MasterCard quer se aproximar de lojista

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No interior paulista, a quase 400 quilômetros da capital, o minúsculo município de Colina passa quase despercebido diante do agito da vizinha mais ilustre, Barretos. "Colina é uma cidade em que todo mundo se conhece. Eu brinco que não te perguntam quem você é, mas de quem você é filho", conta João Pedro Paro, filho do cirurgião-dentista João Ademar Paro e da professora Leila Abdalla Paro.

João Pedro Paro, que já não mora em Colina desde a faculdade - mas visita a mãe lá uma vez por mês -, foi o único dos irmãos a não seguir carreira na saúde. Enveredou pelo sistema financeiro, e acabou indo parar, no começo do mês, na presidência da bandeira de cartões MasterCard no Brasil. Na empresa desde 2008, era responsável pela área comercial e de relacionamento com os emissores.

No novo cargo, a promessa é de um mandato agitado. Na lista de prioridades, melhorar as relações entre a bandeira e os lojistas. "O lojista passou a ser um cliente estratégico aqui dentro", diz. O foco no varejo não é sem motivo. No ano passado, nos Estados Unidos, Visa e MasterCard concordaram em pagar US$ 7,25 bilhões para encerrar um processo movido por varejistas. No Brasil, o fim da exclusividade de captura entre MasterCard e a Redecard, em 2010, aproximou os elos da cadeia de pagamentos. Em geral, as credenciadoras cuidam da relação com lojistas, enquanto as bandeiras relacionam-se com os emissores do cartão.

Paro também assume o comando às vésperas de outra mudança: o Banco Central passará a regular toda a cadeia de pagamentos eletrônicos, incluindo as bandeiras. O executivo também enfrentará uma concorrência mais acirrada, com a bandeira brasileira Elo já começando a incomodar. Nesse ponto, a resposta é categórica: "Não quero discutir preço". A seguir, os principais trechos da entrevista.

Valor: A regulação do mercado de cartões é um tema importante do setor neste ano. O BC passa a ter poder sobre toda a cadeia de pagamentos, inclusive as bandeiras. Pode, inclusive, regular as tarifas que são fixadas pelas bandeiras. Qual a visão da MasterCard sobre o tema?

João Pedro Paro: A regulamentação vem para tentar ajudar o mercado a funcionar ainda melhor. Não é que sejamos contra ou a favor dela. Nós fazemos parte de um mercado. Eu participo dele, não o defino. O Banco Central, ao sugerir essa regulação, ouviu todos os agentes e nós também fomos ouvidos, no sentido de que eles pudessem ter uma boa leitura do mercado. Nós vamos nos adaptar ao que vier e tentar fazer disso o que nos interessa, que é competir com o dinheiro. Que mais gente use cartões, que mais volume entre no sistema. A preocupação dos reguladores e dos agentes é a mesma, nesse sentido.

Valor: Em termos de aceitação de cartões, em que estágio o senhor avalia que o Brasil está hoje?

Paro: O Brasil é um país diferenciado em meios de pagamento. Estamos adiante em muitas coisas, mas ainda há muito o que fazer. Os números são conhecidos: 30% das compras estão em meios de pagamentos eletrônicos, mas 70% não estão. Falta 70% por quê? Porque tem muito trabalho ainda. É por isso que estamos trazendo soluções que têm agregado a esse número. O próprio cartão pré-pago, por exemplo. Nós começamos a trabalhar com ele há dois anos e hoje a indústria só fala sobre esse tema. Dois anos atrás, éramos loucos.

Valor: Sobre competição, nos últimos dois anos, além do seu rival estrangeiro tradicional, a Visa, houve a chegada de uma bandeira nacional, a Elo...

Paro: Que está começando a ter seu tamanho e também compete conosco.

Valor: E o que vocês têm feito nesse cenário de um concorrente nacional e de uma abertura de mercado de cartões já mais consolidada?

Paro: Acho que são as novas propostas de ofertas de produtos e serviços que pesam nessa hora. Os programas de benefícios e as ofertas específicas dos cartões MasterCard, por exemplo. Uma segunda parte é nossa capacidade de fazer outros negócios com os nossos parceiros. A gente faz novos negócios com os bancos emissores com uma velocidade bacana.

Valor: Algum exemplo?

Paro: São diferentes incentivos que levamos aos parceiros para que façam negócios conosco. Eu posso dar ao emissor um incentivo em consultoria, por exemplo. Podemos fazer juntos um trabalho em pagamentos por celular. Tem os programas de benefício e as promoções que eu faço. São coisas que, no fim do dia, vão trazer mais market share para o emissor e aumentar o volume de transações.

Valor: O preço dos serviços que vocês oferecem - os royalties cobrados dos bancos - não é uma questão que ficou mais forte com mais concorrência?

Paro: Uma discussão de preço não é uma parceria, então não é o que queremos estabelecer com clientes. Nós estamos sempre dispostos a conversar sobre o tema, toda hora, porque o mundo é dinâmico e a competição é forte. O que tentamos fazer é apoiar os projetos dos parceiros e nos aproveitar disso de alguma maneira. O foco do que eu ofereço é um só: como eu faço aumentar o nosso negócio de cartões na ponta. Não é só ter mais cartões, mas ter mais volume, gente usando que ainda não usava. É a diferença que fazemos.

Valor: As compras parceladas sem juros no cartão de crédito foram um tema importante no contexto de queda dos juros do cartão. Uma das possibilidades consideradas foi as bandeiras aumentarem a remuneração dos emissores nessas transações. Como está esse debate?

Paro: O parcelado sem juros tem um componente emocional muito pesado. Se só mexer na taxa de intercâmbio [a parcela da transação que fica com os bancos emissores dos cartões] resolvesse a questão, a vida era fácil. Eu acho que esse é um desafio gigante para a indústria. Acho que o parcelado nunca vai deixar de existir. Agora, a discussão de como fazer esse parcelamento sem juros pode sim ir para a mesa. Como a gente pode melhorar, evoluir, tornar a relação mais equilibrada. De que maneira o emissor pode sair menos prejudicado sem prejudicar o lojista também.

Valor: O que é debatido?

Paro: Há milhares de discussões nesse tema, mas no primeiro momento, e agora falando como Abecs [associação do setor de cartões], a prioridade é trabalhar o crediário [linha de crédito pré-aprovada contratada no ato da compra]. Vamos criar um modelo igual de crediário para toda a indústria e, a partir daí, criar um ambiente para discutir o parcelado. Estamos muito longe de ter qualquer ideia para se por na mesa. Hipóteses existem mil. Esse é um comportamento que requer um tempo maior para mudar.

Valor: Na União Europeia e nos Estados Unidos, a relação da bandeira com o lojista acabou indo parar na Justiça. No Brasil, há tensão também? Há uma preocupação com os custos do lojista?

Paro: A MasterCard definiu uma estratégia global em que o lojista passou a ser um importante cliente nosso. Não que não fosse antes, mas agora é estratégico e eu preciso trazer mais valor para ele. Não posso esquecê-lo. Não é que eu queira tomar o lugar da credenciadora e ficar discutindo preço. Com o emissor, toda hora eu trago novidade. Do lado do lojista, a gente estava mais carente. Um exemplo é a DataCash, que lançamos no Brasil com a Redecard, um simplificador para o lojista no comércio eletrônico. Eu não quero ficar discutindo preço. Eu coloco um valor na mesa e peço que ele avalie. O comércio faz conta melhor que eu. E aí decide se vai ou não fazer negócio.



Veículo: Valor Econômico


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