Começa a temporada de renegociação das dívidas

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O comércio varejista terá neste fim de ano um desafio extra para trazer o brasileiro de volta às compras em meio à recessão. Na temporada de feirões de renegociação de dívidas em atraso, que começou esta semana e vai até o fim do mês, o grande destaque é o aumento da inadimplência ligada às contas básicas, como água, luz, gás, comunicação e educação privada, serviços cujo consumo pode ser reduzido ou substituído, mas não evitado. Esse movimento é inverso ao que ocorria até pouco tempo, quando a inadimplência que mais crescia estava ligada à compra de bens de maior valor.

Em setembro deste ano, enquanto a inadimplência média do consumidor aumentou 6,63% em relação ao mesmo mês de 2014, o calote das contas de água e luz cresceu 12,55%, e de gastos com educação, 16,9%, segundo dados do SPC Brasil. No mesmo período, a inadimplência bancária subiu 10,32% e a das contas de celular, internet e TV a cabo, 4,17%. Nessa lista, o comércio varejista ficou na “lanterna”, com alta do calote de apenas 0,85% no período.

“Esse resultado da inadimplência revela que a compra de bens está caindo e que as pessoas estão com grande dificuldade para pagar todo tipo de conta”, afirma a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawauti.

O avanço da inadimplência de despesas compulsórias é confirmado também por duas empresas especializadas em informações financeiras do consumidor e que neste mês vão fazer feirões de renegociação de dívidas em atraso. Depois das despesas com alimentação, deixar de pagar as contas de água, energia elétrica e gás foi o principal motivo que levou o brasileiro à inadimplência este ano, com 15% das respostas, aponta a pesquisa do perfil do inadimplente da Boa Vista SCPC de setembro. No mesmo mês de 2014, esse motivo representava 13,1%.

Segundo a Serasa Experian, que calcula que existam hoje no País 57,2 milhões de inadimplentes, com uma dívida que soma R$ 246 bilhões, as contas de água, luz e telefonia juntas responderam em agosto por 32,5% da inadimplência total do consumidor – fatia que supera a participação do calote com bancos e cartões de crédito (29,40%), sempre apontados como os maiores vilões, e do varejo, com 13,2%.

Nas escolas particulares, o quadro não é diferente. O presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo, Benjamin Ribeiro da Silva, observa que o aumento da inadimplência é visível nas escolas da cidade de São Paulo, a região mais afetada pela crise, em relação à média do Estado.

Em agosto, último dado disponível, o calote nas escolas da capital paulista foi de 11,6%, ante 7,8% um ano atrás. No Estado como um todo, a inadimplência média, que era de 7,33% em agosto de 2014, subiu para 8,21% no mesmo mês deste ano. “Apesar desse aumento, as escolas não estão perdendo aluno para a rede pública. O que há é uma migração de um colégio mais caro para outro mais barato”, explica Silva.

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Gravidade. Para o economista da Boa Vista Serviços, Flávio Calife, em 2011 e 2012, no último ciclo de alta da inadimplência, o avanço do calote ocorreu porque houve uma tomada de crédito muito grande, ligada ao consumo de bens de maior valor. “Em 2012, ocorreu alta da inadimplência por causa do descontrole no consumo”, lembra.

Agora, apesar de os valores pendentes serem menores, porque se tratam de contas do dia a dia, a situação é mais grave, na opinião do economista. Isso porque a inadimplência está ocorrendo por causa de dificuldades na capacidade de pagamento de contas tidas como essenciais. Segundo Calife, os obstáculos para honrar os pagamentos em dia decorrem do aumento da inflação e do desemprego, que reduziram a renda real do trabalhador.

Pelo fato de as pendências terem aumentado nas contas básicas, que são de menor valor em relação a financiamentos de bens, o economista da Associação Comercial de São Paulo, Emílio Alfieri, diz que teoricamente seria mais fácil para o consumidor renegociar os débitos, usando os recursos do 13º salário para quitar os atrasos e voltar às compras.

Mas ele alerta que o cenário não é bem esse. O crédito mais restrito e caro e a desconfiança crescente do consumidor, especialmente  em relação à manutenção do  emprego, podem  agravar o cenário para as vendas do varejo neste fim de ano.

Desemprego. O desemprego dificultou o pagamento em dia de contas básicas. O mecânico em refrigeração Fabio de Jesus Dias, de 34 anos, quer renegociar o pagamento de cerca de quatro contas atrasadas de luz que somam perto de R$ 500. “Vou tentar um desconto”, afirma. Dias ficou inadimplente porque perdeu o emprego. Além disso, a conta subiu muito. “Gastava cerca de R$ 50 por mês de luz. Agora a conta foi para quase R$ 100, o dobro.”

O mecânico ficou desempregado por dois meses. Hoje ele conseguiu se recolocar e pretende liquidar todas as pendências, não apenas as contas de luz com a Eletropaulo, mas também a dívida com banco.

Também o desemprego embaralhou as finanças do estudante de administração Diogo Felix, de 22 anos. Ele trabalhava como operador de caixa de um supermercado e foi demitido por causa da crise. Com isso, deixou de pagar a mensalidade de R$ 360 da faculdade. Felix acaba de conseguir um novo emprego e vai tentar renegociar a dívida com a faculdade. “Mas vou ficar cauteloso nas compras de fim de ano.”

 



Veículo: Jornal O Estado de S. Paulo


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