O próximo diretor-presidente da Sony Corp. terá de traçar um novo caminho para uma empresa que já dominou o ramo de passatempos eletrônicos de vanguarda e criou produtos de sucesso como os aparelhos de música Walkman e o videogame PlayStation.
A escolha ontem de Kazuo Hirai, de 51 anos, pelo conselho de administração da Sony, põe fim ao reinado de 7 anos de Howard Stringer, o britânico que em 2005 tornou-se o primeiro diretor-presidente não japonês da empresa e foi incapaz de promover uma virada no negócio de eletrônicos da Sony.
A mudança de liderança acontece quando a Sony se vê em dificuldades para competir com rivais como a coreana Samsung Electronics Co. e a americana Apple Inc.
A íngreme ascensão do iene, de 30% em relação ao dólar durante o mandato de Stringer, também enforcou as metas de lucro.
A ação da Sony está perto do nível mais baixo em duas décadas, e sua classificação de crédito foi rebaixada em janeiro. A expectativa geral é de que a Sony divulgue prejuízo, quando anunciar hoje os resultados do terceiro trimestre do ano fiscal que termina em março.
Harai, que assume o cargo em abril, diz que quer cortar custos e sacudir a estrutura corporativa que ele culpa por bloquear inovações e fazer a Sony patinar no passado. Ele cresceu na empresa com um histórico de cortes duros e principalmente por ter extraído lucros da divisão de videogames PlayStation, quatro anos após ela ter divulgado um prejuízo de US$ 2 bilhões.
"Achei que promover uma virada nos negócios da PlayStation seria o maior desafio da minha carreira, mas parece que não", disse ele ao The Wall Street Journal na semana passada, antes do anúncio. "É um problema atrás do outro.".
Hirai disse que seu objetivo estratégico é ensinar a empresa que seus sucessos passados em manufatura devem ser substituídos por algo mais difícil de quantificar: " a experiência do usuário". O mundo mudou, disse ele. "Não podemos apenas continuar a ser um grande provedor de produtos de hardware, mesmo que algumas pessoas esperem que façamos isso."
Seu antecessor, o eloquente Stringer, de 69 anos, ofereceu uma ampla visão de harmonia entre conteúdo e eletrônicos, - deixando transparecer, muitas vezes, pouca compreensão dos detalhes - para criar experiências disponíveis apenas em produtos Sony. Hirai, um veterano do setor de videogames, é considerado um líder pragmático, capaz de fazer as perguntas certas e tomar decisões difíceis.
"Realmente precisamos trabalhar duro e ser realistas", disse.
Mesmo para uma empresa conhecida por suas escolhas não convencionais de líderes, o histórico de Hirai é pouco ortodoxo. Ele disse que entrou na companhia depois de se formar em 1984, porque acreditava que a Sony oferecia um estilo de vida "rock 'n' roll" que permitia usar calça jeans para trabalhar.
Como o filho de um executivo de banco, Hirai passou a infância nos Estados Unidos, Canadá e Japão. No Japão, ele fundou o clube audiovisual da escola americana em que fez o ensino médio. Ele tem como hobby a construção de modelos de trens e carros, o que, segundo ele, lhe garante as credenciais de nerd.
Ao contrário de muitos japoneses de sua geração, "o pensamento de trabalhar na Sony nunca passou pela minha cabeça", disse Hirai. "Por que iria queria trabalhar para uma empresa de eletrônicos?"
Mas em seu primeiro emprego na CBS/Sony Inc., uma joint venture de música, hoje extinta, entre a rede americana de TV CBS e a Sony, ele serviu como tradutor para bandas como os Beastie Boys e Journey durante suas visitas ao Japão.
Em meados de 1990, as divisões de música e eletrônicos da Sony se fundiram para criar uma rival para a Nintendo Co. no setor de videogames, e Hirai foi indicado para liderar o braço americano da divisão depois que outros executivos mais experientes rejeitaram o cargo.
O PlayStation se tornou a plataforma de jogos rentáveis numa época em que os videogames surgiram para competir com filmes e música na arena de entretenimento. Hirai se tornou a face pública da PlayStation.
Em 2006, Hiriai teve a oportunidade de assumir a liderança de toda a divisão. Ken Kutaragi, o executivo que leva o crédito de lançar o negócio da PlayStation, surpreendeu Stringer durante uma reunião do conselho de administração com a notícia de que o novo PlayStation 3 teria um prejuízo de mais de US$ 2 bilhões em seu primeiro ano. Kutaragi logo deixou a empresa e Hirai assumiu com a determinação de restaurar os lucros.
Hirai convenceu fornecedores de semicondutores da Sony a reduzir os custos. Ele disse que também pediu aos projetistas que trocassem as letras de plástico da logomarca do PlayStation por pintura, e transferiu a sofisticada sede da divisão para dentro da matriz da Sony, tudo para economizar dinheiro.
"Ele fez tudo isso de tal maneira que não alterou os ânimos nem aumentou o grau de ansiedade", disse Stringer. "Ele consegue unir as pessoas em torno de um propósito comum, algo que fica mais fácil quando você fala a língua comum." Stringer não fala japonês.
Hirai foi promovido em abril para supervisionar a divisão de eletrônicos de consumo - ainda a parte central da empresa. Em novembro, ele passou a lidar com o difícil negócio de TVs.
Os televisores já foram a pedra angular de uma bem-sucedida divisão de eletrônicos da Sony, mas a empresa entrou tarde na fabricação de aparelhos de cristal líquido. A decisão provocou sete anos consecutivos de prejuízos para seus negócios de TV. Com a história da empresa é tão enraizada na televisão, seus executivos relutaram em cortar a produção. Mas Hirai declarou três meses atrás que a Sony deixaria de buscar a meta de longo prazo de vender 40 milhões de televisores por ano e disse ao grupo de TV que estava cortando as metas pela metade.
Hirai disse que vai "fabricar apenas o que pode vender" para o negócio de TV da Sony.
Para cortar custos, Stringer e Hirai abandonaram uma joint venture de monitores de LCD com a Samsung em dezembro.
Em outra mudança significativa, Hirai assumiu mais o controle do planejamento de produtos de poderosas divisões da Sony. Em agosto, ele criou uma nova unidade centralizada chamada Integrated UX, uma sigla em inglês para "experiência do usuário". O grupo tem autoridade sobre os gerentes de planejamento de produto para câmeras digitais, televisores, consoles de PlayStation, produtos audiovisuais e computadores Vaio.
No passado, grupos empresariais diferentes podiam mapear produtos de forma independente. Como resultado, disse ele, a carteira de produtos da Sony, tornou-se inchada e incoerente.
O grupo UX coordenou a criação do Tablet S, que a Sony lançou em fins do ano passado e que foi elogiado por críticos de eletrônicos. Mas o aparelho ainda não teve vendas muito graúdas.(The Wall Street Journal, de Tóquio)
Veículo: Valor Econômico