Setor de calçados bate recorde de produção

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Nos piores anos de crise econômica, em 2001 e 2002, a Argentina fabricava 34 milhões de pares de calçados e 40% do consumo era atendido por importados. Hoje, a produção praticamente triplicou e a fatia dos calçados brasileiros e asiáticos caiu para menos de 25% das vendas totais, levando os empresários nacionais a comemorar um recorde histórico em 2010. "Estamos festejando a barreira dos 100 milhões de pares fabricados", disse ao Valor o presidente da Câmara da Indústria do Calçado (CIC), Alberto Sellaro.

 

A produção brasileira está acima de 800 milhões de pares ao ano, mas Sellaro afirma que as duas realidades não são comparáveis, por causa das dimensões das respectivas economias e porque o volume do Brasil é inflado com a fabricação de sandálias.

 

O dirigente empresarial avalia que a megadesvalorização do peso, no fim de 2001, detonou um processo de substituição de importações. A partir de 2004, o uso crescente de medidas protecionistas fez a indústria local aumentar seus investimentos para atender a forte expansão do mercado interno. No ano passado, os investimentos alcançaram US$ 160 milhões. Sellaro demonstra tanto entusiasmo com a proteção oferecida pelo governo que pede a reeleição da presidente Cristina Kirchner e já declara voto nela. "Teríamos, por mais quatro anos, uma previsibilidade muito importante."

 

Para o economista Dante Sica, ex-secretário de Indústria e diretor da consultoria Abeceb, a proliferação de travas às importações fez com que muitas empresas, especialmente nos setores de têxteis e de calçados, transferissem sua produção para a Argentina. Além de competir diretamente no mercado local, algumas empresas paradoxalmente passaram a exportar ao Brasil a partir de suas bases no país vizinho, beneficiando-se do câmbio desvalorizado. Sica lembra, por exemplo, que 80% do denim - matéria-prima para a confecção de calças jeans - da Argentina é fabricado por brasileiras.

 

No caso dos calçados, a ameaça oficial de aumentar o protecionismo levou a indústria brasileira a firmar um acordo "voluntário" de restrição às exportações. Até maio de 2011, ele limita a venda de calçados ao país vizinho a uma cota anual de 15 milhões de pares. Em 2009, no entanto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve que entrar pessoalmente nas gestões para acelerar a liberação das licenças não automáticas de importações. Em vez de serem liberadas em até 60 dias, conforme determina a Organização Mundial do Comércio (OMC), a Argentina passou a usar o mecanismo para travar as importações de calçados, cujo trâmite chegou a durar até 240 dias, no pior momento.

 

A lista de medidas protecionistas incluiu ainda valores-critério, com a criação de preços de referência para impedir a importação de produtos subfaturados, e sobretaxas contra calçados asiáticos acusados de praticar dumping - o Brasil também adotou medida antidumping contra a China, mas ela foi oficializada depois da Argentina.

 

De acordo com a Abeceb, as medidas protecionistas argentinas chegaram a afetar 17,3% do total de importações brasileiras, no início do ano. Isso reforçou a tendência de diversas brasileiras, além da Vulcabras, de fabricar diretamente no vizinho.

 

A Alpargatas Argentina, controlada desde 2007 pela Camargo Corrêa, é uma das principais empresas e vende quase 8 milhões de pares ao ano. A Penalty produz em parceria com uma indústria local e a Paquetá fabrica tênis esportivos da marca Adidas. O Grupo Dass (fusão da Dilly com a Clássico) opera há três anos uma planta com quase 700 empregados na Província de Misiones (nordeste do país). Recentemente, celebrou um acordo com a Fila e a Umbro, além de manter marcas próprias e fazer calçados para a Nike, a Adidas e a Converse. A produção é de 1,7 milhão de pares por ano.

 

"Quando há previsibilidade, os empresários investem", acredita Sellaro, o dirigente da câmara de calçados. Ele se referia não à estabilidade econômica e à segurança jurídica, sempre contestadas na Argentina, mas à disposição do governo de proteger a indústria nacional contra os concorrentes estrangeiros.

 

Sellaro reconhece que, mesmo com os investimentos recentes e a modernização da indústria, o setor não tem como competir sem barreiras contra as importações. "Não adianta. Um empregado recém-contratado ganha um piso de US$ 500. Enquanto os chineses pagarem US$ 17 por mês, não há como tirar as medidas protecionistas."

 

Mas o economista Marcelo Elizondo, diretor da consultoria DNI e ex-presidente da Fundação Exportar, diz que esse tipo de medida também pode causar efeitos perversos ao comércio exterior. A China suspendeu por seis meses, de abril a outubro, suas importações de óleo de soja da Argentina. Alegou o descumprimento de normas técnicas, mas a leitura geral é de que se tratava de retaliação pela quantidade de medidas antidumping e licenças não automáticas contra seus produtos industriais. (DR)

 

Veículo: Valor Econômico


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