Grandes redes ampliam assédio aos pequenos

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Entrada do Dia%, do Carrefour, e expansão do TodoDia, do Walmart, preocupam setor supermercadista do Estado



Os grupos estrangeiros de supermercados aumentarão a briga pela clientela de bairro em Porto Alegre e na Região Metropolitana. A artilharia virá em duas frentes. Até dezembro, o francês Carrefour estreará no Estado sua bandeira Dia%, transformando os gaúchos no primeiro alvo fora de São Paulo, onde o formato se disseminou. O Walmart expandirá sua grife TodoDia, que soma hoje 13 filiais em território gaúcho das 140 existentes no País.

A Associação Gaúcha de Supermercados (Agas) admite que as dificuldades para os varejistas nativos vão aumentar, principalmente pelo poder de fogo das multinacionais na negociação com fornecedores.

“A estratégia dos grandes é abocanhar todo o mercado possível”, define o presidente da Agas, Antonio Cesa Longo, que só enxerga piora para os menores sobreviverem. Para abrir pontos, consultores do Dia% assediam pequenos varejos. O modelo atua com ponto próprio e franqueados, com lojas de 2 mil a 3 mil itens. Em Igrejinha, Ezequiel Stein, dono do Super Lanz, diz que está avaliando a proposta da nova rede. “Eles estão insistindo e falando com muita gente na região”, comenta Stein. Longo vê poucas chances de a tentativa de cooptar os varejistas vingar, lembrando que houve resistência em outros casos no passado.

Nos planos dos franceses, estaria o de se estabelecer onde já existe filial do concorrente  TodoDia. O recente fechamento de hipermercados Carrefour para virar Atacadão em Porto Alegre e Novo Hamburgo também apoiaria a nova operação, segundo informação repassada ao presidente do Sindicato dos Empregados do Comércio de NH, Vitor Luis Gatelli. “O atacarejo abasteceria a loja menor”, traduz Gatelli. O grupo francês está de olho no potencial de consumo das classes C e D e reforça a atuação nos atacarejos, que hoje dão lucro no País. Dos 74 Atacadão em todo o Brasil, cinco estarão no Estado, que registrou, segundo o Ranking da Agas, alta de 21,3% na receita dos atacarejos em 2010, ante 14,5% das lojas tradicionais.

Para obter maior rentabilidade, um atacarejo tem menos empregados, instalações mais simples e mix mais restrito. Um supermercadista local diz que a rentabilidade chega a dobrar. Na mudança das lojas, hoje em reforma e que devem reabrir em 90 dias, 300 pessoas foram demitidas (cem na Capital e 200 em Novo Hamburgo). O grupo diz que tentou reaproveitar o máximo de pessoas e que muitas poderão ser recontratadas. O diretor do Sindicato dos Empregados no Comércio de Porto Alegre (Sindec), Luiz Carlos Barbosa, vislumbra que as ações aumentarão a concorrência para os menores. Barbosa cita que os mercadinhos no bairro Restinga temem a chegada do TodoDia, que se instalará em um prédio que já foi comércio tradicional dos Romanelli.

O Walmart não comenta onde serão as próximas lojas. Na prefeitura, há projeto para abrir um súper no bairro Santa Tereza. Na Restinga, o Asun mudou há um mês a loja para o formato de atacarejo, de sua bandeira ValeMais. O diretor administrativo da rede, Valdecir Pressi, admite que a mudança se deve à chegada do concorrente da grife Walmart. “Apostamos no atendimento, com mais funcionários na linha de frente, e açougue e padaria menores”, compara Pressi. O diretor de Operações do TodoDia no Estado, Reinaldo Miranda, descarta a imagem negativa junto ao setor.
Dirigentes descartam medidas restritivas, e Agas provoca a indústria

O presidente da Agas, Antonio Cesa Longo, revela que tem aumentado a pressão de associados para que a entidade lidere propostas para proteção ou reserva de mercado. A reação é sinal claro de que o poder de fogo dos grupos estrangeiros, leia-se preços mais baixos, tornou sem efeito táticas de guerra no ponto de venda. Longo afasta qualquer restrição que poderia ser vista como uma afronta à livre iniciativa. Para o dirigente, governos podem criar leis regulando a implantação de grandes operações, que já existem na Capital. “Não tem como proibir uma operação do mesmo tamanho”, explica. Para competir com as lojas de formato de bairro dos gigantes, o presidente da Agas aponta que a única saída é a indústria repassar a mesma negociação firmada com a multinacional ao pequeno. “Quem mudar o jogo hoje é o fornecedor”, provoca o supermercadista. Longo previne que a vantagem obtida atualmente por fabricantes ao vender grandes quantidades a um só comprador pode desaparecer no futuro, caso os pequenos mercados desapareçam. “Tem de olhar para o médio e pequeno”, defende.

Em Canoas, o diretor do Sindicato dos Empregados no Comércio, Antenor Federizzi, diz que recebeu apelo de redes locais para que houvesse apoio à distância mínima entre as lojas. Federizzi concorda que a instalação de bandeiras de fora ao lado do súper de bairro gera uma concorrência desigual. Mas o sindicalista diz que não pode fazer nada. A única ressalva do diretor do sindicato é que as operações abrem número menor de vagas. “Não é problema o mercado de fora abrir, mas desde que não gere menos empregos”, contrasta. A relação seria de cinco empregos na loja do pequeno empresário para um em filiais dos grupos maiores. “O formato possui o número de funcionários adequado ao tamanho da loja e ao modelo de operação”, alega Reinaldo Miranda, diretor de operações do TodoDia no Estado. Miranda ressalta que há espaço para todas as empresas e “quem ganha com a concorrência são os clientes”.

O presidente da Fecomércio-RS, Zildo De Marchi, afirma que a única regulação é a do próprio mercado, descartando medidas de reserva. De Marchi lembra que as diferenças em prol do grande grupo não são tema novo e aposta que o varejista local use em seu favor custo e tamanho menor da operação. “Uma empresa familiar bem organizada tem força e sinergia”, observa. Marchi cita que, caso se confirme vantagens nas operações, como preços abaixo do custo, a entidade agirá. O empresário exemplifica com a mobilização que extinguiu uma vantagem fiscal que o Walmart havia obtido na Justiça. O secretário da Produção, Indústria e Comércio da Capital, Valter Nagelstein, avalia que medidas restritivas deveriam partir de órgãos federais, diante de eventual concentração de mercado, indicando uma ação predatória. “Um ter mais poder que outro é do sistema capitalista. Não posso chegar e dizer que não pode se instalar”, argumenta o secretário.


Veículo: Jornal do Comércio - RS


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