Produto certo no lugar certo

Leia em 8min 20s

Gerenciamento por categorias permite reposicionar e combinar mercadorias, oferecendo soluções para as necessidades dos consumidores

 
 
Você já parou para pensar na forma como os produtos que você vende são consumidos? Esta é justamente a reflexão que deu origem ao gerenciamento por categorias (GC), ferramenta de gestão que permite adequar a lógica de exposição das mercadorias conforme o uso dos clientes, ao invés de organizá-las pelo tipo de fornecedor, com o objetivo de aumentar as vendas. Na prática, significa colocar o queijo próximo ao vinho, o chantilly ao lado do morango e o fósforo perto do carvão, sugerindo uma compra adicional. Além de conhecer o público-alvo, para definir as estratégias de GC os varejistas devem estar atentos ao mix de produtos, à gestão do estoque e às parcerias com fabricantes e distribuidores.

 

Ainda que o GC tenha nascido nos grandes supermercados, hoje em dia os pequenos e médios varejos – inclusive de outras áreas – não podem ficar de fora ou correm o sério risco de mandar seus clientes para as lojas vizinhas. Foi justamente com o objetivo de evitar esse erro e facilitar a vida dos consumidores que o Hippo Supermercados, de Florianópolis, decidiu apostar todas as fichas no GC. A estratégia ainda está em implantação, mas a empresa já conseguiu aumentar as vendas em cerca de 30%.“Às vezes o lojista fica naquela rotina de compra e venda de produtos e não percebe que, quanto mais se posicionar estrategicamente no ponto-de-venda, mais vai vender”, reflete Robson Sacheti, gerente comercial do Hippo.

 

De administração familiar, com duas unidades na capital catarinense, o Hippo inspirou-se em supermercados de São Paulo – caso do Pão de Açúcar e Casa Santa Luzia, referências em GC – para reformular a exposição de 11 mil itens no ponto-de-venda. O processo é longo e trabalhoso: é preciso recadastrar todos os produtos, definindo e agrupando categorias, subcategorias, segmentos e subsegmentos. Enquanto isso, algumas mudanças já foram feitas nas lojas, como, por exemplo, no setor de bebidas. Se antes as cervejas eram expostas aleatoriamente, hoje elas se dividem em “comuns”, subdivididas em pilsen e escura, e “especiais”, entre importadas e artesanais. Outra categoria que já foi adequada segundo os princípios do GC é a de óleos e azeites. Com o novo layout, os óleos comuns – que antes ocupavam o dobro do espaço – foram parar nas prateleiras de baixo, cedendo a parte de cima da gôndola para os azeites. “Partimos do princípio que óleo de cozinha é commodity – ou seja, o cliente, quando precisa, vai buscar a mercadoria onde estiver – e privilegiamos a exposição de produtos com maior valor agregado”, explica Sacheti.

 

Os resultados têm sido animadores: apenas as mudanças no layout da loja, seguindo a metodologia do GC, já foram responsáveis por um aumento significativo das vendas. A saída dos produtos orgânicos, por exemplo, aumentou em 50% apenas com a valorização das gôndolas, que passaram a ocupar um lugar mais estratégico da loja. “Mantivemos os mesmos itens e preços e conseguimos elevar as vendas repensando a exposição da categoria”, diz Sacheti. Como forma de medir a eficácia das ações de GC, o supermercado aguarda três meses e compara o total de vendas e a margem de contribuição deste período com os resultados do semestre anterior à mudança.

 

A implantação do GC pode requerer mudanças no sistema de TI do ponto-de-venda. Como o objetivo é administrar cada categoria individualmente – como lojas dentro da loja –, é preciso contar com softwares adequados. Por enquanto, Sacheti está utilizando o Excel para organizar a base de dados dos supermercados Hippo, mas um profissional de TI já foi acionado para aprimorar o sistema gerencial das lojas à nova gestão.

 

Apesar de ser uma tarefa complexa, a implantação do GC em lojas de pequeno e médio portes pode ser feita pelos próprios lojistas, sem a necessidade de recorrer à ajuda de terceiros. Entendendo os princípios básicos do GC, é possível reagrupar e combinar produtos, oferecendo soluções para as necessidades mais óbvias dos consumidores. No caso do Hippo Supermercados, uma consultoria de varejo foi contratada no início do processo, que hoje é feito pelo gerente comercial e um assistente. “Foi importante para nos mostrar um rumo a seguir, mas fomos aprendendo e decidimos fazer o GC por conta própria”, afirma Sacheti. Para os interessados, o grupo ECR Brasil ministra cursos mensais na área, com duração de um dia.

 

O primeiro passo para iniciar o GC é conhecer os hábitos de consumo da população que vive próxima à loja. “É de fundamental importância pesquisar e segmentar os diferentes grupos populacionais e as respectivas necessidades de cada um, definindo estratégias para a adequação do ponto-de-venda”, recomenda Cláudio Czapski, superintendente da ECR Brasil. Um mesmo produto – por se destinar a diversos tipos de público – faz parte de situações diferentes de consumo. Além disso, a mesma categoria de mercadorias terá um sortimento de itens e serviços distintos conforme a região do País. “É só pensar quais mercadorias fazem parte do universo e da cultura de determinado local. De nada adianta vender erva para chimarrão num supermercado do Ceará, por exemplo, pois é óbvio que vai encalhar porque não tem nada a ver com o público-alvo.”

 

Conhecer o processo decisório de compra no ponto-de-venda é fundamental na hora de definir as estratégias de GC. Enquanto para algumas categorias – caso dos detergentes – o que importa é o preço mais baixo, para outras, por exemplo, os cosméticos, o que vale para o consumidor é marca e variedade. Sendo assim, é melhor diminuir a variedade de marcas de detergentes – que são comprados quase sempre pelo critério do menor preço – e privilegiar o espaço e o sortimento de itens de higiene e beleza.

 

Enxugar o mix de produtos também é uma das vantagens do GC. Afinal, principalmente em se tratando de pequenas e médias lojas, superlotar as gôndolas com todos os tipos e marcas de mercadorias não significa atender às necessidades do consumidor. “Já é conhecido o fato de que 20% dos itens fazem 80% do volume de vendas, então não adianta ter excesso de sortimento”, explica Czapski. Para evitar esse equívoco, a recomendação é ficar atento às tendências do mercado – que pode condenar categorias inteiras ao desuso – e readequar o mix regularmente, de preferência uma vez ao ano. “O ideal é criar um comitê formado por pessoas do comercial, de vendas, de compras e de logística, que avaliem quais itens devem entrar e sair de linha”, completa Czapski.

 

Muito associado aos supermercados, o GC é uma ferramenta válida para todos os tipos de loja. Em qualquer segmento é possível definir categorias e estabelecer uma lógica para a exposição dos produtos. Uma loja de vestuário, por exemplo, pode agrupar categorias de acordo com as necessidades de consumo: roupas de festa, para o dia a dia, para trabalhar, etc.

 

Entre as redes de varejo que se destacam no GC está a Kalunga, referência no comércio de materiais escolares e artigos de papelaria e informática. Para administrar os mais de 10 mil itens do mix de acordo com os princípios do GC, a rede conta com sistemas de gerenciamento de estoque, vendas e formas de pagamento que permitem acompanhar o desempenho de cada categoria. “A partir destas avaliações permanentes, adotamos medidas que vão desde o reabastecimento dos produtos nos pontos-de-venda a promoções e campanhas de acordo com a sazonalidade”, explica Hoslei Pimenta, gerente comercial da Kalunga. Com 56 lojas distribuídas por todo o País, a rede ainda direciona o GC conforme as características de cada região, apostando em pesquisas para conhecer o perfil dos consumidores. “É imprescindível conhecer as categorias, o perfil dos clientes e as características de cada cidade e loja”, completa Pimenta.

 

A parceria com os fabricantes também faz parte da filosofia da Kalunga e permite, assim, intensificar as ações de marketing no ponto-de-venda. Unir indústria e varejo em uma ação conjunta para valorizar a loja é, na opinião de Czapski, o “modelo perfeito” de estratégia de GC. Cada vez mais atentas a essa realidade, muitas indústrias já possuem setores de trade marketing que se encarregam, entre outras funções, de estimular o GC. “O fabricante, além de conhecer o produto como ninguém, já fez toda uma análise de mercado específica para cada mercadoria, enquanto o lojista, por sua vez, conhece bem as necessidades e o estilo de vida dos clientes. Essa troca de informações é muito valiosa para todos”, diz Czapski.

 

Origens do GC

 

Criado no início da década de 1990 pelo consultor norte-americano Brian Harris, pode-se dizer que o GC surgiu como consequência da evolução da cadeia produtiva. Com o aumento da oferta de marcas e produtos, os consumidores passaram a contar com uma variedade cada vez maior de itens destinados a satisfazer, praticamente, qualquer necessidade ou desejo. Além disso, com a tendência dos hipermercados e megastores, muitas lojas aumentaram de tamanho, o que exigiu novas formas de se pensar a exposição das mercadorias. Por fim, indústria e comércio veem-se às voltas com uma concorrência desigual, onde pequenas, médias e grandes empresas, nacionais e estrangeiras, disputam a preferência do cliente. “Mais do que nunca, é hora de pensar o mundo em termos de ocasiões de consumo e tentar fazer da loja um centro de soluções para essas diferentes necessidades”, afirma Cláudio Czapski, superintendente da ECR Brasil.

 

Veículo: Revista do Varejo


Veja também

A Unilever sertaneja

A pernambucana ASA se transformou em uma potência regional ao fabricar 250 produtos de dez marcas diferentes. Agor...

Veja mais
ANVISA, SEBRAE E ABIPLA unidos no combate aos produtos de limpeza informais

A busca pela economia doméstica em tempos de crise pode agravar ainda mais a questão da clandestinidade do...

Veja mais
Pesquisa Ampro mostra tendências do marketing promocional

A Associação de Marketing Promocional (Ampro) acaba de concluir, junto ao IBOPE Inteligência, a segu...

Veja mais
Anvisa deve mudar rótulo de suplemento alimentar

Barras de proteína, repositores energéticos e sachês devem ser classificados como alimentos para atl...

Veja mais
Sem Ponto Frio, Magazine Luiza mira consolidação da rede

Luiza Trajano afirma que perdeu negócio para o Pão de Açúcar "aos 48 minutos do segundo temp...

Veja mais
Faltam produtos da linha branca

A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e a volta – mesmo que  tímida...

Veja mais
Convergência de eventos deu bons resultados no varejo de SP

O feriado de Corpus Christi, o Dia dos Namorados e os festejos juninos incentivaram o consumo dos paulistanos nos &uacut...

Veja mais
Produtores de leite assistem a retomada com preço melhor

Após sofrer com o grande volume derramado no mercado internacional pela Nova Zelândia, os produtores brasil...

Veja mais
Café sobe 10,25% com cortes na Colômbia

O impacto do corte na produção colombiana de café continuou a influenciar os preços internac...

Veja mais