Brasileiras desistem da Argentina

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Incertezas, inflação e dificuldade para enviar divisas para o Brasil motivaram as companhias a pisar no freio. Desinteresse em permanecer no país levou ALL a descumprir contrato

A cassação das concessões ferroviárias da América Latina Logística (ALL) na Argentina não foi uma surpresa para a companhia, que já esperava, desde 2011, o desfecho anunciado ontem pelo governo Cristina Kirchner. A incerteza jurídica e o ambiente econômico conturbado vêm provocando problemas para grandes empresas que operam no país, a maior parte com dificuldades para reduzir a exposição ou se desfazer de suas operações locais.

A ALL operava, desde 1999, oito mil quilômetros de linhas férreas na Argentina. Nos últimos anos, tentava se desfazer dos ativos. Em documento divulgado ao mercado em2011, admite que não vinha cumprindo com suas obrigações contratuais, conforme denunciado anteontem pelo ministro argentino dos transportes, Florencio Randazzo.

“As Concessionárias Argentinas (nome dado pela empresa às suas operações no país) não estão cumprindo certos aspectos relevantes de suas concessões, incluindo a obrigação de realizar os pagamentos mensais do valor da concessão (...), podendo resultar na imposição, pelo governo argentino, de penalidades sobre as Concessionárias Argentinas”, afirma o texto divulgado pela empresaem2011. O desânimo com a situação no país é reflexo do “cenário político e econômico”, segundo informou a companhia em nota oficial. “A Argentina tem adotado medidas extremas, muitas vezes não tão formais, que criam muitas dificuldades para atuação das empresas”, analisa Antônio Gambelini, advogado especializado em direito internacional do escritório Siqueira Castro.As restrições à compra de dólar e às importações e o tabelamento de preços são apontadas por analistas como medidas que prejudicam a atuação de empresas brasileiras.

A JBS Friboi, por exemplo mantém fechadas quatro de suas cinco unidades no país. No ano passado, conseguiu se desfazer de uma sexta unidade por US$ 16,5 milhões.Agora, espera compradores para os outros ativos. A ALL também tentou vender suas concessões, mas diante da deterioração do cenário econômico, não teve sucesso na busca por interessados. Para o banco Merril Lynch, a reestatização das ferrovias acaba sendo positiva para a companhia, que não tinha mais interesse no negócio.

A Petrobras também fracassou ao buscar compradores para ativos na Argentina, em operação prevista no plano de desinvestimento anunciado no ano passado. No final de maio, a empresa anunciou a suspensão do processo de venda de ativos no país, alegando que não recebeu propostas adequadas - segundo rumores, um dos interessados era o grupo Indalo, do empresário Cristóbal Lopes, ligado à família Kirchner.

Situação semelhante deve se repetir com a Vale, que desistiu de produzir potássio na mina Rio Colorado, alegando aumento de custos, em um incidente que provocou faíscas nas relações entre Brasil e Argentina. A desistência do foi anunciada em março e, segundo fontes, a companhia ainda tem esperança em encontrar um comprador, para recuperar pelo menos parte dos US$ 2 bilhões que já gastou no projeto.

A conjuntura argentina não tem prejudicado apenas grandes companhias. Segundo fontes do Itamaraty, são muitas as consultas de pequenas empresas com dificuldades para importar produtos ou repatriar recursos para o Brasil, por contadas restrições impostas pelo governo local no último ano.“No panorama atual, é necessária uma ação política do governo brasileiro, que pode ser mais eficaz para o investidor brasileiro do que ações em outros fóruns jurídicos”, diz Gambelini.

Governo não vai intervir em favor de empresas

O Itamaraty evitou comentar publicamente a situação das empresas argentinas, mas informações extra-oficiais apontam que o governo não vai atuar para melhorar as relações entre empresas brasileiras e o governo argentino. “São relações comerciais entre empresas privadas e um governo legalmente estabelecido”, afirmou uma fonte da diplomacia brasileira.

A estratégia vale também no sentido oposto: a ordem é evitar pressões para que as empresas mantenham investimentos no país, uma vez que as condições econômicas são cada vez mais desfavoráveis ao investimento. Até pouco tempo, havia forte pressão para que empresas brasileiras fizessem negócio no país vizinho, em uma política de fortalecimento das relações bilaterais.

“Embora o governo argentino precise do investimento e, principalmente, da entrada de dólares neste momento, a conjuntura econômica está bastante desfavorável ao investimento”, diz outra fonte do Itamaraty familiarizada com o país vizinho.

A Argentina responde hoje a 27 denúncias no Centro Internacional de Mediação de Disputas de Investimentos (Icsid, na sigla em inglês), fórum do Banco Mundial para arbitrar conflitos entre empresas e governos. No mais recente deles, iniciado em dezembro de 2012, a espanhola Repsol pede US$ 10 bilhões em indenização pela expropriação de 51%de sua subsidiária argentina, Repsol YPF, comprada no processo de privatização do setor energético do país em em 1993.

O governo Cristina Kirchner reestatizou a empresa alegando que os controladores espanhóis não vinham realizando os investimentos necessários para garantir o aumento da produção e o suprimento de petróleo e combustíveis no país.

Em sua última declaração sobre o tema, em encontro com acionistas realizado no final de maio, o presidente da Repsol, Antonio Brufau, disse que não abre mão de ser recompensado pela perda do ativo e que um acordo como governo argentino estava “muito, muito distante”.



Veículo: Brasil Econômico


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