígidos, caso do Brasil, os preços demoram mais para cair. 

 

A apresentação feita por Torós faz parte de um esforço feito pela diretoria colegiada do BC para mostrar que, na crise mundial, as economias não apresentam um padrão único - por isso as respostas de política econômica, sobretudo medidas monetárias, não devem ter necessariamente mesma direção e intensidade. 

 

No início de novembro, em reunião em São Paulo de banqueiros centrais do G-20, banqueiros centrais de todo mundo divulgaram documento defendendo que os países produzissem estímulos fiscais às suas economias. Na ocasião, o presidente do BC, Henrique Meirelles, enfatizou que o documento final também dizia que ficava a cargo de cada país decidir os rumos de sua política monetária com foco na manutenção da estabilidade dos índices de preços. 

 

As estatísticas divulgadas a partir de então, que mostram forte contração na atividade econômica, incluindo queda na produção industrial e aumento da taxa de desemprego, intensificaram a pressão sobre o BC para que a política monetária convirja para os padrões dos países desenvolvidos - isto é, forte cortes dos juros básicos, que cairiam abaixo das taxas naturais, para evitar uma queda mais forte da atividade econômica. O BC, por outro lado, tem insistido que, para os juros convergirem para os padrões observados em outros países, é necessário também que a inflação também convirja para patamares mais baixos. 

 

Os economistas do setor privado esperam expansão de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2009, bem abaixo dos 3,2% previstos pelo BC no relatório de inflação de dezembro. Na teoria, um crescimento tão pequeno do PIB deveria levar a uma inflação mais baixa, a não ser que os analistas econômicos estejam preocupados com outros riscos inflacionários, como a rigidez de preços ou o provável repasse da desvalorização cambial recente para os preços internos. 

 

Na crise atual, países com sistema de preços mais flexíveis tiveram queda mais forte dos preços. É o caso dos Estados Unidos, cujo índice de preços ao consumidor incorporou quase que instantaneamente a queda dos preços de "commodities". "Nos Estados Unidos, a queda da cotação do petróleo bate quase imediatamente nos preços das bombas de gasolina", afirma o economista Elson Teles, da Concórdia Corretora. Os custos de transportes encolheram 12,1% nos Estados Unidos nos 12 meses terminados em janeiro, puxados pela queda do preço do petróleo. 

 

Na China, os alimentos têm um peso muito grande na cesta de consumo. Os preços subiram no início de 2008, com a bolha nos preços das "commodities", e recuaram fortemente no último trimestre do ano, quando a crise se espalhou pelo mundo. 

 

Já no Brasil, avalia o BC, existe uma grande persistência inflacionária. Essa visão é compartilhada por parte dos analistas econômicos. "Convivemos com inflação alta por décadas, por isso a cultura inflacionária e a inércia são maiores por aqui", afirma Teles. Ele cita o exemplo das mensalidades escolares, preço livremente determinado pelo mercado. No início de 2008, os aumentos ficaram entre 4% e 5% e, nesse ano, subiram para a faixa entre 6% e 7%. "Em 2007, a inflação foi mais baixa, por isso as escolas aplicaram reajustes menores nas mensalidades em 2008", afirma Teles. "Em 2008, a inflação foi mais alta, e as escolas estão fazendo um repasse ainda maior para as mensalidades neste ano." 


Há outros preços, afirmou, que dependem mais da inflação passada do que do nível de atividade econômica. "É o caso dos preços administrados e de alguns serviços", disse Teles. O repasse da queda dos preços de combustíveis, por exemplo, não é feito de forma automática, como nos Estados Unidos. 

 

Além da rigidez, existe ainda o risco de repasse da desvalorização cambial para a inflação. Esse é um fantasma que preocupa também outras economias emergentes, como o México, cujo BC reduziu o juro básico há duas semanas em apenas 0,25 ponto percentual, abaixo da queda de 0,5 ponto esperada pelo mercado. O BC do México expressou sua preocupação, em comunicado divulgado ao mercado, de que desequilíbrios nas contas externas levem a novas rodadas de depreciação cambial, que, por sua vez, pressionariam a inflação. 

 

Veículo: Valor Econômico


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