Marca ‘Esso’ está com os dias contados

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Tirar a marca das ruas custou R$ 130 milhões à Raízen, que agora concentrará esforços na Shell e ressuscitará campanhas antigas


Quanto custa dar fim numa marca? E se ela tiver mais de 50 anos de mercado? Ou ainda se tiver estiver presente em 1,7 mil postos de combustíveis espalhados pelo País? Nessa conta, segundo especialistas em marketing, não entram só os custos operacionais. O que está em jogo, na verdade, é a ligação da marca com o consumidor.

Foi essa a análise que a Raízen, atual controladora da rede de postos Esso no País, teve de fazer. A empresa decidiu tirar a marca Esso das ruas - e substituí-la pela Shell. Para isso, gastará R$ 130 milhões.

O abandono da marca Esso não foi imposição de órgãos reguladores de mercado, como já aconteceu com outras marcas no passado. "Foi uma decisão estratégica", disse Luis Henrique Guimarães, vice-presidente comercial da Raízen.

A rede Esso está no Brasil desde 1912. No início, os postos se chamavam "Standard Oil Company of Brazil". Não se sabe, ao certo, quando a marca e seu mascote, o tigre, foram adotados. Mas na década de 40, quando o "Repórter Esso" estreou na Rádio Nacional do Rio de Janeiro, a marca já tinha alguma popularidade.

Em 2008, a rede Esso foi comprada pela Cosan. Três anos depois, a própria Cosan se uniu à Shell, formando a Raízen. Na ocasião, Cosan e Shell anunciaram que a marca Essa seria substituída.

A marca Shell foi escolhida por pertencer à acionista da Raízen. A Esso, cujo nome pertence à americana ExxonMobil, é licenciada para a Cosan, que tem seus direitos no País até 2013. "Poderíamos tentar renovar o contrato, mas a marca nunca seria nossa. Sempre haveria o risco de ter de trocá-la", disse Guimarães.

Desde que a decisão da troca foi tomada, a Raízen tem feito um verdadeiro mutirão para que os 1,7 mil postos Esso adotem os padrões da Shell. Afinal, a troca de bandeira não é uma operação fácil. Só para vestir os frentistas da Esso com o uniforme da Shell, a companhia precisou de 300 mil macacões e 60 mil bonés.

Mas, antes de colocar a mão na massa, a Raízen teve de negociar com os revendedores Esso. Dos 1,7 mil, 50 ainda não assinaram o contrato de transição de marca. O processo deve todo ser concluído até o fim de setembro, conforme espera a empresa.

O desafio é mudar a "cara" do posto sem fechar a unidade. Para isso, a Raízen começou a planejar a transição um ano antes, em junho de 2010. As obras de adequação em cada posto podem levar de 5 a 12 dias, dependendo do tamanho de cada unidade. O treinamento da equipe pode se estender até 30 dias.

A extinção da marca Esso no Brasil não é a primeira que acontece no mercado nacional de postos de combustíveis. A rede Ipiranga, do Grupo Ultra, eliminou os postos Texaco, rede que comprou em 2008, e fez a conversão da marca em todos eles.

A empresa usou uma estratégia diferente da adotada pela Raízen: trocou a bandeira de 1,2 mil postos Texaco de uma vez só, no dia 19 de março, para causar impacto na sua estreia nos mercados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde ainda não atuava.

Apesar de sumir no Brasil, a marca Esso ainda é usada em países como França, Argentina, Itália e Irlanda. Procurada pelo Estado, a ExxonMobil não informou o que pretende fazer com a marca no Brasil após 2013. "A Esso ainda viverá por um bom tempo na memória do brasileiro. Mas será difícil negociar a marca quando ela não tiver mais postos", disse o professor de Marketing da Trevisan Escola de Negócios, Marcos Hiller.

Fascículos. Com mais 1,7 mil postos Shell na rede, a empresa precisou reforçar o marketing. Está investindo R$ 150 milhões até em março de 2013, 30% a mais do que no ano anterior. Entre as ações para fortalecer a marca, a Shell resgatou campanhas lançadas nos anos 80.

Uma delas são os fascículos "Shell Responde", que tiveram 29 edições com perguntas e respostas sobre trânsito e automóveis, publicadas entre 1982 e 1994. O novo "Shell Responde" agora está na internet.

O Clube Irmão Caminhoneiro, lançado pela Shell em 1988 e que chegou ao fim em 2004, também foi ressuscitado. O clube, que oferecia descontos e salas de descanso em postos da Shell, chegou a ter 400 mil sócios e um programa de TV até 1996. Uma enquete no site do programa Pé na Estrada, da Rede TV!, feita a partir de novembro de 2011 com 382 caminhoneiros, apontou que 85% se lembram do programa e que 16% ainda têm a carteirinha de sócio.

"O programa acabou porque, na época, a empresa priorizou outros investimentos", disse a gerente de marca da Raízen, Ingrid Bückmann. A formação da Raízen, que tem receita anual de R$ 50 bilhões, trouxe fôlego a projetos de fidelidade de clientes da Shell.

Força essa que veio em boa hora, pois os concorrentes não estão parados. A Ipiranga, por exemplo, tem um programa de fidelidade que faz parte da rede Multiplus, da TAM. O "Km de vantagens Ipiranga" já tem 10,3 milhões de cadastros. "Um quarto do combustível que vendemos passa pelo programa", disse o diretor de varejo da Ipiranga, Jerônimo Santos.

A BR Distribuidora segue o mesmo caminho. Em abril, lançou o Petrobrás Premmia, com Walmart e a companhia aérea Azul como parceiras. "Em cinco meses, já chegamos a 1,3 milhão de participantes", disse o gerente de marketing e fidelização, Luciano Kielmanowicz - que, como os outros concorrentes, também está de olho nos fiéis clientes da Esso. "Eles agora são filhos sem pai."

O tigre da Esso é um dos ícones que deve sumir do Brasil. O mascote ficou famoso nos anos 50, com a campanha "Put a Tiger in Your Tank", que transformou o tigre em desenho animado e foi divulgada no mundo todo. O "Hungry Tiger" virou símbolo da Esso e chegou a batizar sua loja de conveniência. No Brasil, a marca ficou famosa por patrocinar o "Repórter Esso", transmitido em emissoras de rádio e TV nos anos 40, 50 e 60. A empresa também criou o Prêmio Esso de Jornalismo, que completa 57 anos e ainda é patrocinado pela ExxonMobil. 

Por que grandes marcas desaparecem?

Quando lembramos de marcas como Kolynos, Cica ou Lollo, imediatamente surge a pergunta: o que aconteceu com elas? "A maioria desapareceu por causa da fusão de uma empresa com outra", explica Eduardo Tomiya, da BrandAnalytics. Foi o caso, por exemplo, da marca Cica (leia ao lado). Mas, nem sempre o processo de decidir qual marca fica e qual desaparece é bem planejado, diz ele. "O ideal é analisar cada marca e descobrir qual a mais forte. Mas, normalmente, a empresa compradora mata a marca da comprada." Também é comum que marcas nacionais percam espaço para globais. Foi o caso do chocolate Lollo, da Nestlé, que virou Milkybar. Há também situações complicadas. Em 1996, a Kolynos tinha 56% das vendas de creme dental quando foi comprada pela Colgate-Palmolive, dona de só 22%. Para evitar que mais de 70% do mercado ficassem com a Colgate, o Cade mandou que a marca fosse suspensa por quatro anos. Mas quando pôde ressuscitá-la, em 2003, a Colgate decidiu aposentá-la. Mesmo sem Kolynos, a empresa já tinha 69% das vendas.



Veículo: O Estado de S.Paulo


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