Propaganda de alimentos com alto teor de sal, açúcar e gordura terá alerta

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Novas regras da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) são consideradas um avanço para a saúde pública, mas vêm em versão bem mais branda que a proposta inicial. Distribuição de brindes é permitida, mas também deverá ter advertência

 

Uma nova estratégia para tentar melhorar a alimentação do brasileiro e enfrentar o aumento da obesidade no País entra em vigor dentro de seis meses. Propagandas de alimentos com alto teor de gordura ? saturada ou trans ?, com grande quantidade de sal ou de açúcar e bebidas com baixo poder nutritivo passarão a ser veiculadas com frases de advertência sobre os males à saúde que podem provocar quando consumidos em excesso.

 

Publicada ontem pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a resolução é considerada um avanço para a saúde pública, mas vem em uma versão bem mais branda que a proposta inicial, apresentada há três anos e meio. "Ajustes precisaram ser feitos", afirmou a gerente-geral de monitoramento e fiscalização da Anvisa, Maria José Delgado Fagundes. No texto original, propaganda desses alimentos, além de ser feita com advertências, somente poderia ser veiculada das 20 horas às 6 horas.

 

Ficavam proibidos o uso de figuras, desenhos e personagens admirados pelas crianças nos comerciais, além da distribuição de brindes e promoções.

 

No texto final, desenhos e distribuições de brindes são permitidos, mas terão de vir acompanhados das advertências. "Mesmo com ajustes, a legislação brasileira é pioneira e atende recomendações recentes feitas pela Organização Mundial da Saúde", diz Maria José.

 

A maior preocupação é preservar as crianças do grande apelo para o consumo de alimentos industrializados, com baixo teor nutritivo e com alta dosagem de substâncias que, quando consumidas em excesso, são prejudiciais à saúde.

 

Propagandas de produtos com muito açúcar virão acompanhadas do alerta de que, quando consumidos em excesso, podem provocar risco de obesidade e cárie dentária. Os que contiverem grande quantidade de gordura saturada virão acompanhados da frase: "Contém muita gordura saturada e, se consumida em grande quantidade, aumenta o risco de diabetes e de doença do coração." Aqueles que apresentarem mais de um nutriente em excesso terão a advertência de que o produto aumenta o risco de obesidade e doenças do coração.

 

Quando a propaganda for veiculada na TV, o alerta será feito pelo personagem principal. A resolução proíbe que sejam usados desenhos ou indicações que levem o consumidor ao erro ou a acreditar que o produto tem características nutritivas superiores às que de fato apresenta.

 

A medida não afeta as embalagens. De acordo com a Anvisa, rótulos têm de ser harmonizados nos países integrantes do Mercosul. Mudanças não podem ser feitas unilateralmente.

 

Desde que foram apresentadas, as propostas para regras de propaganda de alimentos com alto teor de gordura, sódio e açúcar vieram acompanhadas de polêmica. Para tentar evitar conflitos e ações judiciais, o texto da resolução publicada ontem foi acompanhado por um grupo de trabalho e pela Advocacia Geral da União. Maria José afirma que havia ainda alguns pontos polêmicos. A solução foi fazer uma versão mais enxuta, mas que fosse mais rapidamente publicada.

 

Norma é inócua e unilateral, diz indústria

 

Para associação das empresas de alimentação, resolução tem 'impropriedades constitucionais'

 

A Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia) classificou a resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que impõe normas para a publicidade de alimentos de um "ato inócuo e unilateral".

 

Por meio de nota, a Abia diz que a norma tem impropriedades constitucionais, já que produtos alimentícios não podem ser "objeto de alertas de malefícios" e pelo fato de que o controle da publicidade deve se dar por meio de leis federais.

 

Em relação às questões técnicas, a Abia afirma que a agência não educa o consumidor e ignora o fato de o consumo excessivo de nutrientes ser "reflexo de hábitos alimentares da população" ? e não da composição dos produtos industrializados.

 

A assessoria de imprensa do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) afirmou que não conseguiu contato com o presidente para um posicionamento.

 

A Associação Brasileira de Anunciantes (ABA) disse que está avaliando o assunto. E a Associação Brasileira das Agências de Publicidade (Abap) afirmou que deve se manifestar sobre o tema nos próximos dias.

 

Informações claras. Para Carlos Monteiro, professor do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP e consultor da Organização Mundial de Saúde (OMS), os consumidores precisam de informações claras, pois os hábitos mudaram nas últimas décadas. "Há alimentos, como o macarrão instantâneo, que em uma só porção têm 50% da recomendação do consumo diário de sódio. Existem, sim, alimentos nocivos à saúde", alerta o professor.

 

A resolução da Anvisa também recebeu elogios e críticas de órgãos de defesa dos direitos do consumidor e especialistas em propaganda e nutrição. "As pessoas se preocupam com calorias e esquecem dos elementos prejudiciais que existem", afirma a nutricionista da Unifesp Camila de Abreu. "Podemos comemorar a resolução, mas a publicidade infantil também deveria ser regulada."

 

Para Isabella Henriques, coordenadora-geral do Projeto Criança e Consumo do Instituto Alana, a Anvisa perdeu a oportunidade de proteger as crianças do marketing destinado a elas.

 

"Se uma criança pequena não entende nem uma propaganda direito, como vai interpretar corretamente os alertas contidos nela?", questiona.

 

Segundo ela, o texto da Anvisa não contempla os artigos aprovados em audiência pública realizada em agosto de 2009, relativos à presença de brindes em alimentos. Isabella diz ainda que a agência ignora as recomendações da OMS, que, em conferência em maio, aprovou recomendação para os governos reduzirem o marketing de produtos alimentícios voltados a crianças.

 

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) concorda. "É um problema de saúde pública. Faltou uma posição progressista do País", afirma a coordenadora executiva, Lisa Gunn.

 

Consumidores aprovam resolução da Anvisa

 

Maioria apoia advertência em propaganda e reclama da falta de informação nas embalagens sobre os males causados por alimentos industrializados

 

Nos corredores do supermercado, a nova resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária foi bem recebida pelos clientes entrevistados ontem. O advogado André Luis Bertolino, que estava na seção das bolachas recheadas, conta que tem o hábito de verificar a composição dos alimentos no rótulo, mas considera importante que a propaganda deixe isso explícito. "Assim vai chamar mais a atenção das pessoas", diz.

 

Opinião semelhante tem o corretor de imóveis Damianos Tsichlias Junior, que diz perceber que muita gente não tem informações suficientes para fazer a escolha certa dos produtos. "Hoje sabemos que a alimentação é muito importante. Nossos pais e avós comiam muito mal, por isso viviam menos", diz Junior, formado em Educação Física e especializado em nutrição. Em seu carrinho só entram produtos integrais e light. Ele afirma que, prestando atenção na composição dos alimentos, dá para achar produtos saudáveis e com sabor semelhante.

 

Já a vendedora Ana Cristina Mariano da Silva raramente lê os rótulos. "Quem consegue ler essas letrinhas?", questiona, enquanto escolhe uma sopa em pó. "Seria bom que a propaganda já falasse se é saudável ou não." A sopa é um alimento afetado pela resolução por causa do alto teor de sódio.

 


Veículo: O Estado de S.Paulo


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