Como a variedade excessiva confunde os consumidores, fabricantes resolvem enxugar
Deveria ser tão fácil: comprar pasta de dente. Mas poucas visitas ao supermercado causam tanta confusão.
Há uma explosão no número de pastas e géis que anunciam seus poderes de branquear os dentes, reduzir a placa bacteriana, coibir a sensibilidade e combater a gengivite, às vezes tudo ao mesmo tempo. Acrescente todos os sabores e tamanhos, bem como os preços sempre crescentes, e uma tarefa simples termina sobrecarregando os sentidos.
Os fabricantes admitem o problema e estão pisando nos freios, deixando de lançar novos produtos. No ano passado, chegaram às prateleiras dos Estados Unidos 69 novos cremes dentais, ante 102 em 2007, segundo a firma de pesquisa de mercado Mintel International Group.
A Procter & Gamble Co., que fabrica a marca Crest, afirma que reduziu "significamente" nos últimos dois anos o número de produtos para os dentes que fabrica mundialmente. "Percebemos que é melhor ter menos", diz Matt Doyle, diretor de pesquisa e desenvolvimento mundial de saúde oral da P&G, que às vezes escova os dentes 20 vezes por dia para realizar testes.
As lojas também estão tentando simplificar as coisas. Foram vendidos 352 tipos diferentes de pasta de dente no varejo americano no mês passado, ante 412 em março de 2008, segundo a Spire LLC, que acompanha dados do setor provenientes de mais de 30 milhões de famílias americanas.
A Supervalu Inc., uma rede de supermercados americana, criou um limite para a variedade de pacotes e sabores que vende em suas lojas. "O palato pode não conseguir discernir aquela sexta variedade do sabor menta", diz John Mullany, diretor de artigos de higiene pessoal da Supervalu.
"Há tanta variedade hoje em dia que escolher o que comprar ficou um pouco difícil", diz Toby Truitt, diretor de lojas da Major Market, uma rede de supermercados da Califórnia. Ele recomenda aos gerentes que deem o mesmo conselho a todos os clientes. "Dizemos a eles para perguntar ao dentista", diz ele.
A Crest chegou ao mercado em 1955 e em 1960 se tornou a primeira pasta de dente com flúor a receber o "selo de recomendação" da Associação Americana de Odontologia. A pasta de dente passou assim de um produto cosmético para terapêutico, e as vendas de Crest quase triplicaram nos dois anos seguintes. A década de 80 assistiu à ascensão das fórmulas de controle de tártaro, aumentando ainda mais as expectativas das pessoas sobre a função da pasta. Desde então, as empresas lançaram cada vez mais benefícios e ingredientes, sempre na busca da próxima atualização que impulsionaria as vendas.
Cada novo benefício é uma chance para os fabricantes aumentarem os preços e impulsionar as vendas. Como 93% dos adultos americanos usam pasta de dente, segundo a Mintel, há pouco espaço para conquistar novos clientes.
Mesmo durante a recessão, quando as vendas caíram, os preços continuaram subindo. O preço médio da pasta de dente nos EUA chegou a US$ 2,83 no ano passado, uma alta de 8% nos últimos quatro anos, segundo a SymphonyIRI Group, uma firma de pesquisa de mercado que não leva em conta os dados do Wal-Mart Stores e das redes de clubes de compras. A pasta de dente é atualmente um dos produtos do supermercado que inspira mais lealdade à marca.
A embalagem tem seu papel na confusão instaurada nas prateleiras. "A caixa da pasta tem um determinado tipo e tamanho e fica na prateleira de um certo jeito. Isso dificulta comunicar efetivamente quando há uma diferença significativa num novo produto", diz Jonathan Asher, vice-presidente sênior da Perception Research Services, especializada em marketing de embalagens e em comportamento de consumo.
A Colgate-Palmolive Co. lançou este ano pacotes criados especialmente para serem fáceis de decifrar. Ela padronizou o tamanho do logotipo Colgate e o da "submarca", bem como o sabor e o benefício da variedade, para que as pessoas notem as características nessa ordem. Ela fez o que chama de "testes de prateleira", cronometrando quanto tempo leva para as pessoas encontrarem o novo pacote da versão "Colgate Total Advanced Whitening" e outras variações, em vez de outras embalagens. "A nova embalagem não apenas foi a preferida como foi a mais fácil de achar", diz Nigel Burton, presidente mundial de propaganda e pesquisa de mercado de saúde bucal da Colgate.
Apesar do excesso de marcas, a pasta de dente ainda é uma queridinha do varejo, oferecendo algo para cada consumidor. As lojas a consideram uma geradora de tráfego. A variedade de preços da pasta e dos produtos relacionados, como os branqueadores, é uma das mais amplas entre os produtos de consumo final, diz Dina Howell, diretora-presidente da Saatchi & Saatchi X, a divisão de marketing varejista da Publicis Groupe. "Dá para comprar uma pasta de US$ 1 e um adesivo de branqueamento dental de US$ 50", diz ela.
Duas marcas, a Crest e a Colgate, respondem juntas por cerca de 70% das vendas de pasta de dente nos EUA. A lealdade à marca é tão grande que os varejistas nem cogitam descartar as marcas menores. "Se [as pessoas] não conseguem encontrar sua marca numa loja, vão procurá-la em outras", diz Pat Conroy, que comanda o setor de produtos de consumo final da Deloitte LLP. "E, quando mudam de loja, podem acabar comprando lá as outras coisas de que precisam."
"Como essas novas pastas dentais alegam fazer de tudo, por que precisam de tantas?", pergunta Bill Chabot, de 66 anos, de Ontonagon, no Estado de Michigan.
Muitos dentistas acham que as diferenças entre marcas não significam muita coisa. "Só verifique se ela tem flúor e o selo da Associação Americana de Odontologia", diz Ada Cooper, uma dentista nova-iorquina e consultora de consumo da associação, que testa as alegações das pastas. O selo da associação "informa que o produto foi testado, tem o efeito que alega e fornece a mistura certa de ingredientes".
"A marca em si não significa nada", diz ela. Pergunte a um dentista se você precisa de uma pasta especializada. Se não, "só escolha uma pasta de que você gosta, que assim você vai usar com mais regularidade".
Veículo: Valor Econômico