Preços do café desafiam as turbulências

Leia em 5min

Embora tenham perdido parte da sustentação nessas últimas semanas de turbulências financeiras derivadas da crise na Grécia, os preços internacionais do café devem se manter bem acima das médias históricas por um tempo ainda longo. Se o otimismo com a colheita da safra no Brasil ainda desafia as geadas que ameaçam alguns polos, e os problemas na Europa e o verão no Hemisfério Norte arrefeceram a alta nas bolsas, o balanço entre oferta e demanda segue apertado. Esse cenário deixa o mercado sensível a quaisquer problemas com a produção.

 

Em Nova York, o preço do café arábica dobrou desde setembro e atingiu, no início de maio, o nível mais alto em 34 anos. Desde então, a queda supera 15%, mesmo contabilizando a disparada de ontem, reflexo da forte queda de temperaturas no Brasil no início da semana. Algumas razões ajudam a explicar a baixa. No lado da oferta, a colheita da safra 2011/12 no Brasil começou, e enquanto não ficar claro o alcance das adversidades climáticas prevalecerá o fato de que os canais de comercialização serão irrigados. A Conab prevê uma colheita de 43,5 milhões de sacas, 9,5% menos que no ciclo passado, mas isso em virtude da bienalidade da produção. E analistas avaliam, também, que a oferta será de boa qualidade.

 

Na ponta da demanda, o início do verão no Hemisfério Norte tende a esfriar o consumo dos países desenvolvidos nos próximos meses, aliviando a pressão sobre os estoques. Além disso, o agravamento da crise no velho continente fez crescer a aversão dos especuladores a ativos de risco, como é o caso do café e de outras commodities. Resultado: desde o início de maio, os fundos reduziram à metade sua aposta na alta dos preços do café em Nova York, segundo a Comissão de Comércio de Futuros de Commodities dos EUA.

 

Analistas ponderam, porém, que os fundamentos do mercado são robustos e limitam o espaço para perdas. Na melhor das hipóteses, observa Eduardo Carvalhaes, do Escritório Carvalhaes, o Brasil colherá menos do que 47 milhões de sacas, para uma demanda que, em 2010/11, foi de 53 milhões. Para ele, os preços mais altos refletem mudanças estruturais. "Estamos em uma nova era, com moeda estabilizada, estoques escassos e aumento no consumo".

 

Segundo a Organização Internacional do Café (OIC), o volume de café armazenado nos países produtores caiu de 55 milhões de sacas, no início dos anos 2000, para menos de 13 milhões no ano passado. Só no Brasil, maior produtor mundial, os estoques de início de safra caíram para 5,5 milhões de sacas, de mais de 43 milhões.

 

Durante muitos anos, explica Carvalhaes, os preços ficaram abaixo do custo de produção. Além disso, países da América Central e a Colômbia, grande fornecedor de café de boa qualidade, enfrentaram problemas de safra e viram suas colheitas minguarem nos últimos anos. Com o enxugamento dos estoques, o mercado teve de se ajustar. "A demanda mundial cresce cerca de 1,5% ao ano, o que significa um incremento anual de 2 milhões de sacas. Se a crise nos países desenvolvidos não derrubar o consumo, o mundo precisará de, no mínimo, mais 20 milhões de sacas até o fim da década", diz Carvalhaes. É o que colhe o Vietnã, segundo maior produtor mundial.

 

O Brasil é o grande responsável por esse crescimento. Ancorado no aumento da renda e na disseminação das bebidas de qualidade superior, a demanda interna praticamente dobrou na última década e deve superar 20 milhões de sacas este ano. Em até três anos, projeta Carvalhaes, o Brasil deverá tirar dos EUA o posto de maior consumidor mundial. Superintendente de operações e mercado da Cooxupé, maior cooperativa de cafeicultores do mundo, Lúcio Araújo Dias minimiza o sobe-e-desce dos preços e mira os fundamentos. "A oferta é justa e a demanda é forte. Esses dias fui informado que estávamos carregando os últimos lotes da safra passada. Sempre brincamos que café no armazém dá cria, mas desta vez ele acabou".

 

Dias afirma que a dinamização do mercado é sua principal fonte de otimismo. "Estamos fazendo muitos negócios, abrindo novos espaços. Recebemos missões estrangeiras numa frequência nunca vista antes". Segundo ele, os produtores associados à Cooxupé já negociaram 35% da nova safra. "Geralmente, nos anos bons, não se negocia mais do que 20% até esta época do ano", diz.

 

Depois de atingir R$ 555 por saca no começo de maio, o preço pago ao produtor caiu para R$ 503 no início da semana, de acordo com o indicador Cepea/Esalq. Mesmo assim, o valor é 60% maior que o pago um ano antes. Para as torrefadoras, é um problema a ser resolvido. Acuada pela força do varejo, a indústria tem dificuldades para repassar o aumento de custos e amarga prejuízos. Segundo o novo presidente da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), Américo Sato, as empresas incorporaram menos de 10% da valorização do café verde no produto final. "A indústria precisa elevar em até 30% os preços no varejo para se reequilibrar" e continuar investindo em qualidade

 

Rodrigo Costa, analista da corretora Newedge USA, afirma que os preços do café devem oscilar entre US$ 2,30 e US$ 2,40 por libra-peso ao menos até setembro, quando as lavouras brasileiras começam a florescer. Uma florada promissora poderia abrir caminho para uma queda mais acentuada nas cotações. "Considero difícil pensar em um mercado operando abaixo dos US$ 2 até que tenhamos certeza sobre o tamanho da nova safra brasileira, porque teremos uma oferta bastante apertada no primeiro trimestre de 2012".

 

Veículo: Valor Econômico


Veja também

Na Samsung, objetivo é ganhar consumidor mais sofisticado

Enquanto a maioria das empresas vem concentrando esforços para ampliar sua presença na classe C, a Samsung...

Veja mais
PepsiCo promove cola, mas defende diversificação

A diretora-presidente da PepsiCo Inc., Indra Nooyi, fez pressão para que a empresa expandisse sua carteira de pro...

Veja mais
Preço do leite volta a subir no país

A concorrência na captação de leite entre os laticínios do Sudeste e Centro-Oeste voltou a su...

Veja mais
Fiesp admite aviso prévio de até 2 meses

Paulo Skaf, presidente da entidade, diz que tempo maior que esse poderá criar problema para patrões e empr...

Veja mais
Maior fusão do varejo vira tacada de mestre

Em uma jogada de mestre, que pode inclusive ser vista como a maior sacada da história do varejo brasileiro, o emp...

Veja mais
Samsung vai fabricar produtos da linha branca em Manaus

O tradicional mercado de eletrodomésticos deve ganhar mais um concorrente local na linha branca. A coreana Samsun...

Veja mais
Diniz comanda virada bilionária no varejo

O empresário Abílio Diniz moveu a peça do xeque-mate no tabuleiro do varejo, e agora todos os olhos...

Veja mais
ALMG vê restrições ao comércio de queijo

Restrições impostas pelos órgãos de vigilância sanitária para a comercializa&cc...

Veja mais
Azeites Borges nomeia novo distribuidor em Minas Gerais

Presente em mais de 108 países, a espanhola Borges - uma das marcas de azeite mais consumidas em todo mundo - que...

Veja mais