Mesmo sem a derrubada da Tarifa Externa Comum (TEC), que impõe um adicional de 10% sobre o trigo comprado fora do Mercosul, moinhos brasileiros têm recorrido aos Estados Unidos para recomposição de seus estoques do cereal. Ainda que com taxas adicionais e custos mais altos com frete, tem sido mais vantajoso comprar trigo no mercado americano, avaliam as indústrias.
No primeiro semestre, as compras brasileiras de trigo dos EUA somaram 31,6 mil toneladas, segundo a Secretaria de Comércio Exterior. O acumulado de todo o primeiro semestre, contudo, foi menor que os embarques feitos pelos EUA ao Brasil no período de uma semana encerrado em 9 de julho. Nesse intervalo de sete dias, os registros de embarques somaram 51 mil toneladas, scgundo o relatório semanal de exportações do Departamento de Agricultura dos EUA, apresentado na quinta-feira.
Um exemplo prático de importação do trigo "hard", usado na panificação: na semana passada, no porto de Santos, a tonelada (FOB) de trigo americano foi ofertada por US$ 229. Se adicionados os U$ 32 de frete (mais US$ 8, que correspondem a 25% da despesa com frete, valor destinado ao Fundo da Marinha Mercante), os 10% da TEC e os US$ 30 de frete no mercado interno, chega-se ao valor de US$ 325, ou R$ 643, em uma simulação com taxa de câmbio de R$ 1,98 por dólar.
O trigo "hard" argentino, por sua vez, foi oferecido pelas tradings por US$ 315 - mas a oferta é limitadíssima, em virtude da seca no país vizinho, que cortou a produção pela metade. "Não é apenas o preço que tem valido a pena, mesmo com a TEC. Quando se compra trigo americano, sabe-se que a qualidade é garantida", diz Luiz Martins, presidente do moinho Anaconda. O setor tentou derrubar a TEC, como ocorrido em 2008, mas o pleito não foi atendido pelo governo.
A demanda maior é pelo trigo "hard", mas o mesmo raciocínio pode ser aplicado a eventuais compras de trigo "soft" americano, mais voltado à indústria de biscoitos. Ainda em uma simulação feita com taxa de câmbio de R$ 1,98 e com adição de taxas e despesas com frete, o trigo pode chegar aos moinhos por cerca de R$ 500. Remessas de trigo "soft" do Rio Grande do Sul para um moinho paulista custariam de até R$ 530.
"A chave para o aumento das exportações de trigo americano para o Brasil é a taxa de câmbio", diz Elcio Bento, analista da Safras & Mercado. Haveria espaço para importações ainda mais fortes, mas os moinhos brasileiros estão, no geral, bem abastecidos, afirma ele.
Os preços do trigo no mercado interno podem cair a partir de agosto, quando começa a colheita da safra nacional. Isso poderia desestimular as compras de trigo dos EUA. Por outro lado, há perspectiva de baixa também no mercado internacional, já que os estoques mundiais, que estavam bastante apertados em 2008, têm sido recompostos desde então.
"O cenário deve mudar mesmo quando começar a entrar a safra argentina, depois de dezembro", diz Bento. Mesmo essa análise precisa ser relativizada, reitera ele, já que os volumes disponíveis para exportações do país vizinho não devem superar as 2 milhões de toneladas no ano comercial 2009/10 - em 2007/08, havia sido de 9 milhões de toneladas.
No mercado internacional, o preço do trigo atingiu seu ápice no início de junho, mas as cotações têm recuado desde então. Em Kansas, os contratos de segunda posição de entrega, normalmente os de maior liquidez, acumularam queda de 20,8% entre 1º de junho e a última sexta--feira, quando foram negociados por US$ 5,8350 por bushel. A cotação mais baixa do ano para o papel foi registrado na semana anterior.
Veículo: Valor Econômico