A pressão intensa a que se submeteu nas últimas semanas o mercado financeiro mundial, e o ponto de interrogação que se abriu sobre as metas de crescimento das empresas para 2009, não deixou espaço para as agências de propaganda usarem a crise como mote criativo. Ou quase. A GP7 Comunicação, agência interna da CVC Turismo, vem publicando o anúncio: "O Caribe é aqui. Não esquente a cabeça com o dólar. Tire férias em Real". Aproveitando a oportunidade, a Central de Concursos também disparou na mídia impressa: "Crise à vista? Proteja-se na estabilidade da carreira pública".
Bem mais austero, o anúncio de uma página da F/Nazca Saatchi & Saatchi, publicado ontem em alguns grandes jornais, procurou incentivar os anunciantes a manter os investimentos em comunicação e não se intimidarem pela turbulência global. A maioria absoluta das agências brasileiras está mais interessada em convencer os clientes a não enxugar o orçamento de 2009 do que em criar peças de oportunidade. Os anunciantes estão em compasso de espera e muitos ainda não fecharam o plano de investimentos para o ano que vem. E mesmo as agências que já receberam o "budget" dos clientes sabem que tudo pode mudar em alguns meses, ao sabor da economia.
"Nenhum plano de mídia foi alterado até o começo de 2009, mas sabemos que os orçamentos do ano que vem podem ser revistos, principalmente nos setores que são mais sensíveis à oferta de crédito", diz Renato Loes, presidente da Leo Burnett no Brasil e na América Latina. Fiat, Procter & Gamble e Brasil Telecom estão entre os grandes clientes da Leo, que pertence ao grupo francês Publicis, o quarto do mundo em comunicação.
As multinacionais do setor, por sinal, continuam apostando que os mercados emergentes vão resgatá-las de possíveis perdas nos Estados Unidos e na Europa. Fernando Rodés Vilà, presidente mundial do francês Havas, que ocupa a sexta posição no ranking mundial de comunicação, afirma que o grupo vai tentar manter no segundo semestre o ritmo de crescimento do primeiro - 8% -, mas que a receita do Brasil deve dar um salto de 30% em 2008. "Vamos investir até R$ 5 milhões nos próximos meses em tecnologia e talentos", diz o CEO, que este ano comprou a agência Z+. O Brasil é 20% da receita do Havas na América Latina, que por sua vez significou 4,5% dos ganhos globais de US$ 2,1 bilhão em 2007.
Dono daEuro RSCG, o Havas acredita que a Media Contacts, empresa de mídia interativa do grupo presente em 33 países, tem muitas chances no atual cenário. "É bem mais fácil você medir o retorno real de uma ação publicitária na internet do que em qualquer outro meio", diz Rodés Vilà. Segundo ele, o Brasil foi o mercado onde a Media Contacts mais cresceu no ano passado: 70%. "Se as empresas já estavam preocupadas em medir o impacto dos investimentos em marketing, agora vão querer que cada centavo em comunicação se justifique", diz. Isso significa fazer com que as ações tenham muito mais foco, não só no público para o qual são destinadas como nos veículos em que são realizadas, diz Rodés Vilà.
Márcio Santoro, vice-presidente da agência Africa, uma das dez maiores do país, acredita que quem precisa investir em TV aberta - responsável por 60% das verbas publicitárias no Brasil, não vai partir para a web. "O que a crise pode fazer é diminuir o número de ações de lançamento de determinada marca, de quatro para três no ano, por exemplo", afirma Santoro. Entre os grandes clientes, estão Brahma (AmBev), Itaú e Vivo.
Fábio Fernandes, sócio da F/Nazca, diz que o planejamento de mídia no Brasil já está em nível de excelência. Quanto à crise, ele nem pensa em brincar. "Não há espaço para isso."
Já a CVC, uma forte anunciante em jornais, afirma que deverá fazer mudanças nos conteúdos das peças publicitárias conforme o desenrolar da crise e de suas conseqüências na economia. "O que muda é a mensagem, conforme os acontecimentos", diz o diretor de marketing, João Fernando Vassão, que promete: não estão previstos cortes para 2009.
Veículo: Valor Econômico