Com praticidades e mordomias, as empresas tentam conquistar os 8 milhões de brasileiros que vivem sozinhos e movimentam R$ 157 bilhões por ano
Condomínio com concierge, que liga para o delivery de comida a pedido do morador. Prédios com lava-rápido na garagem. Eletrodomésticos que também fazem o papel de objetos de decoração. De olho nos 8 milhões de brasileiros que moram sozinhos e já respondem por 13% dos domicílios no País, as empresas estão diversificando a forma de lançar produtos e serviços. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2011, divulgada pelo IBGE no fim de setembro.
Esse público ainda é minoria no Brasil, mas seu poder de consumo não é nada desprezível: eles compõem uma renda de R$ 157 bilhões, segundo estimativas do Instituto Data Popular. "É um valor maior do que o PIB da Bolívia", disse o sócio-diretor do instituto, Renato Meirelles. E, se eles formassem um país, teriam o 62º Produto Interno Bruto do mundo, segundo o ranking de 2011 do FMI.
Essa fatia da população exibe ainda um ritmo acelerado de crescimento: entre 2009 e 2011, cerca de 1 milhão de brasileiros passaram a morar sozinhos. "O jovem não precisa mais casar para sair de casa. E temos também muitos divorciados e viúvos neste grupo", disse Meirelles.
Segundo ele, as oportunidades mais evidentes para esse consumidor estão no segmento de alimentação. "Quem mora sozinho é mais fiel a marcas e mais interessado em produtos premium do que a média. E está à procura de porções menores e produtos semiprontos", explica.
Para atender a esse cliente, a Brasil Foods lançou em 2009 a linha Meu Menu, da Perdigão, que oferece uma comida mais caseira do que os tradicionais congelados. A linha cresceu e já responde por 10% da categoria, segundo dados da Nielsen.
Já a rede Pão de Açúcar prepara porções de frutas picadas e de refeições feitas no dia para uma pessoa só. "O cliente quer alimentos frescos. O macarrão instantâneo e o congelado não preenchem mais essas necessidades", disse o diretor de operações do grupo, João Edson Gravata. "Tentamos oferecer em porções adequadas para esse consumidor os produtos que embalamos na loja, como frutas, verduras, carnes e queijos. Mas, em outros segmentos, essa decisão é da indústria."
Além da indústria alimentícia, o mercado imobiliário também precisou reavaliar seus conceitos para atender o consumidor que mora sozinho. Nasceram, assim, os imóveis compactos de alto padrão, com diferenciais que vão de academia, espaços para animais de estimação a serviços de concierge no condomínio, que faz compra de passagem aérea e pede entrega de comida para o morador.
A incorporadora Brookfield criou uma linha específica para o chamado público single, que inclui as pessoas que moram sozinhas e os casais sem filhos. "Os empreendimentos não têm nenhuma estrutura de lazer para crianças, como playground", disse o diretor de incorporação da Brookfield, Ricardo Laham. Serviços que trazem praticidade para o morador, como lava-rápido na garagem e uma "camareira" do condomínio, foram incluídos nos projetos.
A Maxhaus também aposta forte no segmento. "A palavra-chave para atender esse público é praticidade", disse a diretora de marketing da incorporadora, Luana Rizzi. O condomínio tem um espaço para lanches com máquinas de café e de alimentos prontos, como sanduíches e salgadinhos.
Na hora de mobiliar a casa, o número de moradores também faz diferença. "O consumidor que mora sozinho exige um design mais moderno do que a média. Muitos vivem em apartamentos pequenos e os eletrodomésticos fazem parte da decoração da casa", disse o gerente-geral de design e inovação da Whirlpool, Mario Fioretti.
Nada de fogão. O fogão a gás é desprezado - a preferência é pelos cooktops de duas ou quatro bocas. "Ele não quer o fogão igual ao da mãe. Quer algo moderno, compacto é até colorido." Mas as pesquisas mostraram que o mesmo não vale para a geladeira, ou seja, esses clientes não estão dispostos a substituir o item por um frigobar. "Só uma pessoa mora lá, mas os amigos frequentam a casa. A geladeira tem que suportar a cerveja da galera."
A Whirlpool começou a pesquisar os hábitos desse nicho no Brasil em 2009, depois de constar em estudos globais que morar sozinho é uma tendência. "E as tendências globais chegam no Brasil mais cedo ou mais tarde", disse Fioretti.
Os indicadores de vendas de imóveis já mostram que a moda pegou por aqui. Em julho, 11% dos apartamentos novos vendidos na região metropolitana de São Paulo tinham apenas um dormitório - quase quatro vezes o volume de imóveis com quatro quartos, segundo dados do Sindicato da Habitação (Secovi-SP). Os apartamentos com três dormitórios representam 12,9%.
Em 2009, cerca de 20% dos imóveis vendidos tinham quatro quartos e apenas 5% um dormitório. A missão das empresas agora é descobrir o que os moradores "solitários" querem colocar dentro de casa e como pretender gastar sua renda de R$ 157 bilhões.
Veículo: O Estado de S.Paulo