Redes varejistas e fabricantes de móveis e eletrodomésticos começam a abrir negociações para reforçar os estoques das lojas com os produtos que podem ser vendidos pela linha de financiamento do programa "Minha Casa, Minha Vida". Redes ouvidas ontem esperam ter maiores volumes dessas mercadorias nas lojas num prazo de até 3 semanas. A importância desse planejamento de estoques cresce porque, para algumas redes, a demanda a ser criada com essa linha de financiamento pode ajudar a "salvar" o desempenho do ano.
"Já conversamos com algumas indústrias de móveis hoje [ontem] para ver quais produtos podem ser produzidos rapidamente dentro desse teto máximo definido pelo governo", disse Ricardo Marques, coordenador geral da lojas Rabelo, com atuação em sete Estados do Nordeste e mais de 100 lojas. "A ideia é entrar num acordo para aumentar a produção dessas linhas e ganharmos alguma margem de lucro no maior volume vendido".
"Nos móveis, como há alguns valores mais baixos [na tabela do governo] e os estoques não são altos, quem tiver produto em loja, vai vender", disse Ubirajara Pasquotto, diretor da Cybelar, rede com cerca de 150 lojas. O Valor apurou que há redes de varejo estudando oferecer ao consumidor produtos no formato de "combo" - um conjunto de mercadorias por um valor determinado. Como o preço máximo de alguns itens foi considerado baixo, nas conversas com o governo, os varejistas discutiram a possibilidade de um "reajuste". Se não existir uma oferta razoável de mercadorias no preço fixado, o teto pode ser elevado.
Empresários ouvidos ontem concordam que a linha de financiamento de móveis e eletrônicos pode ser fundamental na melhora dos resultados do varejo em 2013. Mas os ganhos das redes devem vir do volume vendido. Como não terão receita financeira com a venda da mercadoria (pois o financiamento será feito pela Caixa) -, o lucro da operação será obtido pelo aumento na quantidade vendida.
Com 106 lojas em sete Estados do Nordeste, a varejista Laser Eletro registrou, de janeiro a maio, alta de 4,5% nas vendas em relação ao mesmo período de 2012, abaixo da meta de 5% a 6%. Segundo Ricardo Uen, dono da rede, com o pacote do governo a taxa de expansão no ano agora pode variar de 8% a 10%. A Manlec, varejista de móveis e eletrodomésticos no Rio Grande do Sul, espera um crescimento real de pelo menos 3% a 4% no segundo semestre. Segundo o vice-presidente da empresa, Atílio Manzoli Júnior, sem a nova linha de crédito, a expansão só cobriria a inflação. A dúvida, diz Manzoli, é sobre quem vai arcar com o desconto de 5% no preço final dos produtos, previsto no programa.
A cartilha do governo informa que quem deve arcar com esse valor é o varejo. Houve uma discussão sobre esse ponto com o governo, e as lojas concluíram que seria aceitável arcar com esse desconto, para receber o dinheiro à vista.
Ontem, Michael Klein, diretor-presidente da móveis Bartira, uma das maiores do país, disse que seria melhor se o valor financiado de R$ 5 mil pudesse ser gasto livremente pelos consumidores. "Não deveriam ter delimitado o teto para cada produto", disse. Para ele, o consumidor poderia ter o direito de escolher o que quisesse comprar, mesmo com valores mais altos. O governo entendeu que se não definisse limites, ele poderia "subsidiar o luxo", com o consumidor comprando produtos sem necessidade, apurou o Valor.
Dono da Ponto de Promoção, com 50 lojas em Pernambuco, o empresário Fernando Mendonça classificou como "fantástico" o pacote, mas ressalta que o elevado grau de endividamento das famílias do programa Minha Casa, Minha Vida dificultará um crescimento relevante das vendas. A receita da rede caiu 7% no acumulado do ano e a projeção para 2013 é de alta de 1% a 2%. "O anúncio foi muito bom, mas não será suficiente para alterar nossas projeções".
Avaliação semelhante tem Romeu Zema, da rede de lojas Zema. "O impacto positivo nas vendas talvez seja de 1% ou 2% a mais. O valor [teto] do financiamento é muito expressivo. É uma ajuda, mas nada que vá mudar significativamente [o cenário]", disse ele.
Na avaliação de Lúcio Costa, fundador e presidente da Suggar Eletrodomésticos, de Belo Horizonte, o programa vai impactar a demanda por seus produtos e a empresa, talvez, precise terceirizar a injeção das peças de plástico que compõem seus produtos.
Lorival Kiçula, presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), diz que o programa foi muito bem-vindo. A entidade previa avanço de 10% neste ano, mas com o Minha Casa Melhor essa projeção deve ser elevada, mas ele não informa a nova taxa.
Os produtos selecionados pelo Minha Casa Melhor não incluem lavadoras semiautomáticas ou "tanquinhos". Fabricante desses produtos, a Latina ficou de fora do programa. "Não faz sentido que a classe mais baixa use o crédito para comprar um produto que, num primeiro momento, não é prioridade, como uma máquina automática", disse Valdemir Dantas, presidente da empresa.
Veículo: Valor Econômico