A Embrapa Solos, unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, desenvolveu uma solução que entrega tomates sem resíduos de agrotóxicos, em escala comercial. O sistema agrícola de produção foi batizado de Tomate Ecologicamente Cultivado (Tomatec) e surgiu a partir da demanda de agricultores do município fluminense de São José de Ubá, a 326 quilômetros do Rio de Janeiro. Pode ser aplicado em pequenas e grandes plantações, com ganhos de produtividade de até 30%.
"Um produtor da cidade reclamava que produzia tomate seguindo os conceitos conservacionistas do solo, mas não conseguia um preço diferenciado para o produto", lembra José Ronaldo de Macedo, pesquisador da Embrapa Solos. "A partir daí, desenvolvemos pesquisas para ajudá-lo a entregar os frutos sem resíduos."
O Tomatec baseia-se na adoção de seis práticas agrícolas, como a adoção do plantio direto com rotação de culturas, plantações em nível e uso da irrigação por gotejamento, além da utilização de adubo químico solúvel na água de irrigação, manejo integrado de pragas e ensacamento das pencas de tomate com papel glassine. O papel glassine, também chamado de cristal ou pergaminho, é um material transparente usado em embalagens de alimentos ou como proteção das frutas nas árvores.
De acordo com Macedo, o desenvolvimento do Tomatec levou quase 12 anos. Começou em 1994, no município de Paty do Alferes (RJ), e terminou nas fazendas de São José de Ubá. "Descobrimos que o principal fator de degradação ambiental nos campos era o plantio do tomate. O cultivo era feito morro abaixo, com uso indiscriminado de insumos químicos e irrigação com mangueiras pesadas. Isso causava perda de solos, erosão das encostas, assoreamento e contaminação dos rios."
A pesquisa foi financiada pela União Europeia, Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Padct), além do Fundo Nacional do Meio Ambiente e Projeto de Apoio ao Desenvolvimento de Tecnologia Agropecuária para o Brasil (Prodetab). Parceiros como a Coordenadoria da Defesa Sanitária Vegetal do Estado do Rio de Janeiro (CDSV), a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-Rio) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) também colaboraram com o projeto.
"A solução é inovadora porque conseguiu produzir, em escala comercial, tomates sem resíduos de agrotóxicos", diz o pesquisador. "O único sistema de produção que garante essa qualidade é o orgânico." A inovação também ajuda na redução da erosão, por conta das práticas de manejo adotadas, e inibe o caráter nômade da produção do fruto. "O plantio direto fixa o produtor por um período mais longo na mesma área e diminui a contaminação do solo e da água, por conta do uso de quantidades menores de adubos."
A tecnologia foi desenvolvida para regiões de relevo ondulado e montanhoso, mas há possibilidade de resultados ainda melhores em áreas menos acidentadas. Para Macedo, o maior desafio enfrentado durante a implantação do projeto foi a resistência à adoção do sistema de produção. "Há ceticismo entre produtores e técnicos da área rural. Mas os resultados obtidos já têm derrubado os entraves existentes". O sistema possibilitou ganhos de produtividade de até 30%, redução de 10% no custo de produção, além da entrega de frutos de melhor qualidade. Um hectare plantado pode produzir até 80 toneladas do fruto. O preço de venda, avalia Macedo, também poderá ser mais gordo, por conta da ausência de resíduos de agrotóxicos e a boa aparência do tomate.
A Embrapa Solos considera que os tomates produzidos com o sistema podem ser considerados de "transição agroecológica", pois dá uma alternativa ao produtor de trafegar entre o método convencional e o modelo orgânico. "É uma tecnologia que, em comparação à sazonalidade do similar orgânico, incrementa a produção durante vários meses do ano."
Além do interior fluminense, onde é usado em pequena escala, o sistema também foi avaliado nos municípios de Rio Verde e Goiânia (GO), Sete Lagoas (MG) e Petrolina (PE) e a Embrapa Solos inicia uma produção com duas mil plantas de tomate, baseadas no Tomatec, no município de Nova Friburgo (RJ).
De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), quase um terço dos vegetais mais consumidos pelos brasileiros apresenta resíduos de agrotóxicos em níveis inaceitáveis. No topo da lista de irregularidades, segundo pesquisa do órgão, está o pimentão. Amostras de morango e pepino também apresentaram presença de substâncias nocivas além do permitido. Dos 50 princípios ativos mais usados em agrotóxicos no Brasil, pelo menos 20 já foram banidos na União Europeia.
Veículo: Valor Econômico