"Jogar tudo para o alto" não é um conceito inimaginável aos profissionais que buscam o equilíbrio.
Foi-se o tempo em que benefícios e um plano de pensão eram suficientes para manter um talento satisfeito dentro de uma empresa. Esse tipo de vantagem, antes muito valorizada, já virou commodity: as grandes companhias oferecem basicamente os mesmos pacotes, com pequenas alterações. Os profissionais de hoje - principalmente os com idade até 35 anos - pensam além: são capazes de trocar benefícios "clássicos" pelo equilíbrio entre vida profissional e projetos profissionais.
As evidências de que a nova geração de talentos procura outro tipo de relação com o empregador estão em toda parte. Empresas como o Google, por exemplo, oferecem horário flexível e até uma verba para a personalização da mesa de trabalho. Já a Natura busca a valorização do bem-estar dos funcionários como proposta de valor em recursos humanos, enquanto a Ambev montou um esquema em que o cumprimento de metas está associado a programas de recompensa financeira bem definidos.
Para o vice-presidente executivo da empresa de recrutamento Monster, Rob Brouwer, o segredo está na criação de uma campanha de "marketing de talentos". "A companhia precisa ter um discurso afinado. Tem de dizer claramente o que oferece para atrair a pessoa que está buscando aquele conjunto de valores."
Dentro desse raciocínio, o holandês Brouwer, que tem larga experiência em mercados europeus, afirma que algumas práticas comuns no mercado brasileiro ficaram obsoletas. Uma delas é a divulgação de vagas que não trazem o nome da empresa nem o salário proposto. " um erro do ponto de vista do marketing corporativo. Esse tipo de processo certamente vai atrair muita gente que não está alinhada com a cultura da companhia", explica o executivo. " uma estratégia que só se justifica para cargos estratégicos em que o atual ocupante da vaga ainda não foi avisado que será substituído."
Reviravolta - Outra questão que as empresas precisam levar em consideração, segundo Brouwer, é que precisam estar dispostas a trabalhar com banco de talentos heterogêneo. Os chamados "baby boomers", já perto da idade da aposentadoria, ainda trabalham lado a lado com as gerações X e Y. Quanto mais jovem o profissional, mais difícil será segurá-lo somente com benefícios econômicos. "Muita gente vê a carreira do pai como o exemplo que não deve ser seguido", aponta o especialista. "Fazer carreira por 30 anos em um só local está fora de questão."
"Jogar tudo para o alto" não é um conceito inimaginável aos profissionais que buscam um real equilíbrio entre vida pessoal e realizações profissionais. Ex-analista de risco em bancos de investimento, José Renato Carollo resolveu tirar um sabático de dois anos em 2008. O objetivo: realizar uma viagem de motocicleta pela América Latina. "Vinha adiando esse projeto havia cinco anos, e simplesmente resolvi investir meu tempo nisso", lembra Carollo.
Na volta, o ex-executivo, que teve passagens pelo ING e pelo ABN Amro Bank, decidiu continuar a reviravolta na vida profissional. Deixou a análise de risco e abriu uma empresa de participações. Desde o ano passado, juntou-se a dois sócios e busca interessados para montar um fundo de R$ 100 milhões que investirá em companhias que precisam de capital para financiar seu crescimento. A principal vantagem da estratégia, segundo o empresário, é fazer os próprios horários e fugir das amarras associadas a grandes corporações. "Nunca fui muito bom em seguir a estrutura corporativa, em cumprir um horário padrão. Sou uma espécie de geração Y que nasceu com 15 anos de antecedência", diz Carollo, 46 anos.
O ex-executivo de banco de investimento também decidiu exercer sua veia "artística", ao unir-se a amigos para criar um programa de debates e entrevistas na internet, o Cueca Apertada. "Sempre fui fã do (colunista) Paulo Francis. Minha diversão de domingo era ler o jornal e ver as polêmicas criadas por ele. Resolvi fazer algo na mesma linha", diz. "Já fizemos mais de 60 programas e temos 2 mil seguidores no Facebook."
Toda essa ousadia, claro, precisou de financiamento. Carollo admite que o sabático e a posterior mudança profissional foi financiada com o dinheiro poupado na fase em que trabalhou em bancos de investimento. "Agora, tenho a sorte de poder combinar o que eu realmente gosto de fazer com o que me dá dinheiro."
Veículo: Diário do Comércio - MG