Famílias ricas sustentam consumo nos EUA

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Impostos em alta. Salários em baixa. Preços da gasolina subindo. Restituição dos impostos adiada. Ainda assim, os consumidores americanos até agora parecem não ter se abalado.

Por trás desse aparente paradoxo, está um setor de consumo cada vez mais dividido em dois: o das famílias mais ricas, que estão gastando mais, encorajadas pelo aumento do valor dos imóveis e pela alta no mercado de ações; e o das mais pobres, que, atingidas pela alta dos impostos e dos preços, estão economizando.

"As pessoas que estão na metade superior da distribuição de renda estão bem. Elas estão gastando o suficiente para manter a economia respirando", disse Mark Zandi, economista-chefe da Moody's Analytics. "Mas a metade inferior vem tendo que apertar o cinto."

A boa notícia para a economia é que as famílias ricas dão um impulso desproporcional ao consumo. As que estão entre as 20% com maior renda respondem por cerca de 38% de todos os gastos, segundo dados do Departamento do Trabalho dos Estados Unidos, quase tanto quanto as incluídas nos primeiros 60% da escala de renda.

Até agora, os escalões superiores têm sido capazes de suportar a carga. Os gastos dos consumidores nos EUA aumentaram a uma taxa dessazonalizada de 0,2% em janeiro em relação a dezembro, informou na sexta-feira o Departamento de Comércio. A confiança do consumidor subiu em fevereiro para o seu mais alto nível desde novembro, segundo a Universidade de Michigan, crescimento que foi empurrado pelas famílias mais ricas.

Há motivos para duvidar que essa tendência continue. O crescimento econômico estava estagnado ao fim de 2012 - a produção do quarto trimestre cresceu a uma taxa anualizada de apenas 0,1%, divulgou na semana passada o Departamento de Comércio - e a maioria dos economistas acredita que permaneceu baixo no início de 2013. Qualquer ímpeto pode ser ameaçado pelo chamado "sequestro", o corte automático de gastos do governo que entrou em vigor na sexta-feira.

Os consumidores de baixa renda estão particularmente sob pressão. O ano começou com o fim da redução de impostos na folha de pagamento, o que atingiu praticamente todos os trabalhadores, mas teve maior impacto sobre os das faixas média e baixa. O golpe do imposto foi rapidamente seguido por um salto nos preços da gasolina - que aumentou cerca de US$ 0,13 o litro neste ano até agora -, que também atingiu com força os que ganham pouco. Enquanto isso, o Internal Revenue Service, agência equivalente à Receita Federal, tem atrasado a restituição de alguns impostos, o que pode gerar cortes de despesas entre os que dependem desse dinheiro para fechar as contas ou para fazer compras de maior vulto, como a de um carro novo ou de eletrodomésticos.

Os varejistas que atendem aos consumidores americanos de baixa e média renda já estão sentindo os efeitos. No mês passado, tanto a Wal-Mart Stores Inc. quanto a Target Corp. alertaram sobre o início vagaroso de 2013, citando a alta da gasolina e do imposto na folha de pagamento entre as maiores preocupações. Outras empresas sofreram impactos semelhantes.

"Sobrecarregados e preocupados; é assim que caracterizamos o consumidor agora", disse a investidores Bob Sasser, diretor-presidente da varejista de preço baixo Dollar Tree Inc., durante uma teleconferência na semana passada.

As vendas mais fracas dos varejistas voltados para a baixa renda são inevitáveis, disse Ian Shepherdson, economista-chefe da Pantheon Macroeconomic Advisors, que classificou o fim da redução do imposto da folha de pagamento como "uma flecha apontada diretamente para o coração da base de clientes deles".

O golpe econômico irá reverberar nos próximos meses, alertou Shepherdson. "Quando o consumidor dos EUA sofre um choque de fluxo de caixa, normalmente há um atraso de dois a cinco meses para que isso chegue aos gastos", disse ele.

As famílias de renda mais alta têm seus próprios desafios, especialmente o fim dos cortes de impostos para os americanos mais ricos feitos no governo do ex-presidente George W. Bush. Mas outros fatores estão conspirando a favor delas. Famílias mais prósperas tendem a ter imóveis e ações e então a se beneficiar desproporcionalmente da recente recuperação dos preços do setor imobiliário e do mercado de ações. E muitas delas receberam um estímulo extra no fim de 2012, quando as empresas pagaram dividendos especiais para evitar pagar mais impostos.

Steve Sadove, diretor-presidente da rede de varejo de luxo Saks Inc., disse a investidores na semana passada que espera crescimento nas vendas entre 3% e 5% em 2013, apesar do que chamou de "ligeiro mal-estar"com relação ao aumento de impostos.

Mesmo os mais ricos, porém, obtêm a maior parte da sua renda por meio do trabalho. Isso significa que, no longo prazo, o que importa mais para o gasto dos consumidores é o emprego. O mercado de trabalho tem estado no limbo recentemente, com a taxa de desemprego emperrada em pouco menos de 8%. Os próximos dados do Ministério do Trabalho, que serão divulgados na sexta-feira, ajudarão a indicar se os americanos de classe média irão seguir seus compatriotas mais ricos a caminho do shopping, ou se a resistência que têm demonstrado desaparecerá no posto de gasolina.




Veículo: Valor Econômico


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