"Capital do tomate" vê produção cair pela metade

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Depois de plantar tomate por mais de 15 anos em Goianápolis, cidade no interior de Goiás conhecida como a capital do tomate, Adair Balduino Ribeiro se deparou com preços muito acima da média para a caixa do produto neste início de ano. O movimento de alta começou no fim de 2012 e atingiu seu ápice na Semana Santa. Balduino chegou a receber até R$ 100 pela caixa de 22 quilos de tomate de mesa, enquanto a média para o mesmo período é de R$ 35.

Neste início de ano, período conhecido como "época das águas", a produtividade é menor e os custos mais elevados, o que normalmente diminui a oferta e pressiona os preços do fruto.

Embora felizes com os preços, os produtores não tiveram motivo para comemorar a produtividade de seus pomares. O excesso de chuvas e pragas afetou seriamente a colheita. A produtividade dos tomates que estão sendo colhidos por Balduino é de 250 caixas por mil pés. Em safras anteriores, esse rendimento foi de 350 a 400 caixas por mil pés. "Mesmo com o preço lá em cima, perdi muito por causa da broca e da mosca branca", explicou.

Com a queda da produtividade, os preços dispararam e alçaram o tomate à condição de vilão número 1 da inflação no Brasil. Contudo, esse movimento está arrefecendo. Levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) mostra que os preços do tomate na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) recuaram 48,50% no atacado e 46,17% ao produtor nas duas últimas semanas. A caixa que chegou a ser negociada a R$ 108,75 ao consumidor (ou R$ 85,47 ao produtor) já é vendida a R$ 56,00 (ou R$ 46 ao produtor).

Sérgio Pereira Lima plantou 60 mil pés de tomate e perdeu completamente sua produção devido ao excesso de chuvas, broca e mosca branca. Tentando aproveitar a alta dos preços, imediatamente começou o plantio em outra área para tentar aproveitar a fase. A colheita na Fazenda Santa Rita começa em junho e vai até setembro.

O ciclo do tomate é curto. Os produtores compram as mudas com 30 dias de estufa e as plantam. Após cerca de 70 dias, elas dão os primeiros tomates. Depois da primeira colheita, as plantas aumentam a produção e continuam produzindo por 45 a 80 dias, dependendo da época. Depois disso, as plantas são retiradas e a área recebe uma outra cultura. A fim de eliminar as pragas do local, os produtores nunca plantam tomate duas vezes seguidas na mesma área.

A broca, principal causa de prejuízos na lavoura, está presente durante todo o ano, mas sua incidência cresce na época de chuvas. A praga que atende pelo nome científico de "Neoleucinotes Elegantalis" é de difícil controle devido ao seu hábito noturno. O inseto bota seus ovos durante a madrugada. Eles são depositados nos frutos ainda pequenos, em formação. Após a eclosão, que leva em torno de quatro a cinco dias, ocorre a penetração da larva no vegetal, o que faz apodrecer seu interior, apesar da boa aparência externa.

O atual período de chuvas já é considerado crítico no Estado de Goiás. Em 2011 e 2012, os prejuízos devido ao clima e as pragas foram grandes. Por esse motivo, diversos produtores abandonaram o plantio em detrimento da soja e milho. "É uma atividade muito difícil. Uma hora o preço está bom. Na outra, não paga nem os custos da produção. Não existe segurança para produzir", disse Balduino. O tomate não está incluído na Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) do governo (ver matéria abaixo).

De acordo com dados da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), a área cultivada com tomate em Goianápolis caiu mais que a metade em apenas três anos. Em 2010, a área ocupada com o fruto na região foi de 2,5 mil hectares. No ano passado, o cultivo se restringiu a 1,1 mil hectares.

Após a alta nos preços, produtores que haviam abandonado a cultura em 2012 voltaram a destinar uma área de suas propriedades para o tomate. Portanto, a expectativa é que, a partir de junho, o preço da caixa caia consideravelmente. Muito produtores começaram a plantar em fevereiro e março e esperam colher a partir de maio os primeiros tomates. A expectativa dos produtores é de que o preço da caixa de 23 quilos chegue a R$ 15.

Motivo de piada nas redes sociais e alvo da revolta de consumidores, o tomate é apontado como o grande vilão da inflação de alimentos, que chegou a 13,48% nos últimos 12 meses. Contudo, o vegetal não foi determinante para a alta do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA), já que o seu peso na cesta de consumo é pequeno. Os alimentos como um todo foram responsáveis por 60% da alta de 0,47% do IPCA em março, mas o tomate contribuiu com apenas 0,02% do resultado de março. No mês passado, o vegetal teve um peso de 0,33% do orçamento da família brasileira.

Excluindo o grupo alimentos, o IPCA foi de 0,25% no mês e 4,5% no acumulado dos últimos 12 meses. O índice acumulado em um ano alcançou 6,59%, acima do teto da meta de inflação. A alta no preço do tomate nos 12 meses encerrados em março foi de 122%.


Referência no cultivo, Goianápolis dá lugar à soja

Goianápolis, cidade a 48 quilômetros de Goiânia, bem que poderia se chamar "Tomatolândia". Andar pela cidade é se sentir em um mundo feito de tomate. Muros vermelhos e referência ao fruto estão espalhados por toda a cidade, nos prédios e comércios. Quem entra na cidade logo se depara com uma pequena indústria de extrato de tomate ou com o supermercado "Tomatão".

Todas essas homenagens mostram a ligação dos goianapolinos com o tomate. Contudo, as pequenas ruas de paralelepípedos e casas pequenas ao redor da principal avenida da cidade escondem um movimento que parece não ter volta. A cidade está sendo tomada pela soja.

Berço do cantor sertanejo Leonardo, que chegou a trabalhar no cultivo do vegetal, a cidade perdeu o posto de maior produtor de Goiás para Cristalina. Apenas nos últimos três anos, o município perdeu mais da metade de sua área cultivada com o tomate. A colheita, que em 2005 passou de 6 mil toneladas, caiu a apenas 3,6 mil toneladas no ano passado, de acordo com os dados do IBGE.

Enquanto o tomate debandou-se, a produção de soja explodiu na região. Em 2005, Goianápolis produziu apenas 630 toneladas da commodity. Seis anos mais tarde, a produção havia praticamente quintuplicado. Os dados de 2012 da cidade ainda não foram disponíveis.

O movimento de abandono do tomate por outras culturas é creditado, pelos próprios produtores, às dificuldades em seguir na atividade. "Além do clima, a mão de obra é um fator limitante. Para se trabalhar com tomate é preciso conhecer a cultura, e grande parte das pessoas que sabe trabalhar migrou para outras regiões", disse Balduino.

Atualmente, é possível encontrar no município plantações de milho, soja, eucalipto e morango. Goianápolis, que um dia se orgulhou de ser um grande produtor, hoje é um ponto pequeno no mapa da produção brasileira de tomates.



Veículo: Valor Econômico


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