Casino veta união, e, sem acordo entre sócios, BNDES oficializa saída do negócio; Abilio pede suspensão de proposta
Sócio francês do Pão de Açúcar fez estudos que mostram riscos potenciais e perda de valor para acionistas
Fracassou a tentativa de fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour no Brasil, que pretendia criar uma supervarejista brasileira de alcance global.
O BNDES retirou oficialmente ontem o apoio pré-aprovado de R$ 4,5 bilhões, inviabilizando a engenharia financeira montada para unir Pão de Açúcar e Carrefour.
O banco alegou falta de entendimento dos sócios Casino e Abilio Diniz, que dividem o comando do Pão de Açúcar.
Em Paris, o conselho do Casino ouviu três consultorias -Santander, Goldman Sachs e Roland Berger- e chegou à conclusão de que não faz sentido comprar o Carrefour brasileiro, que é "caro" e tem problemas gerenciais.
Diante da dupla rejeição, o BTG Pactual -que se juntou a Abilio e assumiu a proposição do negócio- preferiu retirar "temporariamente" o assunto de discussão.
Para o Casino, a fusão esbarra em riscos regulatórios e concorrenciais e não faz
sentido nem para a empresa nem para os acionistas.
As razões da recusa, segundo um dos consultores, são:
1) a unidade brasileira do Carrefour tem foco equivocado (privilegia os hipermercados, modelo "fora de moda");
2) houve sobrevalorização (o Carrefour brasileiro é uma "caixa-preta", com contabilidade questionada após fraude de € 500 milhões em 2010);
3) a unidade não conseguirá implementar sinergias (ganhos de eficiência) de R$ 1,8 bilhão anual;
4) há problemas de administração.
Antes da suspensão da proposta, o assunto seria levado para a reunião de 2 de agosto da Wilkes, holding que representa a antiga aliança entre Casino e Abilio no comando da empresa.
Na Wilkes, o Casino prometia barrar o negócio. Como Abilio retirou a proposta, a reunião deve ser cancelada.
SEM BRECHA
Defensor da fusão, Abilio participou da reunião ontem do Casino, mas não votou.
Ao deixar a reunião, o empresário brasileiro insinuou que não houve "brecha" para um acordo amigável e disse que não concordava com os estudos apresentados.
"Não estou de acordo com os estudos que foram feitos aqui pela Roland Berger e outros. Acho que não representam a realidade. Mas eu não quero fazer críticas", disse.
Segundo o Casino, 40% das lojas do Carrefour e do Pão de Açúcar estão presentes em uma mesma zona geográfica. Esse percentual de concentração chega a 71% em São Paulo e a 43% no Rio.
O Casino ainda contesta a inserção do Pão de Açúcar no mercado internacional.
O aspecto era sendo destacado como positivo por Abilio e levado em conta pelo BNDES para participar da fusão.
Para o Casino, a estratégia de internacionalização deve ter como foco mercados de forte crescimento, e não o europeu, que está em crise.
Abilio reiterou seu apoio à fusão, mas reconheceu que, nas "presentes condições", não é factível prosseguir com essa proposta. "A decisão unilateral do Casino é profundamente lamentável", disse, em nota.
Com o fracasso das negociações, as ações do Pão de Açúcar recuaram 2%.
Casino quer comprar fatia de Abilio Diniz
Abortada a fusão com o Carrefour no Brasil, o grupo francês Casino agora "quer se livrar" do sócio Abilio Diniz, com quem terá de conviver e dividir o comando do Pão de Açúcar na holding Wilkes até junho de 2012.
A Folha apurou que o Casino poderá "pagar caro" para adiantar um negócio que só cogitava efetuar a partir de 2014.
O varejista tem contrato de opção, com valor não revelado, para comprar a parte de Abilio. Interlocutores do empresário refutam a possibilidade de ele deixar o Pão de Açúcar, onde tem assento vitalício no conselho.
No entanto, Abilio teria interesse em vender sua fatia para poder comprar o Carrefour no país. Seria uma "saída honrosa" da crise com o Casino. (TS)
BNDES desiste de investir no negócio
O BNDES desistiu oficialmente ontem de investir até R$ 4,5 bilhões na fusão entre o Pão de Açúcar e o Carrefour.
A decisão foi tomada após a rejeição da proposta pelo conselho de administração do grupo francês Casino -sócio de Abilio Diniz no Pão de Açúcar- ontem, em Paris.
A presidente Dilma Rousseff havia condicionado o apoio à fusão a um entendimento amigável entre os sócios, o que não aconteceu.
Essa havia sido a posição do banco desde que a operação foi divulgada, reiterada e tornada mais explícita depois da repercussão negativa da operação no mercado. Principalmente com a rejeição do grupo Casino.
Em comunicado, o banco disse que, após a decisão do conselho do Casino, a diretoria da BNDESPar decidiu cancelar o enquadramento da operação solicitada pela Gama, empresa criada pelo BTG Pactual para a operação.
A Folha apurou que a desistência do banco invalidaria toda a proposta de fusão feita pela Gama. Isso porque a engenharia financeira elaborada estava condicionada à aprovação do BNDES.
Para o projeto ser levado adiante, uma nova proposta teria de ser elaborada do zero.
Chegou a ser noticiado na imprensa que o BTG Pactual e a corretora Estáter, responsáveis pela elaboração da operação, já contavam com a desistência do BNDES e por isso procuravam investidores no exterior para financiar a fusão.
Mas fontes próximas às negociações disseram que na realidade os sócios privados não estavam fazendo um "roadshow", mas sim entrando em contato com fundos já detentores de ações do Pão de Açúcar para a apresentação da operação.
Ontem, durante a reunião do conselho do Casino, Abilio Diniz, que também é conselheiro, mostrou estudos elaborados pela FGV (Fundação Getulio Vargas) e pela consultoria Tendências apontando as vantagens da fusão, mas foi voto vencido.
Mas vários outros estudos dos aspectos econômicos da proposta foram apreciados ontem pelo conselho: do Santander, da Goldman Sachs, da Messier-Maris & Associés, do Rothschild, da Merril Lynch e da Roland Berger.
Veículo: Folha de S.Paulo