Contraproposta: Prática é comum, mas quase sempre acaba mal

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Sondar o mercado, receber e avaliar propostas e até conversar sobre oportunidades de emprego com empresas concorrentes são consideradas atitudes aceitáveis no universo corporativo, desde que tudo isso seja feito com ética e transparência. Existe, porém, uma armadilha para quem leva adiante uma negociação e decide trocar de emprego: a contraproposta. Segundo estimativa da consultoria americana Robert Half, baseada em informações de seu banco de dados, cerca de 85% dos profissionais que iriam se desligar da empresa e aceitaram a contraproposta para não migrar para outra companhia acabaram saindo do mesmo jeito em cerca seis meses, seja por demissão ou por vontade própria.

 

O diretor da Robert Half no Brasil, Fernando Mantovani, afirma que, antes de tudo, o profissional precisa refletir sobre quais são suas motivações para trocar de emprego. Se a insatisfação for estritamente financeira, convém procurar seus gestores e tentar um acordo antes de anunciar qualquer atitude precipitada. Caso o problema não seja resolvido e a decisão de mudar de empresa seja realmente tomada, não é recomendável, em nenhuma hipótese, aceitar a contraproposta. Isso porque, ficar no mesmo cargo, apenas ganhando um pouco mais, não é um negócio vantajoso. "A pessoa já sinalizou o desejo de sair, a confiança com os empregadores foi quebrada. Além disso, poderá haver preconceito dos colegas de trabalho que exercem a mesma função, e continuam ganhando a mesma coisa", afirma Mantovani. "Quando a empresa precisar fazer cortes, esse profissional será um dos primeiros da lista", completa. 

 

Para Mantovani, aceitar a contraproposta será um erro ainda maior caso o desejo de mudar de companhia envolva outras fatores além da remuneração como relacionamento interno, ambiente corporativo, qualidade de vida e oportunidade de desenvolvimento. "Depois de alguns meses, o aumento salarial deixará de ser novidade e o profissional se dá conta de que todos os outros problemas continuam existindo." A contraproposta, é bom lembrar, só aparece no fim do processo de transição de emprego, quando o funcionário comunica sua saída da companhia. Isso significa, portanto, que essa pessoa já se comprometeu com outra empresa e concordou com os termos que lhe foram oferecidos. Assim, se aceitar a contraproposta e permanecer na empresa onde estava, o profissional quebra a confiança também do empregador que havia feito a oferta, fechando portas no mercado. Para que isso não aconteça, é preciso pensar muito bem antes de tomar uma decisão, e ser firme o suficiente para mantê-la. Mantovani afirma que, com o aquecimento do mercado nos últimos anos e a tão falada falta de talentos, propostas e contrapropostas ocorrem com muita freqüência. "Além de perder o profissional, o empregador precisará achar outro para desempenhar a função. É normal, portanto, ele reagir com uma contraproposta mesmo sabendo que é uma solução imediatista. Afinal, ele precisa resolver o problema dele." 

 

A consultora na área de recrutamento e seleção de executivos da Across, Sandra Sanches, afirma que, se a empresa deseja de fato reter o funcionário, o ideal é que ela pense em uma alternativa para oferecer desenvolvimento e não apenas aumente sua remuneração. O profissional, por sua vez, deve ficar atento em relação ao que lhe for proposto. "Se é uma oportunidade que já existia na empresa, por que não foi oferecida antes?", questiona. "A contraproposta só tem alguma validade se a partir dela for criado um plano para reter e desenvolver esse profissional. E mesmo assim, com ressalvas", explica. Ela dá o exemplo de uma cliente da área de gestão que recebeu uma proposta que julgou excelente e decidiu aceitar. Ao mesmo tempo, sua empresa estava passando por uma fusão e modificando sua estrutura. A contraproposta veio com a oferta de um cargo mais estratégico, em uma área que não existia antes na companhia. "Não foi questão de salário, mas de um novo desafio e o desenvolvimento da carreira. Ela ficou na empresa, mas atuando de forma totalmente diferente", conta. 

 

O gerente de marketing para a América Latina da Agfa, Eduardo Silva Ferreira Sousa, conhece bem as tentações e as conseqüências das contrapropostas. Após atuar por cinco anos na mesma empresa, Sousa aceitou uma oferta de trabalho, mas acabou ficando onde já estava. "Eu gostava do lugar onde trabalhava, apenas estava desmotivado com a questão do salário. A proposta que tive para mudar de emprego não atendia minhas expectativas por completo, mas decidi dizer sim por conta da remuneração", conta. Com o aumento oferecido na contraproposta, porém, ele cedeu e permaneceu no mesmo cargo. 

 

Mas Sousa não contrariou a estatística da Robert Half. Apenas dois meses depois de aceitar a contraproposta, ele deixou a empresa. Apesar de perceber uma mudança de clima e de tratamento em relação a ele, até com mais cobrança por parte de seus superiores, foi uma segunda proposta que fez Sousa deixar de vez a companhia. "Quando recebi o convite da Agfa, decidi que era hora de mudar mesmo. Estava decidido a ir para lá e nada iria me segurar mais", garante. Ele reconhece que poderia ter agido diferente, pleiteando um aumento salarial antes de discutir ofertas com outras empresas e que esse tipo de situação traz desgaste para todas as partes. "Na empresa onde estava não foi uma saída amigável. Também tive que me explicar para as pessoas que me procuraram e já estavam contando comigo, quando fiquei. Felizmente, consegui contornar a situação e hoje somos até parceiros em alguns projetos", afirma. 

 

Mantovani ressalta que quando o profissional decide sair da empresa, não deveria haver nada que o fizesse mudar de opinião. Segundo ele, o pedido de desligamento correto é aquele em que o colaborador embasa os motivos de sua saída e agradece a oportunidade que teve naquela empresa. Feito isso, nem se deve dar margem para que seja feita uma contraproposta. "Em um cenário ideal, o empregador deve lamentar a saída do funcionário, agradecer os serviços prestados e desejar boa sorte. Todo o resto a partir daí será apelo sentimental ou mercantilista." 

 

Veículo: Valor Econômico


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