A ampliação da classe média pelo poderio da classe C já é fato consumado. Agora o mercado deve se preparar também para a inserção social das classes D e E, a nova fronteira emergente, cuja migração para a classe média deve movimentar a próxima onda de consumo - o que coloca um quadro marcado pela diversidade de comportamentos, demandas e necessidades que desafia as empresas.
A Netpoints e a Beleza Natural são exemplos de aproveitamento desse novo poder de consumo. O primeiro é um programa de fidelidade multiparceiros que oferece pontos que não expiram, resgates facilitados, prêmios para o dia a dia e soma de pontos na família. "Créditos para celulares já foram o principal objeto de resgate", conta o presidente Carlos Formigari. "Hoje são entradas de cinema". A segunda empresa é uma rede de salões de beleza especializada em cabelos crespos e ondulados. Nascida em 1993 com foco na classe C, hoje tem 13 unidades em três Estados, além da fábrica própria Cor Brasil de produtos para cabelos - o carro-chefe do instituto é o Super-Relaxante, desenvolvido pelos sócios - e 1,7 mil colaboradores.
A comunicação diferenciada para as clientes da comunidade onde a empresa atua é uma das chaves do sucesso, explica a sócia-fundadora e CEO Leila Velez. "Até o funk é uma ferramenta para ensinar as clientes a tratar do cabelo".
Segundo a antropóloga Luciana Aguiar, da consultoria Plano CDE, o entendimento do processo de inclusão desse novo consumidor permite tomá-lo como fonte de inspiração para ampliar os negócios. Como o Brasil ainda é um país paradoxal, a diversidade de consumidores coloca frente a frente uma classe alta de padrão de consumo desenvolvido e uma enorme camada emergente que surgiu do crescimento da renda, passou a consumir mais e agora passa a exigir diferenciação. "É preciso olhar para este segmento não apenas com um investimento a longo prazo, mas com ações que possam gerar valor compartilhado", diz.
Luciana lembra que a classe média é composta por 93 milhoes de brasileiros com poder de consumo diverso e muita mobilidade social, dos quais uma parcela significativa - 18 milhões - ascendeu da classe baixa. "O Brasil ainda tem 57 milhões de pessoas pobres, a maioria no Nordeste. É uma população que não pode ser desconsiderada e tende a mudar na medida do aumento da renda", observa. Ela aponta ainda que, além das classes econômicas, o acesso aos diferentes consumidores passa também pelo entendimento de comportamento da pirâmide etária, da escolaridade e do regionalismo da população.
Nas classes mais baixas, o número de crianças de zero a 14 anos é muito maior do que nas demais, enquanto na classe média emergente há mais pessoas nas faixas de população economicamente ativa, dos 18 aos 55 anos, e a classe mais alta é formada por pessoas maduras, comparando-se bastante à composição social de países europeus. Por isso, recomenda, dependendo do target, o varejista deve criar uma nova visão.
Pesquisa realizada pela consultoria apontou os diferentes drivers de consumo que também devem ser levados em conta na definição de estratégias. Enquanto para a classe alta o principal impulso é a personalização, a classe média busca a diferenciação e a mais baixa, ascensão e oportunidade. "A classe média emergente busca acesso ao conforto e um relacionamento com o varejo que a diferencie do resto, algo que a ajude a construir status", explica Luciana.
De acordo com ela, a classe C "é a que mais se incomoda com lojas cheias. Isso significa que está em busca de exclusividade", destaca. A classe D, por sua vez, busca acesso a oportunidades e serviços, além de mais informação, enquanto a classe E busca a inclusão e a manutenção do básico, principalmente no varejo de alimentos. Nas classes mais baixas, o maior anseio é o negócio próprio, na busca de acesso à inclusão, qualificação profissional e instrumentos financeiros de crédito para consumo e empreendimento.
Veículo: Valor Econômico