Já atingidas por uma queda no ano passado, as exportações do Brasil para a Argentina retrocederam ainda mais no primeiro trimestre deste ano. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), as vendas ao país vizinho no primeiro trimestre recuaram 10,5%, em comparação com os três primeiros meses do ano passado.
A queda brasileira ocorreu em um momento em que a Argentina afrouxou o controle férreo que implantou sobre as importações desde fevereiro do ano passado, quando passou a exigir as Declarações Juradas de Antecipação de Importações (DJAI), que na prática equivalem a submeter todas as importações a um regime de autorização caso a caso pelo governo.
As importações argentinas de forma geral aumentaram 5% neste trimestre, atingindo US$ 16 bilhões. Em parte, o resultado se explica pelo déficit energético do país, que aumentou as importações de óleo diesel de US$ 1,3 bilhão para US$ 2 bilhões. Mas as importações também cresceram em bens de consumo e capital.
"Quem se aproveitou dessa brecha foi a China, que concorre com o Brasil em vários setores com custos mais competitivos", disse o economista Dante Sica, dono da consultoria Abeceb, a principal de comércio exterior da Argentina. Segundo estudo da consultoria argentina IES, especializada em comércio exterior, o superávit da China com a Argentina triplicou neste trimestre, em relação ao início de 2012, passando de US$ 560 milhões para US$ 1,5 bilhão.
Pelo dados do Mdic, enquanto o Brasil exportou menos, as importações provenientes da Argentina reagiram e cresceram 16%, atingindo US$ 4,2 bilhões. Depois de um superávit que chegou a US$ 5,7 bilhões com a Argentina no ano de 2011, o Brasil teve déficit no primeiro trimestre, de US$ 82 milhões, de acordo com o Mdic. O comércio bilateral e o mau ambiente para empresas brasileiras instaladas na Argentina estarão na pauta de discussão no encontro que começa amanhã entre as presidentes Dilma Rousseff e Cristina Kirchner no país vizinho.
O incremento nas importações brasileiras no primeiro trimestre se deu principalmente em veículos e autopeças, que somaram US$ 1,7 bilhão, e cereais, que chegaram a US$ 571 milhões e viraram o segundo maior item da demanda brasileira da Argentina. "É um produto direto da substituição das importações que o setor automotivo brasileiro fazia do México, limitadas agora por uma política de cotas", comentou o economista Alejandro Ovando, da consultoria IES.
No lado das exportações brasileiras, cinco dos sete setores com maior volume de compra pela Argentina
registraram queda em relação ao primeiro trimestre de 2012, incluindo veículos e autopeças e aparelhos mecânicos e eletrônicos. Esses setores são os que rendem mais divisas à balança comercial.
O alívio nas importações argentinas, de toda forma, deverá ter fôlego curto. Para José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), as perspectivas pioraram para as exportações totais do vizinho neste ano. Os preços do trigo, segundo produto de maior peso na pauta exportadora argentina, estão em um nível baixo neste ano. A soja, principal produto, tem a previsão de uma queda de valor a partir do segundo semestre. As reservas internacionais estão em queda e o atraso cambial em relação à inflação desestimula os exportadores. "Os controles devem retomar a tendência de se tornarem cada vez mais apertados à medida em que o ano avance", disse Sica.
Segundo estudo feito com empresários brasileiros pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o fim das licenças não automáticas de importação foi anulado pelas dificuldades criadas pelas DJAI, hoje "o principal mecanismo argentino de controle das importações", segundo o estudo. A federação registrou atrasos na aprovação da declaração nos setores de autopeças, têxteis, alimentos, cerâmicas, tintas e químicos. Alguns produtos estão há mais de 400 dias sem conseguir entrar em solo argentino.
O mesmo estudo também constatou que a perda de espaço brasileiro foi preenchido em parte por produtos chineses.
No ano passado, as importações totais da Argentina diminuíram 7,3%. No mesmo período, as importações de produtos brasileiros caíram 17,8%, enquanto as de produtos chineses tiveram queda 5,9%. Por setores, o Brasil teve contração no nível de exportação em 14 setores. Em dez deles a Argentina aumentou a importação de concorrentes produzidos na China, segundo a Fiesp.
Castro afirma que a China vem ganhando terreno também por uma razão financeira. "Há uma linha de US$ 10 bilhões de empréstimo que a China colocou à disposição do país, que não pode captar dinheiro no mercado financeiro internacional", disse.
O encolhimento do comércio bilateral também é reflexo do resultado de empresas brasileiras instaladas em solo argentino. Segundo Castro, elas estão reduzindo o nível de atividade por não conseguirem enviar remessas ao Brasil e por encontrarem dificuldades em pagar empréstimos, já que está em vigor a regra do "um por um", que prevê que para cada dólar que saia do país um deva entrar. "Com isso, essas empresas estão comprando menos insumos e partes e peças do Brasil, que ajudam na produção final", diz.
Veículo: Valor Econômico