Café industrializado é meta para exportação

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Elevar as exportações de café industrializado. Esta é a meta da Café Canecão e também da Associação Brasileira das Indústrias de Café (Abic), diz o diretor da empresa, e também da Abic, Natal Martins. Segundo o executivo, o Brasil já é o maior exportador mundial da commodity e agora tem de buscar elevar os embarques do café industrializado, que somam apenas US$ 35 milhões, contra US$ 5 bilhões do in natura.

 

Leia abaixo alguns trechos da entrevista que será exibida hoje no programa "Panorama do Brasil", exibido pela TVB e comandado por Roberto Müller, com Ana Paula Quintela, editora de Agronegócios do DCI, e Milton Paes, da rádio Nova Brasil FM.

 

Roberto Müller: Você faz todas as variedades de café dentro dessa gama? Você já faz pó de café, café em grão e café em sachê?

Natal Martins: Sim. O Café Canecão é uma indústria que já tem 46 anos. Eu digo que para trabalhar com café você precisa ter conhecimento, vocação, e ser dedicado ao segmento. O Café Canecão atingiu uma maturidade, é uma empresa que já possui certificação ISO 9000: vamos completar dez anos de certificação.

 

Roberto Müller: Vocês foram um dos primeiros a conseguir a certificação no Brasil?

Natal Martins: Nós fomos um dos primeiros a conseguir no Brasil e, na versão 2000 da norma, fomos os primeiros. A norma atualiza de tempos em tempos, e espero que na versão 2008 também o sejamos, pois no próximo ano temos de fazer a atualização. Mas nós trabalhamos com todas as linhas de café. O Café Canecão Tradicional, que é o grande carro-chefe da nossa indústria. Eu costumo brincar com nossos clientes e nossos consumidores que lá em Campinas (SP) e na região é nosso carro-chefe porque é moeda corrente. O comerciante quer comprar e faz questão de ter nas suas gôndolas, tanto que nós estamos presentes na totalidade dos pontos-de-venda na nossa área de atuação. Nós temos também o Café Canecão Extra Forte, que é uma variação do nosso café tradicional. Temos o Café Canecão Tipo Exportação, ele atende ao mercado interno.

 

Roberto Müller: Você exporta com a marca Canecão?

Natal Martins: É mais para atender o mercado interno. Quando eu exporto com a marca Canecão, eu dou preferência ao tipo de exportação que atende mais os mercados internacionais. Temos também o Café Canecão Expresso, para atender cafeterias, restaurantes e até alguns consumidores finais, que têm as suas máquinas em casa. É um excelente produto. Ele é certificado pelo programa de qualidade da Abic [a associação das indústrias de café] na categoria gourmet. Eu tenho também o sachê. O Brasil está se iniciando nesse segmento, então não se justifica hoje as indústrias comprarem equipamento para fazer sachê na sua própria fábrica. Hoje nós fazemos isso em parceria com empresas embaladoras externas. Nós mandamos o nosso produto industrializado, já torrado, e recebemos de volta, com a nossa marca, o produto já embalado em sachê. Estamos procurando, também, com esse produto, atingir o consumidor final porque hoje as máquinas domésticas de sachê já estão bem difundidas. Hoje há muitas opções de máquinas baratas vindas da China e de alguns países da Europa.

 

Ana Paula Quintela: Vocês pretendem ampliar essas linhas, como outras empresas que produzem café fazem? Além do filtro há outros tipos de acessórios, como porta-filtro? Vão investir nessa área de serviço para o consumidor?

Natal Martins: Pretendemos, sim, mas esse é um trabalho que tem de ser feito com um certo cuidado, porque não podemos perder o foco do nosso negócio principal, que é a industrialização de cafés. Temos estudado muito. Tínhamos um produto para lançar ano que vem, mas resolvemos adiar, o achocolatado. Fizemos isso porque achamos que já há muitas marcas no mercado, marcas de boa penetração, e, pela pesquisa que fizemos, interna com nossos clientes, eles acharam que não era o momento de lançar um produto desses. Eu nunca acreditei que a indústria pudesse trabalhar, por exemplo, com locação ou comodato de máquinas para café espresso ou para sachê, e eu estou mudando de idéia. No ano que vem, temos de ter uma interação melhor com o consumidor final e, trabalhando com máquinas e equipamentos, eu posso desenvolver melhor os meus negócios, principalmente os de cafés de maior valor agregado e de maior qualidade, que são os cafés premium especiais.

 

Milton Paes: Este ano de 2008 foi positivo para a Café Canecão. Inaugurou a nova planta industrial, a nova sede e enviou alguns representantes para o continente africano para avaliar a abertura de novos mercados. Agora estamos nesta crise. Gostaria que você fizesse uma avaliação a este respeito.

Natal Martins: Nós tivemos muita coragem. Nós fizemos um grande investimento. Compramos um grande imóvel, fizemos uma excelente reforma e fizemos uma fábrica que muito poucas indústrias de café do nosso porte têm.

 

Roberto Müller: Equipamento nacional?

Natal Martins: Hoje nós temos sorte. Como o Brasil é um grande consumidor de café e a indústria aqui é muito grande, hoje nós só perdemos para os Estados Unidos em volume, mas caminhamos a passos largos para passar os EUA. Nosso consumo interno vai passar dos 18 milhões de sacas, contra menos de 21 milhões dos EUA. Mas o nosso mercado cresce mais de 5% ao ano e os EUA estão estagnados. Nos próximos cinco ou seis anos nós os devemos passar.

 

Roberto Müller: Então as pessoas no Brasil estão bebendo mais café, finalmente?

Natal Martins: Sim. Nós partimos de 8 milhões de sacas em 1990 para 18 milhões este ano. A Abic tem um papel fundamental nesse aumento de consumo, com a criação do Selo de Pureza. O Café Canecão foi uma das primeiras empresas a estar no programa do Selo de Pureza, e uma das primeiras no Programa de Qualidade. Nós acreditamos que o mercado brasileiro é bom, que a indústria precisa passar por transformações. Nossa fábrica era realmente muito modesta e não estava mais atendendo as nossas necessidades em volume e qualidade e controle, e tivemos de partir para esse investimento de coragem, que valeu a pena, porque se essa decisão tivesse de ser tomada hoje, com certeza seria protelada. Hoje nós estamos com a fábrica pronta. Só que a indústria do café já passou por muitas crises, e eu vou dizer, com certeza, muito piores do que esta que nós estamos enfrentando hoje. No passado, o café no Brasil, antes de 1990, era um produto tabelado, e o tabelamento é uma regulamentação do governo que não ajuda um segmento como o de café. Vocês imaginem em uma indústria automobilística o preço ser tabelado pelo carro popular. A indústria só vai construir carro popular. Ela não vai ter condições de construir carros de luxo. É o que aconteceu com o café no Brasil antes de 1990. Com o tabelamento, a indústria tinha de fazer o padrão. É por isso que aqui, até hoje, alguns consumidores descarregam esse sentimento do passado, de que café é tudo igual. Nós temos esse sentimento. Depois, com a desregulamentação, quando a tabela caiu, tivemos condições de investir em maior qualidade e em outros produtos. Aí então o mercado pôde evoluir. O mercado cresceu e nós tivemos condições de fazer os investimentos em tudo o que foi preciso. Hoje estamos na nossa fábrica renovada. As crises que nós enfrentamos no passado nos dão hoje o preparo para enfrentarmos outras crises. Eu sou muito otimista em relação a tudo o que está acontecendo. Eu acredito que essa crise deva ser menos longa do que todos nós pensamos que vá ser. Temos de pensar de modo positivo, continuar com os nossos negócios.

 

Roberto Müller: Eu soube que a Abic faz uma pesquisa anual sobre o consumo de café no Brasil. Quando eu era pequeno, e já faz bastante tempo, eu costumava ouvir que o Brasil é o país do café, e depois eu comecei a tomar café importado. Agora, parece que as coisas mudaram. O brasileiro realmente bebe café?

Natal Martins: O brasileiro bebe muito café. Nós somos hoje o maior produtor mundial de café, o maior exportador mundial, muito longe do segundo colocado, que é a Colômbia.

 

Roberto Müller: Você está falando do café in natura?

Natal Martins: Sim, do café in natura. O Brasil é tradicionalmente exportador de café in natura. O trabalho de café industrializado nós estamos começando agora. O Brasil exporta o in natura na ordem de US$ 4 bilhões a US$ 5 bilhões por ano. A exportação de café industrializado este ano deve fechar em US$ 35 milhões. Quer dizer, de US$ 5 bilhões para US$ 35 milhões, temos um longo caminho a percorrer ainda. A associação tem feito um trabalho muito grande nesse aspecto, que é um programa setorial integrado junto com a Apex [Agência de Promoção às Exportações], para exportação. A Abic é uma entidade que tem 35 anos de existência. Em 1989, a Abic deu um salto para os seus associados, que é muito grande, hoje são mais de mil as indústrias de café no Brasil e 400 são associadas à Abic, mas o volume representa 90% do café industrializado no País. Em 1989, ela criou o programa de Selo de Pureza, de que nós tivemos muita propaganda naquela época, pois tínhamos recursos maiores para o marketing e direcionamos esses recursos para a associação fazer essa grande campanha. Em 1990, o consumo de café no Brasil era de 8 milhões de sacas. Este ano, nós vamos fechar o consumo em mais de 18 milhões de sacas.

 

Roberto Müller: Quantos por cento da população tomam café hoje?

Natal Martins: Aquela pesquisa à qual você se referiu, a Abic vem fazendo há seis anos. No primeiro ano, tínhamos que 92% da população acima de 15 anos informaram tomar café regularmente. Neste ano, tivemos que 97% da população acima de 15 anos consomem café regularmente. Somos quase uma unanimidade. Nós temos de quebrar alguns paradigmas, ainda, porque muitas pessoas relacionam café com saúde. Mas isso é um tabu do passado. Hoje, há muitas pesquisas, aliás, se alguém tiver curiosidade a respeito, pode entrar no site www.cafeesaude.com.br, e lá vai encontrar a relação do café com diversos fatores: café e criança, café e gestante, café e atleta. O café hoje é considerado uma bebida que ajuda a prevenir diversas doenças. Não queremos caracterizar o café como remédio. É um alimento funcional, que, assim como muitos outros, como o azeite e o chocolate, desde que consumidos em doses moderadas, tem as suas atribuições. O café hoje, desde que consumido em doses moderadas, traz benefícios para a saúde.

 

Roberto Müller: Não é o meu caso. Eu não consumo moderadamente. Eu tomo muito café, e deve fazer bem, porque eu me sinto muito bem.

Natal Martins: Cada um tem a sua tolerância. Algumas pessoas toleram mais, outras toleram menos. Nós não aconselhamos que se tome café em excesso, como aconteceu com uma garota, que trabalhava em uma cafeteria na Inglaterra e que tomou, em um espaço de 15 minutos, 25 cafés espresso para saber o efeito que teria - e ela passou mal. Agora, logicamente, se a pessoa tem tolerância e pode tomar mais xícaras do que o indicado, fique à vontade. Será um prazer tê-lo como consumidor.

 

Milton Paes: Você falou agora sobre os benefícios do café e me chamou a atenção para um programa da Abic de levar o café para a merenda escolar, para as crianças. Eu gostaria que você falasse sobre isso, porque parece que foi feita uma pesquisa que diz que o café é um alimento importante, principalmente na idade escolar. Eu queria que você detalhasse esse projeto.

Natal Martins: Nós trabalhamos junto com o Dr. Darcy Roberto Lima, que é um pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro que defende principalmente o café com leite como a principal bebida para crianças e adolescentes. E ele insistiu muito em que a Abic fizesse um trabalho de levar o café para a merenda escolar. A Abic desenvolveu o programa, e o Café Canecão participa dele, porque acreditamos na Abic e em suas orientações. Nós resolvemos adotar uma escola em Campinas, como muitos outros colegas industriais pelo Brasil adotaram escolas. A nossa escola atende quase 700 alunos com o Café na Merenda. É um sucesso total. Esse é um trabalho que a Abic vem fazendo junto com as indústrias associadas e vai haver todo um acompanhamento de desempenho intelectual dessas crianças durante esse tempo. O Dr. Darcy, quando começou, pesquisava escolares. Ele selecionou um grupo de crianças que tomava café, e um grupo que não tomava. Ele chegou à conclusão, no seu trabalho científico, de que o grupo que consumia café regularmente tinha um desempenho escolar melhor do que o do outro grupo. Hoje nós não precisamos mais tomar café importado, nós podemos tomar o café brasileiro. Porque a Abic, depois do Selo de Pureza, veio com o Programa de Qualidade. Hoje podemos procurar cafés brasileiros com qualidade superior, os cafés gourmet.

 

Ana Paula Quintela: O perfil do consumidor também mudou? Ele está mais exigente em relação a essa qualidade?

Natal Martins: Nós acreditamos que o nosso sucesso de aumento de consumo aconteceu pela melhoria de qualidade, pois são fatores diretamente relacionados. O consumidor foge de produtos ruins. O Brasil consumia 4,7 quilos de café ao ano por habitante na década de 60. Nos anos 80, chegou a quase 2, menos da metade. Com a melhoria da qualidade, já estamos em 4,5 quilos. O aumento do poder aquisitivo também eleva o consumo da população.

 

Roberto Müller: Você esteve em feiras na África para exportar seu café. O nome Canecão é bom para o Brasil. Lá fora seria difícil pronunciar. Como você vai fazer? Mudar a marca para exportar?

Natal Martins: Nós vamos ser obrigados a mudar. Café Canecão em outras línguas não significa muita coisa. Em Portugal, pode ser, pois com esse país já temos negócios bem avançados. Mas estamos desenvolvendo outra marca. Temos participado de feiras em várias partes do mundo. Esse é um trabalho de longo prazo. Você não consegue num primeiro contato, numa feira, fechar um negócio. Você tem de adaptar a bebida para aquele país. Nós também temos um projeto de fazer marcas próprias para supermercados. Aí não precisa ser a marca Canecão. O mercado é grande. Nós precisamos é quebrar uma barreira cultural, que existe há mais de 280 anos, de que o Brasil exporta matéria-prima. Nós temos competência para exportar o café industrializado. Estamos lutando para mostrar que somos capazes disso e nós vamos chegar lá.

 

Veículo: DCI


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