"O que leva uma empresa a praticar sustentabilidade?" Diante dessa questão primordial, três professores do Insper elaboraram estudo obtido com exclusividade pelo Valor em que avaliam o atual estágio do setor de varejo na implementação de projetos considerados sustentáveis, ou seja, que considerem a combinação das dimensões econômicas, sociais e ambientais na sua concepção. O resultado mostra um cenário que apresenta evolução lenta, mas de forma contínua. E o avanço está ocorrendo primeiro na relação do varejo com o consumidor, que tem sido o principal elemento motivador para os investimentos em sustentabilidade.
O estudo, elaborado pelos professores Silvio Laban, Priscila Claro e Danny Claro, resultou de pesquisa feita junto a 101 supermercados no Estado de São Paulo em maio de 2009, com apoio da Associação Paulista de Supermercados (Apas). "Há muitos estudos tratando de iniciativas e dando exemplos de ações sustentáveis, mas nenhum deles com um sentido causal ou que se preocupe com os elementos motivadores dessas ações de sustentabilidade", explica Laban.
O varejo foi escolhido pelos professores por se tratar de setor com grande capilaridade - de fornecedores e consumidores -, e com papel importante tanto na disseminação como no desenvolvimento de iniciativas que incorporem o conceito de ação sustentável. "O impacto econômico e a proximidade com o consumidor final faz com que os varejistas tenham um papel-chave nas iniciativas de sustentabilidade, o que pode torná-los mais produtivos e ainda melhorar a imagem junto aos consumidores e à sociedade em geral", discorre o estudo.
A pesquisa contemplou elementos que hipoteticamente poderiam ser motivadores de investimentos em sustentabilidade: os processos internos da empresa e as pessoas que ali trabalham, a relação com os consumidores, fornecedores e fatores externos. "A principal conclusão é que o varejo com forte foco no consumidor, que sabe ouvir o consumidor, que demonstra preocupação com qualidade de vida e com a qualidade dos produtos tende a se preocupar mais com investimentos em sustentabilidade", diz Priscila Claro.
Já os demais vetores fizeram com que as hipóteses iniciais caíssem por terra. "A ideia de que as políticas e processos de relacionamento com fornecedor poderiam ser fator de influência nos investimentos em sustentabilidade não se confirmou, assim como não encontramos relação entre a decisão desses investimentos e os processos internos e as pessoas que atuam na empresa."
As empresas brasileiras estão atualmente em diferentes estágios de investimentos em sustentabilidade e as de maior porte mostram mais ímpeto no segmento do que as pequenas e médias. "O pequeno e o médio empresário ainda estão em estágio de namoro com o tema e procurando entender que esse é um foco que pode ser bom, mas as ações estão chegando e o pequeno tem a vantagem de tomada de decisões mais rápidas do que na grande empresa", pondera Laban.
As empresas que se mostram mais adiantadas no processo são aquelas que implantaram uma área de sustentabilidade junto ao RH ou à presidência "porque isso eleva a importância dos projetos".
Medidas são indiretas e graduais nas pequenas
Grandes empresas são mais visadas e cobradas e, portanto, estão mais avançadas no estágio da sustentabilidade. Porém, os pequenos e médios vão necessariamente participar dos projetos, mesmo que de forma mais paulatina. Um bom exemplo é a iniciativa da Associação Brasileira de Supermercados (Abras) que lançou no ano passado o Programa de Certificação de Produção Responsável na Cadeia Bovina para garantir a procedência da carne vendida nos supermercados brasileiros e evitar a comercialização de carne proveniente de áreas desmatadas ou de fazendas que não atendam a legislação ambiental. A iniciativa ainda está em fase de projeto piloto mas a adesão é extensiva a todos os players, independente de porte.
O efeito cascata também pode ser fator de inclusão de pequenas e médias empresas nos investimentos em sustentabilidade. "Se o varejo tratar de procedimentos com os grandes fornecedores, automaticamente os pequenos fornecedores ao redor dos grandes serão afetados porque terão o mesmo grau de exigência", pondera Priscila.
E o consumidor já tem condição de trocar a fidelidade da marca por um conceito de sustentabilidade? "Não, ainda se pensa em sustentabilidade como um fator econômico ou ambiental. E são as marcas que vão se inserir no conceito de sustentabilidade para atrair o consumidor e não o contrário", acredita Laban: "Essas gerações já estão crescendo com preocupação em torno de questões como a emissão de CO e aquecimento global. E esse é um entendimento que certamente vai alterar o comportamento do futuro consumidor." (E.R.)
Veículo: Valor Econômico