A expansão econômica típica do final de ano tornou ainda mais crítica a falta de mão de obra qualificada no mercado. Mesmo com a exigência de qualificação mediana de funcionários temporários para atender ao aumento das vendas de indústria e varejo de fim de ano, o preenchimento de vagas está difícil. No ramo de supermercados, o Grupo Pão de Açúcar (GPA) pretende contratar 10 mil colaboradores temporários para o Natal, 66% a mais do que em 2010. No entanto, o vice-presidente de Relações Corporativas do GPA, Hugo Bethlem, lembra que a falta de especialização preocupa. "Buscar maneiras de reter esses colaboradores, com mais benefícios, é uma das soluções", diz. O professor Nelson Barrizelli, da Universidade de São Paulo (USP), explica que o baixo índice de desemprego e a rotação constante impedem que novos candidatos sejam atraídos ao varejo. "As pessoas hoje não veem mais as vendas no comércio como profissão, pela falta do plano de carreira" -, opinião partilhada pelo presidente da rede de brinquedos Semaan, Marcelo Mouawad: "Há ausência de interesse dos candidatos porque a mão de obra é barata e braçal".
Nas áreas de infraestrutura, empresários de construção civil, hotelaria e turismo também buscam alternativas ante as demandas da Copa do Mundo e das Olimpíadas no País: o Senac, por exemplo, investirá na abertura de mais de 1 milhão de vagas de cursos profissionalizantes até 2014. Já na construção civil, já há adoção de cursos além do canteiro de obra e aumento de benefícios aos parentes dos funcionários para driblar o déficit, conta Antonio Settin, presidente da Settin. Outro setor afetado pela falta de capacitação é o de TI e telecomunicações. A lacuna já é de 100 mil vagas na área de tecnologia da informação e, se o segmento continuar crescendo no Brasil à média de 16% ao ano, o volume pode chegar a 200 mil vagas até 2013. No polo tecnológico do Rio Grande do Sul, empresas como a alemã de softwares de gestão SAP e a fabricante de hardware americana Dell criaram parcerias com as instituições locais de ensino superior Unisinos e PUC-RS a fim de minimizar o problema.
Na indústria paulista, a previsão é que a demanda por mão de obra qualificada seja crescente até 2015. Esta é a conclusão de estudo inédito do Departamento de Ação Regional da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Depar/Fiesp), adiantado ao DCI. Os setores de veículos, construção , tecelagem, vestuário e acessórios devem ser responsáveis pela maior demanda, diz o diretor do Depar da Fiesp, Alexandre Serpa. O setor automotivo, que em 2010 empregava cerca de 280 mil trabalhadores, segundo o Ministério do Trabalho, em 2015 deverá ter mais 419 mil vagas abertas, crescimento de 48%.
No caso das cooperativas agrícolas brasileiras, a dificuldade de encontrar profissionais qualificados é até cultural. Além da concorrência com indústrias e setores produtivos urbanos, as cooperativas enfrentam o preconceito gerado pela crença de que "a lida no campo" só oferece trabalho braçal. Ao mesmo tempo a participação feminina em conselhos de administração de 454 companhias listadas na Bovespa cresceu para 8%, ou 165 das 2.647 posições efetivas. O problema, segundo o senador Casildo Maldaner (PMDB-SC), é a prioridade para investimento na preparação de mão de obra qualificada principalmente para a exploração de petróleo no Brasil. Afinal, o segmento terá, nos próximos anos, seu ápice, com o pré-sal.
A expectativa de uma certa acomodação do crescimento econômico esperado para os próximos meses e a alta carga tributária sobre a folha de pagamento podem vir a minimizar a contratação de pessoal. Em 2012, deverá ser criado cerca de 1,8 milhão de novas vagas com carteira assinada, já abaixo de 2011, diz Celso Grisi, do Instituto de Pesquisa Fractal.
Rotatividade da mão de obra preocupa os supermercados
O déficit de funcionários no setor supermercadista brasileiro atinge uma falta de mão de obra especializada principalmente em cargos como os de padeiros e açougueiros, por causa dos baixos salários no setor. Isso cria um cenário em que a rotatividade do segmento chega a 36% no Estado de São Paulo, e de até 70% em regiões como Minas Gerais. O gargalo de temporários neste final de ano, por outro lado, não parece preocupar tanto as grandes empresas do ramo. Afinal, o Grupo Pão de Açúcar (GPA), que lidera o varejo brasileiro, anuncia que irá, sozinho, contratar 10 mil colaboradores temporários para o Natal em todo o País, 66% a mais com relação ao mesmo período em 2010.
De acordo com Hugo Bethlem, vice-presidente de Relações Corporativas do Grupo Pão de Açúcar, dos 10 mil colaboradores que serão contratados para o Natal em todo o País, 7 mil deles serão apenas para atender a demanda no Estado de São Paulo. De modo geral, a expectativa do setor é que 46% dos supermercados que atuam no estado elevem o número de funcionários entre os meses de novembro e dezembro, nos quais a procura pelo varejo tem um aumento de 20%, com relação ao restante do ano. As informações são da Associação Paulista de Supermercados (Apas) e de empresas como a Cooperativa de Consumo (Coop), uma das maiores do mercado no País.
Baixa estimativa
Apesar do GPA ter um alto volume de contratação, 66% a mais, de modo geral a estimativa de reposição de mão de obra no setor supermercadista, este ano, parece muito baixa. Prova disso é que só no Estado de São Paulo o setor teria a perspectiva de contratar apenas 3% a mais do que o visto no ano passado, quando foram chamados cerca de 11 mil temporários.
O vice-presidente da rede Coop, Márcio Francisco Blanco do Valle aponta que existe uma grande dificuldade de reposição em geral, mas algumas áreas sofrem maior desfalque do que outras. Para as funções especializadas que não têm escola, como açougue, padaria e confeitaria, a rede Coop está de olho em formar profissionais internamente. Uma saída para essa questão. "Principalmente agora, com o aquecimento da economia, vemos que o varejo perde profissionais para a indústria, que oferece salários mais altos", declarou ele, sobre a disputa pelos funcionários. Este ano, a Coop planeja contratar 100 pessoas para áreas operacionais por causa da sazonalidade, praticamente o mesmo de 2010.
O deslocamento dos trabalhadores faz com que a rotatividade dentro dos supermercados em algumas regiões fora do eixo Rio-São Paulo seja até maior, de até 70%, segundo a Associação Mineira de Supermercados (Amis). Enfocado nesse problema, o GPA planeja estender os benefícios complementares oferecidos aos trabalhadores. "Queremos cada vez mais segurar o colaborador conosco. Para isso, estamos reforçando nossos benefícios, como a extensão da licença maternidade e o cartão mamãe", declara Bethlem ao DCI.
Varejo popular
A preocupação da escassez de funcionários atinge também outras áreas, como a de venda de brinquedos e materiais para escritório. A migração reversa, que tem levado pessoas de fora de São Paulo a voltar para suas cidades de origem, e os baixos salários pagos, têm sido os principais desafios. Nos últimos 10 anos, a quantidade de pessoas que saíram do nordeste, por exemplo, para tentar melhores condições de vida no sudeste teve queda de 50%, conforme dados d o IBGE.
Segundo o economista e professor da Unicamp, Cláudio Dedecca, a quantidade de trabalhadores nordestinos em São Paulo está menor. "Significa que São Paulo precisa se resolver com a população que tem, o que nem sempre é possível, pois a remuneração para estes cargos normalmente é baixa", explica.
Para tentar atenuar este dado, a empresa Semaan, que comercializa brinquedos, investe em cursos profissionalizantes e contratações que vão além dos meses de temporário. De acordo com Marcelo Mouawad, presidente da Semaan, atualmente, a maior dificuldade para encontrar profissionais estão nas áreas de estocagem e vendas. "A falta de interesse dos candidatos é principalmente porque é uma mão de obra barata e braçal, como no caso dos estoquistas", afirmou o executivo.
Com relação às contratações de temporários para este Natal, o empresário afirma que 83,3% dos funcionários contratados em julho, já de olho na demanda do Natal, ficarão como efetivos para o ano que vem. Para o especialista em perfil do varejo brasileiro e professor da Universidade de São Paulo (USP), Nelson Barrizelli, o baixo índice de desemprego e a rotação constante impedem que novos candidatos sejam atraídos pelo setor. "As pessoas hoje não veem mais as vendas no varejo como profissão, porque não é uma área que proporciona um plano de carreira".
Veículo: DCI