Como a fabricante dos lenços Kleenex contratou 141 novos funcionários e ao mesmo tempo cortou R$ 42 milhões em despesas
Na tela do notebook pessoal de João Damato, presidente da Kimberly- Clark do Brasil, um dado chama a atenção no arquivo de resultados da empresa. De janeiro a março, 141 novos funcionários foram admitidos pela companhia. Outros 30 mudaram de posição e 23 acabaram promovidos. O aumento de quadro de pessoal ocorreu simultaneamente à disparada dos custos na companhia, que subiram 50% do dia para a noite no final de 2008. Como boa parte dos insumos tem preços regulados pelo dólar, as despesas subiram na mesma proporção da variação da cotação da moeda norte-americana: de R$ 1,75 para R$ 2,39 em um mês. "Mexemos em tudo para equilibrar as contas, menos em salário", diz Damato, durante entrevista na sede da empresa, na Vila Olímpia, na zona sul de São Paulo. A reação rápida da companhia -- as primeiras medidas foram tomadas já no início de outubro -- foi resultado de uma postura muito particular de Damato, há sete anos na presidência da Kimberly no País, dona dos lenços Kleenex, do papel absorvente Scott e das fraldas Turma da Mônica. "Havia quem achasse que era uma gripezinha e era melhor esperar. Mas, mesmo sem o sinal verde deles (da matriz, sediada em Wisconsin, no centro-leste norte-americano), fui fazendo o que precisava", diz ele. Assim, desde outubro, a redução de custos na empresa atingiu R$ 42 milhões. O valor equivale a quase metade dos investimentos previstos na operação brasileira neste ano - algo em torno de US$ 50 milhões. O pacote de medidas não se restringe aos tradicionais cortes de contas telefônicas ou viagens.
Por exemplo: Damato se reuniu com os maiores fornecedores da empresa nos EUA, na Ásia e Europa. As primeiras conversas aconteceram pouco antes de setembro, estopim da crise, por conta da valorização do dólar, e se aqueceram no final do ano. A empresa abriu a planilha de custos para provar que, com o dólar alto e a demanda instável, o valor dos contratos teria de ser revisto. Em alguns casos, houve mais de uma dezena de reuniões e semanas consecutivas de conversas telefônicas.
"Cerca de 95% de nossos fornecedores revisaram os contratos. Apenas 10% deles reduziram o valor entre 5% e 10%. Mas chegamos a baixar a tabela em até 40%", diz Damato. Esse processo só foi possível porque, antes de colocar todo mundo na rua em renegociações cruciais, o executivo chamou os diretores e gerentes da Kimberly para uma conversa. Fez uma apresentação mostrando que precisava da ajuda de todos, sem exceção. Disse que era preciso recriar a empresa em novas bases, sem abrir mão de uma expansão de dois dígitos e manter o ritmo de crescimento dos últimos cinco anos, quando a Kimberly dobrou de tamanho. A receita passou de R$ 1,1 bilhão em 2003 para R$ 2,1 bilhões no ano passado.
A percepção de que era preciso apertar o cinto se espalhou no grupo. Os gastos com telefonia diminuíram, em média, 25%. O volume de viagens do próprio presidente caiu de até três a quatro ao mês para apenas uma ou duas. "Hoje, não quero nem saber quanto teríamos crescido se não fosse a crise. É o tipo de coisa que só nos frustra", diz Damato. No ano passado, apesar do último trimestre turbulento, a expansão nas vendas foi de 17% em moeda brasileira e 25% em dólar, em relação a 2007. Esse movimento destoa da fase delicadíssima enfrentada pela matriz lá fora. Por causa da retração do consumo mundial, o grupo informou que deve encolher entre 4% e 5% em 2009. É difícil imaginar que os bons ventos vindos do Brasil (com 5% da receita mundial) possam fazer a curva de queda mudar de direção. Pelo menos é um sinal animador em tempos revoltos.
Veículo: Revista Isto É Dinheiro