Os usuários dos portos se dividem sobre a tramitação da MP dos Portos. Tanto o agronegócio como a indústria clamam por aumento de capacidade para escoar as cargas, mas alguns usuários são reticentes se, tal como o texto passou na Câmara e no Senado, haverá de fato aumento da competição e redução de custo no curto prazo. O cerne da questão é o imbróglio em torno da competição desigual entre os terminais de contêineres públicos e privados, que a MP não conseguiu pacificar.
José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), diz que ainda não consegue enxergar se o resultado da tramitação da MP será, na prática, o intencionado pelo governo. "A intenção é boa, mas queremos saber se os princípios serão iguais aos fins."
As empresas produtoras e exportadoras de produtos agrícolas acreditam que a MP vai estimular investimentos, aumentar a competição e reduzir os custos do setor, que sofre com os gargalos no escoamento da produção. No agronegócio, como os volumes são maiores, qualquer redução de custo é "visível e viável", diz Castro.
"A medida atende ao interesse do exportador, que é mais estímulo à competição e independência em relação ao setor público", afirma Aurélio Pavinato, diretor-presidente da SLC Agrícola, companhia que exporta mais de 600 mil toneladas por entre soja, milho e algodão.
Para o presidente da Vanguarda Agro, Arlindo Moura, a aprovação da medida é imprescindível para reduzir os custos portuários. "Hoje, ao exportar grãos ou importar insumos, temos um custo de aproximadamente US$ 12 por tonelada apenas no porto. Isso é praticamente o dobro que se paga na Argentina e nos Estados Unidos", afirma.
A MP dos Portos é um assunto sensível para o agronegócio. Diante do esgotamento da capacidade de escoamento da produção agrícola pelos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR), empresas como as tradings Bunge e Cargill e a operadora logística Hidrovias do Brasil (empresa controlada pelo fundo P2 Brasil, dos grupos Pátria Investimentos e Promon) tentam desengavetar uma série de projetos para a construção de estações de transbordo, armazéns e terminais privados na Bacia Amazônica, com investimentos estimados em R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões. A expectativa é que o novo corredor seja capaz de escoar até 20 milhões de toneladas de grãos anuais até o fim da década.
Alguns especialistas entendem que se a MP for transformada em lei como saiu da Câmara os custos portuários irão aumentar no médio prazo e os investimentos nos terminais públicos serão esvaziados. Apesar de a MP facilitar a instalação de portos privados e, consequentemente, a competição, a construção de terminais do zero leva em média de cinco a sete anos. Até lá, os exportadores continuarão dependentes dos terminais em portos públicos, que terão de repassar ao exportador os gastos adicionais com mão de obra. A MP restringiu a liberdade de contratação de profissionais por esses terminais, determinando que as empresas requisitem os trabalhadores de terra (capatazia) usando a base do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo). No antigo marco, a capatazia podia ser contratada pelos terminais no mercado, via CLT. A estimativa é que haja alta média de 30% nos custos portuários.
"A MP restringe a liberdade do arrendatário de porto público e esse modelo passa a ser menos competitivo", diz Carlos Magano, sócio da Gomeatinga Consultoria e que foi executivo de terminais portuários de líquidos e de granel.
Com as facilidades introduzidas para autorização de terminais privados, alguns empresários vislumbram uma paralisia de investimento no porto público. Quem quiser empreender em porto daqui para frente preferirá fazê-lo em terminais privados. No limite, quem sairá perdendo é o usuário, que não terá acréscimo de capacidade nos portos atuais. "Será necessário fazer dos ativos de hoje o melhor uso o possível", diz José Cândido Senna, coordenador do comitê de usuários de portos e aeroportos de São Paulo, da Associação Comercial de São Paulo. A principal ação, diz, é o programa Porto 24 Horas, bandeira levantada pelos usuários há anos e só agora encampada pelo governo.
A sobrevida aos terminais pré-1993, que ganharam mais um período igual ao originalmente pactuado, tirou da berlinda pelo menos cinco terminais em Santos. Para um dos empresários, que pede reserva, estes contratos são os únicos que, efetivamente, conseguem realizar investimentos a partir do próximo semestre.
Veículo: Valor Econômico