Ricardo Roldão criou uma rede varejista apostando na força de consumo da periferia paulistana. Acuado pelos grandes do setor, seu desafio agora é conter o avanço da concorrência em seu quintal
Durante muitos anos, o empresário Ricardo Maciel Roldão, 40 anos, teve de explicar aos interlocutores que sua empresa, o Atacadista Roldão, não comercializava pneus ou qualquer outro item ligado ao setor automotivo. A confusão era, de certa forma, compreensível. Seu pai, João Roldão, começou a vida de comerciante vendendo linguiça, a bordo de um Fusca 1966, pelas ruas de São Paulo.
Além disso, as lojas da rede, abertas a partir de 2000, ficavam “escondidas” em bairros da periferia. Elas eram conhecidas apenas por donos de armazéns, botecos, pequenas pizzarias e vendedores de cachorro-quente. Pequenos empresários que fazem suas compras de alimentos e produtos de limpeza em pequenas quantidades e, por isso, não têm acesso às grandes indústrias. Isso garantiu ao Roldão uma espécie de zona de conforto.
Ritmo de expansão: Roldão, dono, pretende investir R$ 30 milhões na abertura de cinco novas lojas em São Paulo
A situação, contudo, começou a mudar há dois anos, quando o Carrefour pagou R$ 2,2 bilhões pelo Atacadão e o Pão de Açúcar desembolsou R$ 382 milhões pelo Assai. De repente, os consumidores das classes C e D passaram a ocupar um lugar de destaque nos planos dos grandes varejistas. Diante disso, só restaram duas opções ao empresário: lutar contra as investidas dos grandes varejistas ou sair de cena vendendo a sua companhia.
Até agora, Roldão vem apostando na primeira alternativa. Desde 2007, o número de lojas saltou de cinco para 12 e a meta é fechar 2010 com 17 unidades, um investimento de R$ 30 milhões. Com isso, ele estima que as receitas de R$ 900 milhões saltem para R$ 1,14 bilhão. “Vamos nos manter fiéis ao nosso modelo, focando em bairros populosos e cidades do interior onde existe uma grande concentração de pequenos negócios”, explica o empresário.
Especialização: a empresa varejista cresceu apostando na força de pequenos comércios e lanchonetes da periferia paulistana
Essa estratégia, segundo analistas, pode não ser suficiente para garantir o futuro da rede. “A excessiva concentração do segmento, especialmente na Grande São Paulo, vem reduzindo o espaço de manobra das empresas menores”, argumenta Cláudio Tomanini, professor de marketing e vendas da Fundação Getulio Vargas. E Roldão já sente isso na pele.
A primeira loja da rede, no bairro da Freguesia do Ó, ganhou recentemente a companhia do Giga Atacado, controlado pelo grupo Mambo. E o Assai instalou uma filial a 300 metros da unidade que o Roldão abriu, em 2009, na cidade de Praia Grande (SP). Além de ampliar a área de vendas, a prioridade é melhorar a rentabilidade da operação.
Hoje, Roldão trabalha com uma margem de ganho líquida de 1,8%. Abaixo da média do mercado: 2%. Para mudar isso ele pretende reforçar a infraestrutura. A começar pela logística. Hoje, cada loja possui seu próprio estoque, composto de oito mil itens. “Apenas com a eficiência na distribuição deveremos ter um ganho extra de 1,5% ao ano”, argumenta Roldão. Já está em fase de planejamento a construção de um centro de distribuição, previsto para ser inaugurado em 2011. Até lá, ele espera obter ganhos com ações pontuais.
A lista inclui a ampliação do número de produtos de marca própria, Roldão e Vale+, no faturamento. Hoje, são 170 itens, como farinha de trigo, café e mortadela. De acordo com especialistas, esses itens podem gerar até meio ponto percentual de ganho em relação aos demais. Outra saída é vender para um banco o seu cartão private label, o Roldão+, que conta com 25 mil usuários e responde por 3% das receitas.
O empresário também quer transformar as gôndolas em um espaço de geração de receita. Ao contrário dos demais supermercados, o Roldão não negocia com os fornecedores os locais mais favoráveis de sua área de vendas. Para o consultor Cláudio Felisoni de Angelo, coordenador-geral do programa de varejo da Universidade de São Paulo, o Roldão demorou a agir e pode pagar caro por isso. “O ambiente ainda é favorável para quem atua com as classes C e D. Contudo, se a situação mudar, ele corre o risco de ficar sem espaço.”
Veículo: Revista Isto É Dinheiro