Maior fusão do varejo vira tacada de mestre

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Em uma jogada de mestre, que pode inclusive ser vista como a maior sacada da história do varejo brasileiro, o empresário Abílio Diniz arriscou todas as fichas na ação de levar a bandeira criada por sua família, o Grupo Pão de Açúcar (GPA), para a internacionalização de seus negócios, inclusive com apoio financeiro, e que apoio, do governo brasileiro, e de uma instituição financeira privada, ter um investimento de mais de R$ 4,528 bilhões para se unir ao Carrefour, em uma das estratégias que pode colocá-lo, sem medo, na categoria de um dos maiores gênios da raça no comércio varejista nacional.

 

O empresário deu um verdadeiro xeque-mate no seu sócio francês Casino, ao ganhar os holofotes com a negociação que, ao se unir ao seu arquiconcorrente, o grupo vice-líder no varejo brasileiro Carrefour, que vinha apresentando problemas financeiros na Europa, poderá levar o empresário Abilio Diniz a se tornar o maior acionista individual (pessoa física) do segundo maior grupo varejista do mundo.

 

Para o negócio, seria criada uma empresa chamada Novo Pão de Açúcar (NPA), que seria a dona do atual Pão de Açúcar e teria pelo menos 11,7% do Carrefour francês. Essa participação lá fora poderia ser elevada a até 18%. Além disso, o próprio Abilio passaria a ter 16,9% do NPA (sendo 10,5% diretamente e 6,4% por meio da holdingWilkes - controladora do Grupo Pão de Açúcar), o que lhe daria 2% das ações imediatamente do Carrefour global e talvez até 3% em 2013.

 

Analistas de mercado consultados pelo DCI, afirmam que para fazer frente à grande concorrência gerada pela criação do NPA, o mercado aguarda a possibilidade de novas fusões e aquisições. "Certamente a fusão entre Carrefour e Pão de Açúcar [se realmente acontecer] vai gerar uma ameaça na concorrência, já que vai concentrar fatia considerável do mercado. É provável que para não perder musculatura outras redes se unam, para aumentar a consolidação e fazer frente ao Pão de Açúcar", aponta o analista financeiro Christian Majczak, sócio da Go4! Consultoria de Negócios.

 

Segundo o especialista será difícil competir com a nova empresa, por isso a concorrência também poderá investir em nichos localizados nas cidades do interior ou em bairros onde o peso das duas redes não seja tão significativo. Outro efeito da fusão, na visão do professor Rogério Sobreira, professor da Escola Brasileira de Administração de Empresas da FGR/Rio, refere-se ao impacto direto na formação dos preços e piora na cadeia competitiva para consumidor final, ocasionado pela grande concentração. "Diria que se não houver regras claras nesse processo de fusão, a nova empresa passará a ditar os preços do mercado, podendo haver ainda menor redução futura dos preços dos produtos", observa o especialista.

 

O impacto atingirá especialmente os consumidores da Região Sudeste, área geográfica que concentra a maior parte das empresas dos dois grupos. Sobreira também compartilha a opinião de que haverá uma grande movimentação de fusões e aquisições no mercado, e o processo deverá ser iniciado na Região Sudeste. Outras regiões do País, porém, tenderão a acompanhar essa dinâmica, havendo a possibilidade de cadeias locais serem engolidas por empresas maiores.

 

Embora reconheça que a competição será mais difícil para as médias e pequenas redes de São Paulo, o presidente da Associação Paulista de Supermercados (Apas) João Galassi entende que não haverá mudanças significativas no setor. "Há mais de 14 anos a concorrência está nas mãos de empresas internacionais, que concentram 40% do mercado. Nesse período, as empresas apenas mudaram de mão, mas ainda há muito espaço para competir. O Brasil está crescendo muito o e o setor varejista acompanha essa tendência" crê Galassi.

 

Questionamentos

 

Eduardo Coutinho, professor de Finanças e coordenador do curso de Administração do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), também levanta questionamentos sobre a injeção de 2 bilhões de euros (R$ 4,528 bilhões) para a criação da nova empresa, oriundos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Na sua análise, embora essa seja uma tendência que já se observa no mercado ao longo desta década - e da qual o BNDES volta a participar ativamente - a capitalização da nova empresa (NPA) com recursos do governo, a custos muito baixos, tem poder de gerar distorções no mercado. "A discussão é de natureza política. Porém, não deveria ser papel do governo interferir nessas questões. É evidente que o banco vai eleger segmentos tidos como 'líderes do mercado' para aplicar seus recursos", pondera.

 

Acusações

 

A proposta de fusão entre o Pão de Açúcar e a operação brasileira do Carrefour foi marcada por acusações entre Abilio Diniz e o Casino. No mesmo dia em que o negócio foi divulgado, Diniz e Jean-Charles Naouri, controlador do Casino, enviaram cartas ao conselho de administração do Pão de Açúcar criticando um ao outro. Naouri disse a órgãos internacionais que a situação era de se "lamentar", principalmente pelo fato de que Abílio iniciou negociações "secretas e ilegais" sobre o futuro da companhia sem seu consentimento.

 

Em resposta, Abílio disse estar com a "consciência tranquila" e acusou Naouri de recusar o diálogo, já que não teria sido recebido pelos executivos do Casino eme sua viagem à França, nesta semana. A negociação com o Carrefour fez com que o Casino acionasse Abílio em um tribunal de arbitragem para dar explicações. O processo entre os sócios é visto como último recurso e mostra que a situação entre eles está fragilizada ainda.

 

Oficializar operações

 

O mercado brasileiro esteve ontem em polvorosa com a notícia de que a Companhia Brasileira de Distribuição (CBD) havia divulgado fato relevante contendo a proposta de fusão das operações do Pão de Açúcar com o Carrefour com mais detalhes em relação ao que foi divulgado na França pelo Carrefour e na entrevista à imprensa concedida pela gestora Estater e o banco BTG Pactual. Conforme já divulgado o aporte dos novos sócios somará R$ 4,600 bilhões (ou cerca de 2 bilhões de euros), sendo R$ 3,910 bilhões do BNDES e R$ 690 milhões do BTG. A operação de fusão ainda terá de ser submetida à aprovação dos acionistas envolvidos, mas até 7% das lojas dos dois grupos que estiverem muito próximas poderão ser fechadas ou transferidas para outra região.

 

Proximidade entre lojas é fator que dificulta a união

 

Na movimentação gerada pela união de Grupo Pão de Açúcar (GPA) e Carrefour existe a possibilidade de o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), numa análise técnica, exigir das companhias a venda de unidades que operem muito próximas, num raio de até três quilômetros. Isso porque a superposição entre pontos comerciais do GPA e do Carrefour poderia vir a atrapalhar a fusão entre as duas empresas.

 

"Várias lojas vão dar problemas no Brasil. Talvez seja um número tão grande que leve as companhias a desistirem do negócio", opinou o diretor-geral da Demarest e Almeida Advogados, Mário Nogueira. O escritório de advocacia é especializado na atuação do órgão antitruste.

 

A proximidade das unidades se concentra na Região Sudeste do Brasil, onde o GPA mantém 481 lojas e o Carrefour dispõe de 548 filiais, segundo a Estatér, escritório que planejou a possível fusão das duas empresas. Os números representam mais de metade do total de unidades comerciais dessas marcas.

 

"No caso dos supermercados, o consumidor se dispõe a andar no máximo três quilômetros [para escolher o estabelecimento]. Este é o raio da concorrência", explicou Nogueira. Tal raio deverá ser respeitado pelas companhias, que precisarão abrir mão de pontos comerciais se levarem adiante seu acordo de fusão.

 

Antes de ser aprovado pelo Cade, no entanto, o acordo precisa passar pelo conselho de acionistas das duas empresas, no Brasil e na França, explicam especialistas.

 


Veículo: DCI


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