O conserto da Vulcabras

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A fabricante confia seu futuro ao salvador de empresas Claudio Galeazzi.


Dona das marcas Olympikus, Azaleia, Dijean e Opanka, e representante da Reebok no Brasil, a Vulcabras/Azaleia perdeu o passo. Por 15 anos, o avanço nas vendas foi uma constante na empresa. Mas tudo mudou em 2011. Sediada em Jundiaí, no interior de São Paulo, a companhia dos empresários gaúchos Pedro e Alexandre Grendene encolheu 21,7%, para uma receita líquida de R$ 1,54 bilhão, em relação a 2010. O prejuízo ficou em R$ 316 milhões. A justificativa para o péssimo resultado foi a concorrência com os produtos importados, especialmente os made in China, somada a uma drástica diminuição das vendas no mercado interno. Mas nem isso explicava o fato de ela ter apresentado um desempenho tão abaixo dos resultados gerais do setor, que cresceu 5,3% em receita, para US$ 13 bilhões, mesmo vendendo 8,4% menos pares do que em 2010.

Tal descompasso resultou em uma dívida que somava R$ 1 bilhão ao fim do primeiro trimestre deste ano, e no início de negociações para vender uma parte de seu controle ao fundo Pátria Investimentos, controlado pelo empresário Alexandre Saigh e pelo Blackstone, um dos maiores fundos de investimentos dos Estados Unidos. No dia 30 de julho, para surpresa geral, a Vulcabras anunciou sem maiores explicações que as negociações foram interrompidas. E mais: no mesmo comunicado a empresa afirmava ter aceitado a demissão do diretor- presidente, Milton Cardoso, que a comandou por 15 anos. No seu lugar, assumiu Pedro Grendene, principal acionista e presidente do conselho de administração.

Precavido, o dono da empresa tratou de contratar para a missão de salvamento o experiente consultor Claudio Galeazzi, hoje reconhecido recuperador de empresas enfermas e um dos sócios do banco BTG Pactual. Em duas décadas, Galeazzi resgatou operações em dificuldades como as da Cecrisa, Mococa Alimentos, Vila Romana, Lojas Americanas, Sendas e grupo Pão de Açúcar. Segundo uma fonte próxima da nova direção, Galeazzi teria confidenciado que, apesar do endividamento bilionário e da perda de mercado, a situação na Vulcabras não é exatamente desesperadora. “Já tive de enfrentar situações bem piores”, teria dito a esse amigo. Numa análise preliminar, feita nos quatro primeiros dias de gestão, a equipe do consultor avalia ter encontrado uma empresa com condições de pagar a sua dívida elevada.

O próprio Grendene aportou R$ 100 milhões para sanar as dívidas de curto prazo. A equipe de consultoria também percebeu que as possibilidades de reformulação e de melhoria operacional da Vulcabras ainda não estão esgotadas. “A empresa necessita repensar processos operacionais e fabris, fazer uma análise para comprar melhor matéria-prima e modernizar a gestão”, diz a fonte. “A linha atual de produtos também está envelhecida.” No entanto, um especialista que conhece de perto o trabalho de Galeazzi e as condições da Vulcabras, ouvido pela DINHEIRO, duvida das chances de recolocar a gigante dos calçados de pé. “Ele tem muita experiência em reestruturações, mas está mais acostumado a aprimorar a eficiência na operação do que em fazer grandes guinadas”, afirma.

“A empresa precisa de uma mudança dramática de seu modelo de negócios.” Principal linha da Vulcabras, os calçados Olympikus – de tênis esportivos mais sofisticados – exigem custos altos com mão de obra. Em comparação, a concorrente Alpargatas é mais automatizada. Com cerca de metade dos 32 mil funcionários atuais da Vulcabras, a dona da linha Topper e das marcas Havaianas tem um faturamento bastante superior, R$ 2,6 bilhões, cerca de R$ 1 bilhão a mais do que o da empresa dos Grendene. Essas diferenças se refletem na trajetória do valor de mercado das duas empresas no último ano. Enquanto o da Alpargatas subiu 20%, para R$ 4,6 bilhões, o da Vulcabras caiu os mesmos 20%, para R$ 420 milhões, menos de 10% do valor da rival.

Para dificultar o trabalho de Galeazzi, as medidas de cortes de custos mais óbvias já foram adotadas. Durante todo o ano de 2011, Cardoso, o ex-presidente, lutou e esperneou, em busca de uma saída para a má fase. Anunciou o fechamento da fábrica original da Azaleia – adquirida pela Vulcabras em 2007 –, em Parobé, no Rio Grande do Sul. Anunciou o início da produção na Índia, em um sentido contrário à sua pregação como presidente da Abicalçados, a associação dos fabricantes, contrária à importação de calçados da Ásia, o que lhe valeu a forte oposição das marcas estrangeiras, como Nike, Adidas e Puma, e mesmo da Alpargatas, além de um desgaste entre seus pares.

Melancolicamente, Cardoso encerrou o seu último exercício à frente da Vulcabras contabilizando o fechamento de seis fábricas na Bahia e com demissões de 8,9 mil funcionários. A família Grendene também teria deixado claro a Galeazzi que pretende manter as suas operações de manufatura no Brasil, e não cogita instalar fábricas em países asiáticos com menores custos de produção. Essa estratégia poderia afetar as boas relações da família com o governo federal. Com essas amarras, a melhoria do mix de produtos parece ser a principal opção disponível e o maior desafio do consultor e sua equipe. “Mas, para fazer isso, a Vulcabras precisa investir na criação de novas linhas de tênis ou até comprar empresas”, diz o especialista.

“Com as altas dívidas e sem o dinheiro que viria do Pátria, fica muito difícil.” A resposta para essa última questão pode também estar na chegada de Galeazzi, que desde 2010 integra o time de sócios do BTG Pactual, do banqueiro André Esteves. A fonte próxima à nova gestão admite que a liberação de Galeazzi de suas funções no banco de investimentos pode indicar não só uma boa relação do BTG com os Grendene como também a possibilidade de um financiamento à empresa. Até uma compra de participação pode acontecer, se o banco perceber uma oportunidade de ganho. Mas isso dependerá do que Galeazzi vai ficar sabendo depois de passar um pente-fino na Vulcabras e familiarizar-se com as reais condições da empresa.

 
Veículo: Revista Isto É Dinheiro


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