O déficit nominal brasileiro deve ficar abaixo de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, um número baixo quando comparado ao de outros países, tanto emergentes quanto desenvolvidos. Para combater a crise, os governos de todo o mundo adotaram políticas fiscais expansionistas, que elevaram o buraco no resultado das contas públicas incluindo o pagamento de juros.
Nos EUA, o déficit nominal em 2009 atingirá 13,7% do PIB e no Reino Unido, 14,4% do PIB, de acordo com estimativas da Economist Intelligence Unit (EIU). Os outros países do Bric também deverão ter déficits maiores que o Brasil neste ano: a EIU projeta rombo de 8% do PIB para a Rússia, de 7,8% do PIB para a Índia e de 4,1% do PIB para a China. Os analistas ouvidos semanalmente pelo Banco Central apostam que o Brasil terá um déficit de 2,9% do PIB em 2009.
Esse resultado nominal mostra que a capacidade do governo de honrar seus compromissos está garantida, indicando que a política fiscal expansionista não produziu estragos relevantes nas contas públicas. Depois de ficar em 1,98% do PIB em 2008, o déficit subiu para 3,19% do PIB nos 12 meses acumulados até junho deste ano, uma piora moderada, que não assusta os analistas.
"Em termos de solvência, a situação fiscal brasileira está bastante confortável", diz o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges. Para ele, o nível modesto do déficit público foi um dos motivos que permitiram ao Brasil adotar uma política fiscal anticíclica como resposta à crise, cortando impostos e aumentando gastos.
Essa combinação se traduziu, claro, numa menor economia do governo para o pagamento de juros (o superávit primário), que deve fechar 2009 na casa de 2% do PIB, bem abaixo dos 4,1% do PIB do ano passado. No entanto, como as despesas com juros vão cair neste ano, por causa da queda da taxa Selic, a deterioração do resultado nominal das contas públicas não será significativa. Em 2008, o setor público gastou o equivalente a 5,66% do PIB com despesas financeiras, número que pode baixar para 4% do PIB neste ano, estima Borges. Ele acredita que o déficit acumulado em 12 meses poderá recuar ao longo dos próximos meses, fechando o ano em 2% do PIB.
A analista Shelly Shetty, da agência de classificação de risco FitchRatings, diz que o déficit nominal brasileiro é de fato pequeno em comparação com o de grande parte dos países e não há preocupações de curto prazo quanto à sustentabilidade fiscal do país. A questão é que o Brasil ainda tem um nível de endividamento elevado e uma estrutura fiscal rígida, ressalta Shelly, que não vê com bons olhos o forte aumento das despesas correntes em curso.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) estima que a dívida bruta do setor público brasileiro deve ficar em 70,9% do PIB neste ano, bem mais que os 20,9% do PIB estimados para a China e os 35,4% para a Coreia do Sul. Do ponto de vista de uma agência de rating, manter sob controle o nível da dívida e reduzi-lo ao longo do tempo é prioritário. "Os gastos correntes devem ser contidos", insiste Shelly, referindo-se às despesas com pessoal, aposentadorias e custeio da máquina.
O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, vê problemas na qualidade da política fiscal, justamente por ser marcada por gastos correntes elevados e um volume fraco de investimentos. Ele destaca, contudo, o efeito importante que a política fiscal teve sobre a atividade econômica neste ano. A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos e linha branca causou alguma perda de receita, mas estimulou setores de peso da economia. Como o país tinha uma situação fiscal sólida do ponto de vista da solvência, a queda na arrecadação causada por essas medidas não causou problemas significativos para as contas públicas. Um déficit fiscal inferior a 3% do PIB é absolutamente confortável, ainda mais num momento em que a maior parte dos países têm resultados bem piores, diz Gonçalves. Um estudo do FMI mostra que o pacote de estímulo fiscal do Brasil representou apenas 0,7% do PIB, bem menos que os 5,2% do PIB da China, os 5,6% do PIB dos EUA e os 12,2% do PIB da Rússia.
Borges também faz críticas ao mix de política fiscal do país, lamentando que os investimentos em infraestrutura ainda sejam pouco significativos. Ele lembra também o que o nível elevado de gastos obriga o país a manter a carga tributária nas alturas, outro obstáculo a um crescimento sustentado a taxas mais robustas.
Para 2010, a expectativa dos analistas é de queda do déficit nominal. O superávit primário deve aumentar, especialmente por conta da alta da receita, diz Borges, que acredita numa arrecadação maior pelo impacto do crescimento mais expressivo da economia e pelo fim das isenções tributárias concedidas neste ano. Nesse cenário, os analistas ouvidos semanalmente pelo BC projetam um déficit de 1,4% do PIB em 2010.
Veículo: Valor Econômico